A nova Lei de Falências e Concordatas

A atual Lei de Falências e Concordatas já não atende mais a dinâmica da vida empresarial nem a realidade socioeconômica no nosso País, quebrando várias empresas viáveis. Depois de ficar quase dez anos parada na Câmara dos Deputados, o governo federal irá colocar o projeto em votação ainda esse ano. Pretende-se com a nova lei manter as empresas viáveis e liquidar as inviáveis. Vamos ver as principais mudanças:

1. Mudanças de termos e suas implicações. A Lei de Falências e Concorda n.º 7.661 de 1945 será substituída por outra que “regula a recuperação e liquidação judicial de devedores pessoas jurídicas e pessoas físicas que exerçam atividades econômicas”, conforme estabelece o Projeto de Lei n.º 4.376-A, de 1993. As concordatas preventiva e suspensiva e a continuidade dos negócios do falido após a declaração da falência que eram mecanismos de recuperação da empresa, passam a dar lugar a um único processo, chamado de recuperação judicial que ocorre sempre antes da chamada liquidação judicial. Esse último termo substitui a falência.

2. Sujeito passivo. As sociedades de economia mista e as sociedades cooperativas expressamente passam a estar sujeitas à lei de falências. As empresas públicas, bem como as instituições financeiras públicas e privadas, as cooperativas de crédito, os consórcios, as sociedades seguradoras, de capitalização e outras entidades voltadas para idêntico objeto, ficam sujeitas a leis complementares ou liquidação judicial de seus ativos. Ocorre que enquanto não forem publicadas estas leis complementares estas empresas estão sujeitas à liquidação judicial.

3. Ministério Público. O Ministério Público passa a intervir antes da liquidação judicial do devedor nos casos previstos na lei e não somente após a declaração da falência como ocorre com a atual Lei de Falências e Concordatas.

4. As penas pecuniárias e multas. Atualmente as penas pecuniárias e multas são exigidas do devedor no processo de concordata e elas não poderão mais ser exigidas no processo de recuperação judicial.

5. Obrigação de informação. As ações e execuções que demandarem quantia ilíquida devem ser levadas ao conhecimento do juízo universal, sob pena de nulidade dos atos processuais posteriores ao requerimento da recuperação ou da liquidação judicial. Atualmente a legislação falimentar não estabelece que o devedor publique seu estado de dificuldade formalmente, isto infelizmente ocorrerá com a nova lei se ela não for alterada antes de sua publicação.

6. Direito de preferência dos créditos. Os créditos derivados das relações de trabalho e as contribuições para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) até o montante de 20.000 Ufirs (vinte mil unidades fiscais de referência) por empregado nas médias e grandes empresas e de 10.000 Ufirs nas empresas de pequeno porte e microempresas tem preferência sobre os demais credores na fase de recuperação judicial e na fase de liquidação não existe este limite, o crédito pode ser recebido totalmente com preferência sobre qualquer credor.

7. Mudança dos órgãos nos processos coletivos. Desaparecem os termos utilizados no processo de concordata “comissário” e no processo de falência “síndico”. Nascem as figuras do administrador judicial, nomeado com a abertura do processo de recuperação judicial para co-gerir os negócios da empresa em recuperação e também quando for declarada a liquidação judicial do devedor para administrar os bens compreendidos na liquidação judicial; do administrador-gestor que substitui o administrador judicial no caso de recusa ou impedimento deste; do comitê de recuperação, responsável, entre outras, pela fiscalização da gestão do devedor, o qual é formado pelo administrador judicial, por credores e empregados para recuperar a empresa.

8. Finalidade da recuperação judicial. A recuperação judicial do devedor visa a continuidade dos negócios das empresas viáveis, a manutenção de empregos e o pagamento dos credores. Enquanto que a legislação atual se preocupa somente com aspectos formais para declarar a falência da empresa a nova lei não é formalista como a atual porque ela se preocupa com a função social da empresa dentro do seu meio de atuação.

9. Inclusão de todos os credores no processo de recuperação judicial. A atual legislação privilegia os já privilegiados credores com garantias reais, a Fazenda Pública e o Instituto Nacional da Seguridade Social, os excluindo do processo de concordata. Com a nova lei, os privilegiados têm enfraquecido seus privilégios e passam a ser submetidos ao processo de recuperação judicial do devedor.

10. Do benefício legal do processo de recuperação. Atualmente o devedor apresenta ao juízo uma proposta de pagamento que será feita a seus credores seguindo as condições estabelecidas na lei para realização de pagamentos. Uma vez preenchidos os requisitos estabelecidos na legislação, o julgador, sem ouvir ninguém, determina a abertura do processo de concordata. Com a nova lei, o devedor apresenta seu pedido com um plano detalhado de recuperação dizendo de que forma ele vai se recuperar e pagar seus credores. No plano, sendo necessário, ele mencionará se haverá cisão, incorporação, fusão ou cessão de quotas ou ações da sociedade, substituição total ou parcial dos administradores, aumento do capital social,… O prazo para recuperação não poderá, em princípio, ultrapassar dois anos. Os credores votam este plano. Se o plano for julgado inadequado pelos credores, o juízo ainda assim poderá aceitá-lo, mas, os credores, o administrador judicial ou o comitê de recuperação (não existe comitê para as pequenas empresas) podem apresentar um plano alternativo de recuperação. O plano pode ser revisto se houver modificações substanciais na situação econômico-financeira do devedor. O fato de o devedor ter título de crédito protestado não será mais um obstáculo para sua recuperação.

11. Dos créditos fiscais e as contribuições previdenciárias e sociais. Estes créditos anteriores à abertura do processo de concordata estão excluídos deste processo atualmente e com a nova lei eles serão incluídos e pagos pelo devedor em recuperação judicial mensalmente conforme for apresentado no seu plano de recuperação, desde que não estejam contra a lei.

12. Do cumprimento das obrigações do devedor em recuperação judicial. Atualmente o devedor somente assume obrigações referentes ao pagamento de seus credores no processo de recuperação e com a futura lei ele poderá assumir outros compromissos além dos pagamentos e todos estes compromissos devem ser cumpridos para ele ser considerado recuperado.

13. Do descumprimento das obrigações do devedor em recuperação judicial. Atualmente o devedor que deixa de cumprir com suas obrigações pecuniárias no processo de concordata tem, em situações normais, sua falência declarada. Com a nova lei não somente pelo descumprimento de obrigações pecuniárias, mas também pelo descumprimento de outras obrigações essenciais ele terá declarada sua liquidação judicial.

14. Da liquidação judicial. Com a atual legislação basta o devedor ser impontual e ser protestado por único credor, independentemente do valor da dívida, para ele ser considerado falido. Com a nova lei existe um crédito mínimo que deve ser atingido para que se possa requerer a falência do devedor e ele deve ser protestado por mais de um credor com antecedência de 90 dias anteriores à data do pedido de falência. Ele é de 10.000 Ufirs para as médias e grandes empresas e de 5.000 Ufirs para as pequenas. Existem fatos na lei de falências atualmente que dão ensejo à falência e estes fatos, juntamente com a impontualidade do devedor, que caracterizam sua falência, passam somente a presumir seu estado de liquidação judicial porque se ele apresentar sua defesa, inclusive com um prazo maior para essa, contendo um plano de recuperação viável, não será, em princípio, declarada sua liquidação judicial.

15. Da nulidade dos atos praticados pelo devedor que prejudicam os credores. A nova lei aumenta o prazo que era de 60 para 90 dias do período suspeito, tornando inoponível perante a massa liquidanda certos atos praticados pelo devedor que venham a prejudicar os credores.

16. Da responsabilidade penal. A nova lei é mais rigorosa no aspecto penal, tipificando novos crimes e aumentando as penas, dando ensejo à prisão preventiva do devedor e/ou de seus representantes. A prisão administrativa, reconhecida com ilegal atualmente, volta a estar prevista na atual legislação.

17. Da venda dos bens do devedor em liquidação judicial. Com a nova lei, os bens arrecadados do devedor serão vendidos de forma mais rápida para pagar os credores porque não é necessário esperar a formação do quadro geral de credores para ocorrer a venda.

18. Da indisponibilidade de bens particulares dos réus. Está expresso na futura lei que o juiz poderá tornar indisponíveis os bens particulares dos réus quando houver responsabilidade solidária dos controladores e administradores da sociedade por ações e a dos sócios-gerentes da sociedade por quotas de responsabilidade limitada, estabelecidas nas respectivas leis, bem como a dos sócios comanditários e do sócio oculto.

19. O procedimento simplificado. Um procedimento simplificado baseado essencialmente no procedimento de recuperação e liquidação judicial do devedor acima exposto é aplicado às microempresas e empresas de pequeno porte.

Robson Zanetti

é mestre e doutorando em Direito Privado pela Université de Paris. Especialista em Direito Privado pela Università degli Studi di Milano. E-mail:
robsonzanetti@yahoo.com.br

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