A multa de 40% do FGTS

O ministro do Trabalho e Emprego Jaques Wagner admitiu a possibilidade de substituir o direito do empregado em receber 40% do valor depositado do FGTS a título de multa face a despedida sem justa causa, desde que seja aprovado outro dispositivo de proteção ao trabalhador. Matéria polêmica, eis que o pagamento da multa de 40% do FGTS é dispositivo constitucional (art. 10, I, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias) e somente poderá ser revogado caso seja aprovada Lei Complementar ao artigo 7.º, I, da Constituição Federal, que determina a garantia de emprego ao trabalhador contra a despedida imotivada.

Traduzindo esta questão jurídica: somente depois de aprovada a Lei Complementar estabelecendo que o empregado não pode ser despedido a não ser que haja motivação legal, é que a multa dos 40% sobre o FGTS poderia ser eliminada. Esta é a determinação constitucional e que não poderá ser alterada a não ser por uma emenda à Carta Magna.

Ficamos assim, portanto: ou se aprova a Lei Complementar de garantia de emprego, ou se aprova emenda constitucional modificativa do dispositivo atual. Caso contrário, não se poderá eliminar o direito do empregado em receber a multa dos 40% do FGTS. Qualquer outra discussão será perda de tempo. Por evidente, que no Fórum Nacional do Trabalho essa matéria será um dos pontos enfocados.

Os empregadores alegam que se trata de encargo social que encarece o produto e a extinção da multa aliviaria o custo da contratação e, em conseqüência, poderiam ser gerados mais empregos. Os empregados alegam que a multa de 40% é um castigo financeiro ao empregador que despede o empregado sem qualquer motivação e, de uma hora para outra, o trabalhador fica desempregado.

Os empregados também argumentam que a multa é um valor a mais para o empregado enfrentar o desemprego que, nos tempos atuais, poderá ser longo. Os empregadores contra-argumentam com a desoneração no custo da produção, o menor preço das mercadorias e o aumento das vendas e, assim, maior número de empregos.

O empregador não quer ouvir falar em garantia de emprego ao trabalhador. Relembre-se a Convenção 158-OIT que estabelece a garantia de emprego e que vigorou por muito pouco tempo em nosso país e foi denunciada pelo governo federal sob pressão das entidades empresariais. Além disso, lei complementar para garantia de emprego nunca prosperou no Congresso Nacional. Todos os projetos de lei regulamentando o dispositivo constitucional, desde 1990, não prosperaram, ou rejeitados, ou arquivados. Não há, portanto, solução à vista e o sistema atual da multa deverá permanecer.

Quanto ao empregado querer sair do emprego e receber o FGTS e, assim, devolver o valor da multa ao empregador, é fato que ocorre, mas em escala menor e que não é o determinante para ser o motivo da crítica ao sistema.

A trajetória do FGTS tem sido tortuosa e está no momento de estabilizá-lo como figura econômica, social e jurídica. Neste sentido, juridicamente já tem o status de item constitucional e, assim, não pode ser suprimido, a não ser por emenda constitucional.

O percentual que deve ser recolhido é motivo de altos índices de sonegação por parte das empresas e de uma ineficaz fiscalização, punição e cobrança contra os sonegadores. A aplicação dos recursos sempre foi ligada a interesses dos governos federais e estaduais vinculados a grandes grupos econômicos. Está no momento, assim, de introduzir mudanças no sentido de tornar o FGTS um instrumento eficaz de transformação social e não um encargo que muitos querem suprimir.

Essas alterações poderiam caminhar na seguinte direção: a) aplicação dos recursos exclusivamente no plano habitacional e sua infra-estrutura; b) aplicação dos recursos e execução das obras através de gestão tripartite do governo, sindicatos de trabalhadores/cooperativas e empresas; c) controle mensal da arrecadação e execução imediata dos valores sonegados; d) punibilidade criminal por crime de sonegação. A partir dessas medidas, outras devem ser examinadas diante da experiência de quase quarenta anos da lei do FGTS.

Relembre-se o último episódio jurídico que envolveu o FGTS, no que se refere ao pagamento das diferenças devidas dos planos econômicos, reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal e que o governo federal promoveu e denominou de “o maior acordo do mundo”, lesando trabalhadores e advogados.

Será fundamental diante de tantas irregularidades que a Ouvidoria do Ministério do Trabalho promova medidas visando encaminhar pedido de auditoria ao Conselho Gestor do FGTS, direcionada na responsabilização de todos aqueles que se beneficiaram dos recursos do FGTS em detrimento do povo trabalhador.

Edésio Passos

é advogado, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros e da Abrat, consultor jurídico de entidades sindicais de trabalhadores, ex-deputado federal (PT-PR). E-mail:
passos@terra.com.br

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