O último Fusca produzido no mundo deixou ontem a fábrica da Volkswagen em Puebla, no México. O simpático carrinho longevo vai deixar saudades, mas sua obsolescência se tornou indisfarçável há muito tempo. No Brasil, onde foi produzido de 1959 a 1986 e de 1993 a 1996, ele se tornou símbolo de uma prática comum da indústria automobilística: o prolongamento da sobrevida de modelos defasados tecnologicamente.

O apego do mercado nacional por modelos ultrapassados é tanto que, no Brasil, carros de gerações diferentes convivem nas linhas de produção. Há exemplos disso nas linhas Fiat, Volks, Ford e Chevrolet. O Palio chegou ao mercado em 1996, para ser o sucessor do Uno, lançado em 1984 e que continua em linha até hoje. O Santana, versão sedã do Passat II alemão, conviveu quatro anos com o Passat I, no Brasil, e sobrevive até hoje, mesmo depois da chegada do Passat das gerações III e IV, importado da matriz alemã desde a década passada. Apesar do lançamento do Focus há dois anos, o Escort ainda não foi descontinuado. A vinda do Vectra, no início da década passada, não impediu que o veterano Monza fosse produzido por mais alguns anos.

A capacidade de improvisação do brasileiro também é responsável pelo atraso tecnológico de alguns carros. O Gol foi lançado em 1980 com o velho motor VW refrigerado a ar, disposto longitudinalmente na parte dianteira do veículo. Só em 84, com a chegada da versão GT 1.8, o carrinho recebeu um propulsor da família VW-Audi a água. Ele foi reestilizado várias vezes, mas até hoje a posição do conjunto motopropulsor continua longitudinal, o que é injustificável num veículo com tração dianteira. Apesar dessa falha imperdoável, o Gol ainda não saiu de linha.

Outro exemplo do jeitinho brasileiro usado para o mal é o do Escort, que chegou ao Brasil há 20 anos. Na época, para reduzir custos, a Ford resolveu fazer modificações no velho motor de origem Renault que equipava a família Corcel. O rendimento do motor melhorou um pouco, mas ele continuava com o comando de válvulas no bloco, acionando as válvulas por meio de varetas, enquanto o propulsor do Escort europeu já tinha o comando no cabeçote, mais eficiente. A Ford brasileira só passou a dispor de um motor decente quando se associou à Volks na extinta Autolatina.

E a Kombi, então? A van quarentona é um “fóssil vivo”, com o velho motor traseiro refrigerado a ar, o mesmo que equipava o Fusca, o “Zé do Caixão” (alguém aí sabe o nome oficial daquela coisa?), o TL, a Variant, a Brasília, o Karmann-Ghia e o SP1/SP2. Com poucas modificações, é o mesmo veículo multi-uso que chegou ao Brasil nos anos 50. Derivada do Fusca, de certa forma ela ainda o mantém vivo.

Ari Silveira (ari@oestadodoparana.com.br) é chefe de Reportagem de O Estado

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