A lição do penta

Não faz sentido usar a Argentina como referência para a análise das turbulências que o Brasil enfrenta. A Argentina, além de seus sérios problemas políticos e econômicos, veio para casa cedo; o Brasil chegou com a taça do pentacampeonato, fez papel bonito lá fora e não está tão desarrumado aqui dentro quanto se imagina. Pelo menos por ora, a vida, entre nós, ficará mais colorida. O otimismo do título haverá de contagiar inclusive os candidatos, até aqui com um pouco de mau-humor devido aos ataques e escaramuças de lado a lado. Analistas de plantão e investidores de ocasião devem deixar para segundo plano a volatilidade do mercado.

Ademais, é importante que se avalie melhor a lição desse caneco: a seleção foi para o outro lado do mundo desacreditada. Pouca gente colocava fé no escrete, muito menos no técnico Felipão. A cada jogo, as coisas foram se invertendo. A ordem interna da equipe foi mantida com o argumento da importância da unidade, da compreensão, da auto-emulação, do bom humor e, principalmente da auto-estima em alta. Ninguém duvida que o bom desempenho em campo dos jogadores teve muito a ver com o excelente clima da concentração, inspirado no estilo familiar de Felipão. Uma a uma, as dificuldades foram sendo vencidas, até que chegamos ao enfrentamento final. Foi bom vencer.

Embora o nosso exportar ou morrer é ainda um discurso, nossas diferenças sociais ainda sejam nossa principal vergonha, nossos juros estejam muito altos, tenhamos uma dívida externa astronômica e outra interna descomunal, paguemos impostos demais em troca de quase nada… tudo isso são problemas que podem ser resolvidos. É preciso um pouco de inspiração scolariana (ou, se preferir, felipiana), bom-humor mas, principalmente, vontade de realizar dentro de um espírito construtivo e natural. Ninguém vence uma equipe disposta à luta e que conta com a força positiva da torcida.

Nossa política (e nossos políticos) nem sempre positiva, esquece o essencial: de enxergar a maior riqueza desse país, que é seu povo. Além de abusar um pouco de sua boa-vontade, menospreza sua capacidade de vencer, quando só o povo (assim como a equipe de Felipão) é capaz de realizar o milagre da virada. Talvez tenha sido esta a descoberta maior dos analistas do Instituto de Economia Internacional e do Centro de Desenvolvimento Global. No dia seguinte à conquista do penta, eles entraram em cena para descartar nosso imaginado (e por vezes anunciado) colapso. A falta de confiança de alguns investidores – dizem eles – decorre de uma tremenda falta de conhecimento de nossa realidade. Mesmo que as eleições presidenciais sejam vencidas por candidatos da oposição – Lula, no caso – nossa situação pode ser ainda melhor, desde que eles defendam e executem políticas econômicas responsáveis. E exorcizem de vez o fantasma do calote.

Por esses dias todos – esta semana, pelo menos – o Brasil inteiro será uma só festa. Depois, terá início para valer a campanha eleitoral. Que seja uma campanha bonita como aquela comandada por Felipão. O bom-humor, a determinação e o otimismo são ingredientes indispensáveis em substituição ao tom denuncista, negativista e pouco construtivo até aqui experimentado.

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