A legitimidade passiva do condômino em caso de execução trabalhista de dívidas do condomínio

Um dos aspectos mais polêmicos que envolve o Direito Processual do Trabalho diz respeito à execução trabalhista.

Quem milita nesta Justiça Especializada ou mesmo quem algum dia já foi autor ou réu numa demanda trabalhista, sabe do que estou falando, pois as insatisfações inerentes a esta fase processual ocorrem independentemente do polo que se ocupa na relação processual, seja pelo reclamante em razão da morosidade na satisfação do crédito, seja pelo reclamado, que muitas vezes tem seu patrimônio penhorado indiscriminadamente, de forma desproporcional à execução que se discute(1).

Dissertar acerca da execução trabalhista é uma tarefa extremamente difícil e dolorosa, na medida em que raros são os temas que não albergam algum tipo de polêmica ainda não resolvida.

Dentro desta realidade, portanto, optei por escrever sobre um tema ainda pouco explorado, tanto pela doutrina laboral, como pelos Tribunais Trabalhistas, mas que traz aspectos polêmicos tão intensos que merecem ser, ainda que sucintamente, estudados e discutidos.

Tratarei, neste breve artigo, acerca da legitimidade passiva ordinária dos condôminos em relação às obrigações trabalhistas dos empregados do condomínio.

Nesta seara existem duas posições diametralmente opostas.

Segundo os adeptos da teoria do empregador único, como por exemplo o juslaboralista EDILTON MEIRELLES(2), “no consórcio empresarial, sendo o grupo econômico o empregador, tanto faz o empregado demandar contra o grupo em si como contra qualquer das pessoas jurídicas que lhe compõe, pois o vínculo é único, sendo os integrantes do grupo solidariamente responsáveis pelos débitos contraídos”. Desta forma, em se admitindo a figura do empregador único, a citação judicial de uma das empresas ou sociedades representativas do grupo, seria suficiente para que todo o grupo tivesse conhecimento da demanda. Por consequência, a apresentação de defesa por qualquer uma delas aproveitaria às demais.

Por esta teoria, as empresas ou sociedades integrantes do grupo seriam consideradas como um único empregador para fins de direito material e processual e, portanto, estariam legitimadas a responder em juízo em nome das demais.

É com base nesta teoria que alguns juristas e doutrinadores, encontram respaldo para legitimar a execução dos condôminos, ainda que não integrantes do título judicial, nos casos de dívidas trabalhistas adquiridas pelo condomínio, conforme ensina o Dr. Cláudio Armando, vice-presidente do TRT da 17.a Região, em artigo publicado sobre o tema (Ob. Cit, p. 127):

“A tese encontra resposta ainda na analogia com o condomínio vertical. Os condôminos respondem pelas obrigações trabalhistas, mesmo quando não são partes na demanda, até porque o condomínio atua em juízo através de seu síndico (art. 2.o, Lei n. 2.757/56). De maneira que o condômino, apesar de não ter participado da relação processual como reclamado, responderá por seus bens na execução movida pelo empregado do condomínio, pois para ser responsabilizado basta que o síndico tenha participado da relação processual. Com efeito, conforme se extrai da inteligência da Lei 2.757/56, empregador é o condomínio enquanto “empresa” (art. 1.o). O condomínio, por sua vez, é representado em juízo pelo síndico (art. 2.o), mas os condôminos respondem, proporcionalmente, pelas obrigações trabalhistas, `inclusive as judiciais e extrajudiciais’ (art. 3.o). Assim, ainda que não tenha sido demandado na relação cognitiva (na relação trabalhista), o condômino poderá, em execução, ser responsabilizado pelo crédito trabalhista”.

Diante desta realidade, os defensores da tese do empregador único admitem que, na ausência de bens comuns do condomínio passíveis de penhora, penhorar-se-ão os bens de qualquer dos condôminos, suficientes à satisfação da execução, ainda que estes não tenham integrado o polo passivo da demanda no curso da fase cognitiva. Nesta hipótese, o(s) condômino(s) que teve seus bens penhorados, sub-roga-se no direito do credor em relação aos outros co-obrigados (Ob. Cit., p. 127).

O TRT da 5.a Região, já proferiu decisão neste sentido:

“O condômino não é terceiro em relação em relação ao condomínio e pode ter bem penhorado de sua propriedade para a garantia de dívida de natureza trabalhista, do condomínio”. (TRT, 5.a R. 164/75, Ac. 262/76, 11.02. 1976, Rel. Juiz Alves Ribeiro).

A posição doutrinária e jurisprudencial oposta a acima defendida, ensina o Dr. Cláudio Armando, “parte da premissa de que ocorreria afronta ao devido processo legal ao se ter como empregador único, para efeitos processuais, o consórcio de empregadores. Nesta senda trilha a Súmula 205 do Col. TST, segundo a qual o responsável solidário, componente do grupo, que não integrou a relação processual na qualidade de reclamado e, por conseguinte, deixou de constar no título executivo, está a salvo da execução” (Ob. cit., p. 127).

Diante do posicionamento adotado pelo C. TST, através da edição da Súmula 205, pode-se afirmar que a tendência jurisprudencial dominante, é no sentido de rejeitar o entendimento do grupo como empregador único para fins meramente processuais, de forma que cada condômino seja considerado independente e autônomo para efeitos de constituição do título executivo judicial.

404142 – EXECUÇÃO – CONDOMÍNIO – SOLIDARIEDADE – Não se presume a solidariedade de um condômino para responder pela totalidade da execução contra o Condomínio regularmente instituído. (TRT 1.ª R. – MS 484/94 – Rel. Juiz Juarez Machado Garcia – DORJ 21.09.1995)

Entendo que, ainda que o Enunciado 205, num primeiro momento, represente aparente retrocesso em termos de celeridade na execução trabalhista, concordo que a sua edição proporciona à parte executada a observância ao princípio constitucional do devido processo legal. Admitir que o condômino, que em momento algum integrou o polo passivo da demanda, responda com seus bens particulares, diversos do patrimônio do condomínio reclamado, fere diretamente a regra constitucional mencionada, bem como cria uma insegurança jurídica à sociedade, inadmissível num Estado Democrático de Direito (art. 1.o, CF/88).

Notas

(1) Tal fato se verifica com mais frequência atualmente, em razão da penhora “on line” das contas correntes das empresas, em razão de convênio firmado entre a Justiça do Trabalho e o banco Central do Brasil.

(2) In MENEZES, Claudio Armando Couce de. Legitimidade ad causam na execução trabalhista (sucessores; sociedades integrantes de grupo de empresários; sócios; administradores e acionistas). Revista do Tribunal Superior do Trabalho. Vol. 21, ano 69, n. 1, jan a jun – 2003, p. 126.

Vanessa Karam de Chueiri Sanches

é advogada e especialista em Direito do Trabalho.

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