Na esteira da polêmica do sistema de cotas implantado pela Universidade Federal do Paraná no vestibular de 2005, alguns estudantes estão buscando na Justiça o direito de se matricular nos cursos para os quais não obtiveram aprovação. O meio comumente utilizado é o mandado de segurança, que consiste em uma ação civil constitucional cuja tramitação é bastante célere, pois exige do Impetrante (o ?autor? da ação) a imediata comprovação da liquidez e certeza dos fatos narrados na peça inicial. Com o pedido de concessão da segurança, o impetrante busca garantir o acesso ao ensino superior no lugar de um ?cotista? cujo desempenho no concurso tenha se mostrado inferior ao seu.

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Pessoalmente defendo que todos os candidatos deveriam concorrer em grau de igualdade às vagas do ensino superior. Isso porque a Constituição Federal garante que o acesso aos níveis mais elevados de ensino deverá ocorrer ?segundo a capacidade de cada um? (art. 208, inc. V), o que torna inconstitucional, por mais sublime que seja sua finalidade, qualquer norma que estabeleça critérios classificatórios que não encerram uma relação de pertinência lógica com o mérito (capacidade intelectual) do concorrente.

No caso da UFPR, além da ofensa ao dispositivo legal acima mencionado, não se pode negligenciar o fato de que a criação do sistema de cotas deu-se através de resoluções, isto é, normas administrativas que não possuem status de lei e, nesse sentido, não podem restringir os diretos dos ?não-cotistas?, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade, também previsto em nossa Constituição (art. 5º, inc. II).

Cumpre também consignar que, muito embora tenha o objetivo de combater a pobreza e as desigualdades sociais, a verdade é que o sistema de cotas da UFPR mostra-se essencialmente discriminatório, pois parte do falso pressuposto de que os afrodescendentes não possuem capacidade intelectual suficiente para serem aprovados através das vias ordinárias do vestibular. A partir do momento em que a UFPR elege o critério ?cor da pele? para o reconhecimento dos afrodescendentes, além de correr o risco de reputá-los intelectualmente inferiores, está conferindo-lhes um tratamento diferenciado em relação aos candidatos das demais ?raças?, o que não se justifica em face dos recentes estudos comprovadores que a representatividade dos negros nas escolas superiores federais já é idêntica à existente na sociedade brasileira. Cabe aqui, portanto, a conclusão de que as cotas ferem, além de tudo, o princípio da isonomia, que assegura tratamento igual a todos, naquilo que sejam iguais (art 5.º, caput, da CF) e agridem um dos objetivos fundamentais da República, que é o de promover o bem de todos, sem preconceito de origem, de raça, de cor, de sexo ou de idade (art. 3.º, inc. IV, da CF).

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Dessa forma, parece evidente que o sistema de cotas implementado pela UFPR é reflexo da posição que o Poder Público tomou na guerra contra as deficiências da educação no Brasil: em vez de tomar medidas efetivas para sanar o problema em sua origem, prefere buscar soluções paliativas que perpetuam as distorções sociais e fazem com que a sociedade seja, mais uma vez, a maior prejudicada.

Paulo Sergio Nied é advogado.www.agkn.com.br

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