A correção monetária do saldo devedor de contratos no Sistema Financeiro da Habitação

Matéria constantemente discutida nas ações revisionais dos contratos firmados no âmbito do SFH, a correção monetária do saldo devedor dos contratos abrange uma série de leis e normas baixadas pelo extinto BNH e, por seu sucessor, Conselho Monetário Nacional, este através do Bacen, tendo ampla repercussão os indexadores, as vezes transitoriamente nos vários planos econômicos editados.

Primeiramente, com apenas uma observação, para corrigirmos alguns equívocos, a Caixa Econômica Federal não é e nunca foi sucessora do Banco Nacional da Habitação, quanto a orientação, normatização e fiscalização do Sistema Financeiro da Habitação, de acordo com o definido no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 2.291/86, essa competência é unicamente do Conselho Monetário Nacional, que por sua vez delega sua competência para fins de publicação de normas ao Bacen.

Assim, passamos a elencar a legislação referente à correção monetária dos saldos devedores no SFH, assim como, quando possível, a normatização baixada pelo órgão disciplinador do SFH (BNH e Bacen).

A Lei n.º 4.380, de 21 de agosto de 1964, em seu artigo 6.º, letras "a" e "b" previu o indexador para reajustamento do saldo devedor, entretanto revogados pelo art. 30 da Lei n.º 4.864/65, prevalecendo na seqüência o DL. 19/66.

Conforme mencionado pelo dr. José Maria Aragão em seu livro SFH (Ed. Juruá, 1999), "a primeira regulamentação do BNH sobre correção monetária das aplicações ativas do SFH veio com a Instrução n.º 5, de 27.01.66. Em ambos os Planos a correção monetária dos saldos devedores far-se-ia, a cada trimestre civil, segundo a variação da ORTN, no trimestre anterior (o que viria a constituir a Unidade Padrão de Capital do BNH -UPC (art. 3.º, III).

Já o DL. n.º 19, de 30 de agosto de 1966, em seu artigo 1.º, assim previu: "Em todas as operações do Sistema Financeiro da Habitação deverá ser adotada cláusula de correção monetária, de acordo com os índices de correção monetária fixados pelo Conselho Nacional de Economia, para correção do valor das obrigações reajustáveis do Tesouro Nacional, e cuja aplicação obedecerá as instruções do Banco Nacional da Habitação".

Em 17.11.66, o BNH, com fundamento no Dec.-Lei n.º 19/66, baixou a Res. n.º 106, determinando que "todas as operações do SFH farão referência expressa de seu valor em UPC do BNH, vinculando a UPC à variação trimestral das ORTN."

O DL. n.º 70, de 21 de novembro de 1966, em seu artigo 9.º, § 2.º, assim definiu: "A menção a Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional nas operações mencionadas no § 2.º, do art. 1.º do Decreto-Lei n.º 19/66, e neste Decreto-Lei, entende-se como equivalente a menção de Unidades-Padrão de Capital do Banco Nacional da Habitação e o valor destas será sempre corrigido monetariamente durante a vigência do contrato, segundo os critérios do art. 7.º, § 1º, da Lei n.º 4.357, de 1964".

O DL. n.º 2.164, de 19 de setembro de 1984, que introduziu o Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional, manteve a correção monetária do saldo devedor dos contratos pela variação da UPC.

Com a edição do primeiro plano econômico, o chamado Plano Cruzado, através do Decreto-Lei n.º 2.284, de 10 de março de 1986, a UPC foi extinta. Os saldos devedores de contratos no âmbito do SFH foram regulados pelos Decretos n.ºs 92.492, de 25.03.1986 e 92.591/86, em face da conversão obrigatória. Na forma do Parágrafo Único do artigo 3.º do Dec. 92.492/86, ficou definido que a "Data de reajustamento do contrato é o dia, em cada trimestre civil, que corresponde à data de sua celebração". Entretanto, esse critério foi revogado pelo artigo 1.º do Dec. n.º 93.598/86, que assim preceituou: "Data de reajustamento do contrato é o primeiro dia de cada trimestre civil".

Em face do contido no DL. 2284/86 e da extinção da UPC do BNH, o BNH baixou a Res. n.º 58/86, a qual em seu artigo 3.º definiu que "os saldos devedores dos contratos no âmbito do SFH seriam reajustados pela mesma proporção da variação do valor da OTN vigente no mês do reajustamento em relação ao vigente no mês de assinatura do contrato"..

Com a extinção do BNH pelo DL. n.º 2.291/86, o CMN, através do BACEN, baixou primeira a Res. n.º 1.221/86, a qual em seu item III, determinou: "As operações de financiamento imobiliário, de que trata esta Resolução, terão cláusula de atualização vinculada ao rendimento das Letras do Banco Central (LBC)". Já com a Res. Bacen n.º 1.253/87, ainda em vigor, a qual em seu item III assim definiu: "As operações de financiamento imobiliário, de que trata esta Resolução, terão cláusula de atualização vinculada aos índices de atualização do depósito de poupança".

A partir dessa resolução do Bacen todos os saldos devedores dos contratos firmados no âmbito do SFH passaram a utilizar como indexador o mesmo índice de variação aplicada à atualização monetária dos saldos das cadernetas de poupança.

Ainda, na regulamentação do Plano Cruzado, o Dec. n.º 94.060, de 26 de fevereiro de 1987, assim definiu: "Art. 3.º – O § 2.º do artigo 9.º do Decreto n.º 92.492, de 25.03.1986, passa a vigorar com a seguinte redação: Art. 9.º – § 2.º – Os contratos com reajustamentos vinculados à variação da UPC passam igualmente a ser reajustados com base na OTN, adotando-se para o reajuste de que trata o parágrafo anterior, nesses contratos, a variação do valor nominal da OTN ocorrida de 1.º de março de 1986 a 1.º de março de 1987".

No que tange aos contratos vinculados à UPC do BNH, o Decreto n.º 94.548, de 02 de julho de 1987, revigorou a UPC para os contratos assinados anteriormente a 28 de fevereiro de 1986, preceituando em seu artigo 1.º: "Os contratos de financiamento imobiliário, celebrados anteriormente a 28 de fevereiro de 1986, que estejam vinculados à Unidade Padrão de Capital – UPC, de que trata a Lei n.º 4.380, de 21 de agosto de 1964, voltam a ser atualizados pela referida Unidade, mantida a periodicidade prevista no contrato".

Já no artigo 2.º desse mesmo decreto, adotou-se o seguinte: "A Unidade Padrão de Capital – UPC passa a ser atualizada mediante aplicação do índice de atualização dos saldos dos depósitos de poupança livre, para fins de reajustamento de saldos devedores e de prestações vinculadas a essa unidade".

Em face do aparecimento do rombo do FCVS, duas importantes normas foram editadas com o objetivo de reduzir o saldo devedor apenas dos contratos vinculados ao Fundo de Compensação de Variações Salariais – FCVS.

Assim, o Decreto n.º 2.406, de 05 de janeiro de 1988, em seu artigo 3.º, assim preceitua: "O reajuste monetário dos saldos devedores dos contratos de financiamento, para efeito de apuração do saldo devedor residual de que trata o artigo anterior, será feito com base na variação do Índice de Preços ao Consumidor (IPC), no período de 28 de fevereiro de 1986 a 30 de novembro de 1986, e, após esta data, com base no índice que for utilizado para corrigir o saldo dos depósitos em cadernetas de poupança, observando-se a periodicidade de atualização dos saldos de cada contrato".

Entretanto, com o Decreto n.º 97.222, de 24 de dezembro de 1988, que o Poder Executivo deu o "chamado pulo do gato", desrespeitando os contratos assinados entre os Agentes Financeiros e os mutuários finais, e determinou no seu artigo 2.º, o seguinte: "No reajustamento monetário do saldo devedor de cada financiamento a que se refere o artigo anterior, observar-se-ão os seguintes procedimentos: I – no respeitante a contratos celebrados até 27 de fevereiro de 1986: a) no primeiro reajustamento, aplicado no primeiro dia do trimestre civil subseqüente ao de assinatura do contrato, incide correção monetária "pro rata" dia, tomando-se por base a variação da Unidade Padrão de Capital, correspondente ao período contado da data da referida assinatura até o último dia do respectivo trimestre civil; b) …..; c) ……..; II -no respeitante a contratos celebrados no período de 28 de fevereiro de 1986 a 24 de novembro de 1986: a) no primeiro reajustamento, aplicado no dia 1º de março de 1987, incide correção monetária "pro rata" dia, calculada: 1) com base na variação do Índice de Preços ao Consumidor (IPC), relativa ao período contado da data de celebração do contrato até o dia 30 de novembro de 1986; 2) com base no mesmo índice que for utilizado para corrigir os saldos dos depósitos de poupança, relativamente ao período compreendido entre 1.º de dezembro de 1986 a 28 de fevereiro de 1987; b) nos reajustamentos subseqüentes, incide correção monetária, calculada com base na variação da OTN e com a periodicidade em que esta ocorrer; c) no período transcorrido desde a data do último reajustamento, aplicado na forma da alínea anterior, e a data pactuada para pagamento da última prestação do contrato, incide correção monetária "pro rata" dia com base no mesmo índice que for utilizado para corrigir os saldos dos depósitos.

Com esse dispositivo legal os Agentes Financeiros deixaram de manter os contratos com aquele "inchaço" decorrente do ganho de correção monetária em período anterior à efetiva data de contratação para efeito de habilitação do saldo residual no FCVS.

No Plano Verão, a Lei n.º 7.730, de 31 de janeiro de 1989, artigo 19, assim preceituou: "Os saldos devedores dos contratos celebrados com entidades do Sistema Financeiro da Habitação – SFH e os relativos ao crédito rural, lastreados pelos recursos das respectivas cadernetas de poupança, serão corrigidos de acordo com os critérios gerais previstos no artigo 17 desta lei, observando-se: …. . O artigo 17, assim contém: "Os saldos das cadernetas de poupança serão atualizados: I – no mês de fevereiro de 1989, com base no rendimento acumulado da Letra Financeira do Tesouro Nacional – LFT verificado no mês de janeiro de 1989, deduzido o percentual fixo de 0,5% (meio por cento); II – nos meses de março e abril de 1989, com base no rendimento acumulado da Letra Financeira do Tesouro Nacional – LFT deduzido o percentual fixo de 0,5% (meio por cento), ou da variação do IPC, verificados no mês anterior, o que for maior; III – A partir de maio de 1989, com base na variação do IPC verificada no mês anterior".

A Lei n.º 7.738, de 09 de março de 1989, a qual em seu artigo 6;º assim definiu: "A partir de fevereiro de 1989, serão atualizados monetariamente pelos mesmos índices que forem utilizados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança; I – ….; II – os saldos devedores dos contratos celebrados por entidades integrantes do Sistema Financeiro da Habitação e do Saneamento (SFH e SFS), lastreados pelos recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, mantida a periodicidade prevista contratualmente; III – as operações ativas e passivas dos fundos vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação; IV – demais operações realizadas por instituições integrantes do Sistema Financeiro da Habitação com cláusula de atualização monetária vinculada à variação da Obrigação do Tesouro Nacional – OTN".

Assim, de acordo com as citadas leis, todos os contratos do SFH, assinados a partir de 1 de março de 1986 passaram a ser atualizados mensalmente, na mesma proporção dos índices de atualização aplicados aos depósitos de poupança livre, sendo que a UPC, por estar indexada à variação da poupança, passou a acompanhar a mesma variação do IPC (art. 17 da Lei n.º 7.730/89), o mesmo acontecendo com os contratos cuja previsão contratual era a variação da OTN (DL. 2.284/86).

Mas o embaraço jurídico maior estava a chegar com a edição do Plano Collor I, em março de 1990, com a Lei n.º 8.024, de 12 de abril de 1990, que tanto incomodou os operadores do direito para a correta aplicação daqueles dispositivos legais e da observância do ato jurídico perfeito e do direito adquirido (questões neste momento superadas).

A Lei n.º 8.024/90 em seu artigo 6.º assim preceituou: "Os saldos das cadernetas de poupança serão convertidos em cruzeiros na data do próximo crédito de rendimento, segunda a paridade estabelecida no § 2.º, do artigo 1.º, observado o limite de NCz$ 50.000,00 (cinqüenta mil cruzeiros novos). § 1º ……; § 2.º – As quantias mencionadas no parágrafo anterior serão atualizadas monetariamente pela variação do Bônus do Tesouro Nacional Fiscal (BTNF), verificada entre a data do próximo crédito de rendimentos e a data da conversão, acrescidas de juros equivalentes a 6% (seis por cento) ao ano ou fração "pro rata".

O Bacen, através do Comunicado Demec n.º 2.067, de 30 de março de 1990, divulgou os índices de atualização monetária dosa saldos das contas de poupança, calculados pela variação do IPC dos meses de janeiro, fevereiro e março de 1990, fixando o porcentual de 84,32% para o mês de março e com aplicação nas contas abertas até 18 de março de 1990.

Em decorrência dessa comunicado os saldos devedores dos contratos de financiamento no âmbito do SFH foram atualizados pelo mesmo porcentual de 84,32%, em face da previsão legal (Lei n.º 7.730/89) de que os saldos seriam atualizados pelos mesmos índices de correção dos depósitos de poupança.

Já no Plano Collor II, com a criação da Taxa Referencial, a Lei n.º 8.177, de 1 de março de 1991, basta repetir o contido no § 2.º do artigo 24, não alcançado pela inconstitucionalidade, que retrata a seguinte situação: "Os contratos celebrados a partir da vigência da medida provisória de que origem a esta Lei pelas entidades mencionadas neste artigo, com recursos dos depósitos de Poupança, terão cláusula de atualização pela remuneração básica aplicável aos Depósitos de Poupança, com data de aniversário no dia de assinatura dos respectivos contratos".

Aqui nova discussão sobre os saldos devedores de contratos no SFH. Afinal, a Taxa Referencial – TR, é uma taxa de juros ou índice de atualização de correção monetária (na visão do saudoso Prof. Mário H. Simonsen a TR funcionaria com uma LIBOR), principalmente para os contratos assinados a partir da vigência da medida provisória que deu origem a Lei n.º 8.177/91.A Súmula 295 do STJ, neste sentido, tem o seguinte enunciado: "A Taxa Referencial – TR é indexador válido para contratos posteriores à Lei n. 8.177/91, desde que pactuada".

Assim, finalizando essa cronologia, temos que a Lei n.º 8.692, de 28 de julho de 1993, que criou o PCR e o PES (já admitidos outros planos de amortização pela Medida Provisória n.º 1.671, de 24.06.1998 e suas reedições), em seu artigo 15, assim preceitua: "Os saldos devedores dos financiamentos de que trata esta Lei serão atualizados monetariamente na mesma periodicidade e pelos índices utilizados para a atualização: I -…; II – dos depósitos em caderneta de poupança correspondentes ao dia da assinatura do contrato, nos demais casos".

O Bacen baixou a Res. n.º 1.980/93, que em seu art. 19 assim preceitua: "Os saldos devedores dos contratos de financiamento, empréstimo, refinanciamento e repasse concedidos por entidade integrante do SFH serão ajustados pela remuneração básica dos depósitos de poupança, efetuada na mesma data e com a periodicidade contratualmente estipulada para o pagamento das prestações, aplicando-se o critério "pro rata die" para eventos que não coincidam com aquela data".

Meramente como informação adicional o Plano Real, através da Lei n.º 8.880, de 27 de maio de 1994, não trouxe qualquer alteração nos indexadores de saldos devedores de contratos no âmbito do SFH, a não ser em conseqüência da conversão dos saldos pelo valor da URV, determinando expressamente em seu artigo 16: "Continuam expressos em cruzeiros reais, até a emissão do Real, e regidos pela legislação específica: I – …; II -os depósitos de poupança; III – as operações do Sistema Financeiro da Habitação e do Saneamento (SFH e SFS) ….".

Desta maneira estão visualizados neste trabalho alguns aspectos da correção monetária aplicada aos saldos devedores de contratos no âmbito do SFH, desde a Lei 4.380/64 até a Lei n.º 8.692/93, registrando, finalmente, minha posição que o Sistema Financeiro da Habitação, criado pela Lei n.º 4.380/64 e legislação complementar, tem uma estrutura toda própria quanto a sua legislação e normatização, não tendo qualquer repercussão com a Lei n.º 4.595/64, que trata do Sistema Financeiro Nacional.

Dalton A. S. Gabardo é advogado e consultor imobiliário.

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