A caixa-preta do INSS

O governo federal abriu a caixa-preta do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS. E o que saiu de dentro foi muito mais do que se imaginava: uma infindável relação de devedores que inclui, além de bancos (a social Caixa Econômica Federal no meio!), companhias aéreas, prefeituras, universidades, órgãos e empresas públicas e privadas de bom calibre, também assembléias legislativas, Correios e municípios, totalizando a astronômica soma de R$ 65,4 bilhões.

O rombo, entretanto, é bem maior. O levantamento não inclui as dívidas já renegociadas ou com a cobertura de depósitos judiciais, que somam outros R$ 60,4 bilhões, nem aquelas que estão sendo cobradas administrativamente, no importe de R$ 27,3 bilhões. Somados, esses três números alcançam a bagatela de R$ 153,1 bilhões. É uma montanha de dinheiro difícil de imaginar. Só para efeito de comparação, diga-se que corresponde a mais de 60% de toda a arrecadação nacional esperada para este ano, orçada na casa dos R$ 253 bilhões. Nessa caixa-preta, que seria ainda maior, não entram os que estão pagando dívidas pactuadas pelo Refis ou coisas do gênero.

Tem-se aí uma idéia de outros males de que padece a Previdência, saqueada por portas e janelas pelos sucessivos golpes descobertos ou pelas aposentadorias milionárias travestidas de direitos adquiridos. Que um quitandeiro apertado deixe de pagar, por absoluta impossibilidade, o que deve à seguridade, vá lá. Mas simplesmente não dá para entender como estão no rol dos devedores siglas como a Petrobras, Correios, importantes bancos e quejandos.

A maioria dos devedores trazidos à luz, é claro, não admitem estar em débito. Cada um tem mais que uma desculpa que transfere para o próprio governo a culpa da situação. Balela. Há quem até alegue obscuros princípios de sigilo, como se o crime de sonegação não superasse os limites da privacidade dos criminosos. O ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, garante que o critério adotado pelo governo foi o de divulgar aqueles débitos sobre os quais não há qualquer dúvida de que são, portanto, devidos. Há no rol dos devedores empresa ligada, até bem pouco, a membros do primeiro escalão do atual governo, como o ministro Luiz Fernando Furlan – e isso tira da publicidade qualquer suspeita. Nem mesmo o partido do presidente Lula – o PT, escapa da lista dos devedores, ali comparecendo com quase quinhentos mil reais de dívida, a maior dentre todos os partidos políticos.

Mas o próprio governo sabe que, dentre os devedores relacionados, há empresas que não existem mais. Isso torna impossível, como impossível tem sido até aqui, a recuperação de todo o dinheiro. Por isso, os objetivos da divulgação da lista – e não a relação dos devedores – passaram a ser imediatamente discutidos em Brasília. E surgiu a tese de que a ação faz parte de uma estratégia de governo para conquistar o apoio da sociedade para as reformas. Tanto que o ministro Berzoini procurou criar clima, ao anunciar diversas vezes que estava para dar à luz uma lista que muitos queriam continuasse no escuro.

Concordamos com os que dizem que “não há por que não mostrar os nomes dos devedores”. Mas daí a dizer que a enorme lista vai ajudar nas reformas, há controvérsias. Fica mais difícil, por exemplo, sem que a dívida seja primeiro cobrada, levar adiante a proposta da taxação dos inativos. Ou de dar outro salto na idade limite. Afinal, se mais da metade da população economicamente ativa está na informalidade (e, portanto, não contribui), e se tanta gente sonega, basta resolver essas duas questões para salvar a Previdência do atoleiro em que se encontra. Seria essa outra vertente importante para as reformas pretendidas. Talvez mais justa até.

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