A arte (suprema) de engolir sapos, cobras & lagartos

Um estadista famoso, não lembro bem se Churchill, Ro-osevelt ou De Gaulle, definiu um dia a política como a arte de engolir sapos, cobras e lagartos. Confesso que não comungo inteiramente desse ponto de vista, ainda que alicerçado na inequívoca autoridade de quem houve por bem -ou por mal – equacioná-lo.

Penso, pelo contrário, que são os eleitores que, periodicamente, são forçados a “engolir” muitos batráquios e répteis indigestos que atendem pelo nome de políticos.

Evidentemente, não estou me referindo a todos os políticos. Refiro-me apenas àquela “infinita minoria” de que falava, “cum grano salis”, o excelente Juan Ramon Jimenez. Aquele mesmo dos admiráveis “Platero y yo” e “Piedra y cielo”.

Um fato é público e notório: a política vive, no Brasil e no mundo, uma ápoca de crise sem precedentes. Jamais o seu descrédito foi tão visível neste nosso “brave new world”. Nunca o seu desprestígio foi tão evidente. Por isso mesmo, parecem cada vez mais oportunas as clássicas advertências de alguns pensadores ilustres que se debruçaram sobre a problemática política. Clássicas e contundentes. Mais ainda: sulfúricas, corrosivas, demolidoras.

O que dizia d?Aurevilly? “Nem os que amam a verdade nem os que adoram a beleza podem ocupar-se da política, pois esta, por sua vez, não se ocupa nem de uma nem de outra.

Por seu turno, D?Alambert enfatizava: “Se a guerra é a arte de destruir os homens, a política é a arte de enganá-los”. o próprio Voltaire, sempre cáustico e irônico, não deixou por menos: “A política brota sempre, não da grandeza mas da pequenez e da perversidade do espírito humano”. Evidentemente, há um certo exagero nessas colocações extremas. Sobretudo, é bom não generalizar. Generalizações apressadas são o caminho mais curto para injustiças transparentes. Evitemo-las, pois. “Est modus in rebus”. A verdade é que, a rigor, não é a política que verdadeiramente está em crise. Esta afeta, isso, o “homo politicus”.

A classe política

É cada vez mais generalizada a impressão de que os políticos, majoritariamente, são maus – demagogos, incompetentes, corruptos, venais, carreiristas, fisiológicos, oportunistas, desonestos, pusilânimes, mentirosos. Dir-se-á que se trata de mera impressão ou de simples aparência. Mas é bom não esquecer o que alguém escreveu um dia: “Em política, o que parece, é.”

Uma das razões básicas para a péssima imagem de que gozam os políticos talvez seja esta: trata-se de uma profissão – talvez a mais importante de todas, na medida em que é, a um só tempo, atividade e missão – que não conta com genuínos e autênticos profissionais. Não há escolas nem professores de política.

Os que exercitam a política são, na melhor das hipóteses, esforçados diletantes ou respeitáveis amadores. É certo que alguns são realmente chamados por uma vocação irresistível no sentido de realizar o bem público. Outros, porém, são movidos por razões menores – pela ambição, pelo apetite quase pantagruélico por uma sinecura, um alto salário sem grande trabalho, pela vaidade ou pela urgência na defesa de espúritos interesses pessoais, grupais ou corporativos.

Uns, pretendem de fato servir – e o fazem com idealismo, competência e grandeza. Louvemos esses. Outros, que infelizmente parecem ser em maior número, desejam apenas servir-se. Se não locupletar-se.

Uma coisa é indiscutível: a política é uma atividade séria e meritória. Tão séria que o imenso Platão chegou a considerá-la a “ciência régia”. E o próprio Aristóteles não hesitou em definir o homem como “zoon politikon”. Ou seja: animal político.

Seja como for, penso que a “ciência régia” platônica é um tema dos mais fascinantes. Voltarei a ele.

Voltar ao topo