A ameaça vem do norte

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso apostou todas as fichas na globalização, abrindo excessivamente as portas do país ao capital internacional, mostrando boa vontade, como se isso fosse tudo. Não é. É mais fácil um país pequeno se desenvolver, que o Brasil. E, ainda assim, enfrentam dificuldades. Para o Brasil é mais difícil, porque seus problemas são maiores e, também, porque suas características o credenciam a ser nova potência mundial. Claro que há chão. E, para entrar no clube, não basta apenas vontade.

O que não se pode é, no caminho para o desenvolvimento, cair em armadilhas. Um país nunca será grande se for ingênuo. Houve, há algum tempo, o discurso de que é preciso abrir as portas do país ao estrangeiro para em retribuição ter acesso a ele. Não é bem assim. Para ter acesso ao mercado externo, é necessário que se tenha produtos de qualidade com bom preços. E, ainda assim, o discurso soa faccioso.

O Brasil desenvolve produtos de boa qualidade, desde a agricultura, até alta tecnologia, como a indústria de aviões. E os seus produtos, com exceção de alguns primários, enfrentam acirrada concorrência, e barreiras tarifárias. Estas existem para proteger os similares locais. O jogo comercial não é limpo. O país necessita aprender a preservar e desenvolver o mercado interno, com a mesma competência que se procura conquistar o externo. Isto não é xenofobia. É lei de sobrevivência.

O historiador americano Thomas Skidmore, que conhece o Brasil mais que muitos brasileiros, segue a mesma linha. Aconselha o país a crescer internamente e a exportar bens com alto valor agregado. E pede muita cautela com a Alca. Ele diz que os Estados Unidos pressionam o Brasil para que a Alca seja implantada, apenas para legalizar a dominação no continente. E dá um aviso aos brasileiros: “Ninguém se iluda, eles não estão pensando na prosperidade do Brasil, unicamente na dos Estados Unidos”. Skidmore alerta que no governo americano ninguém liga para a América Latina. E para que não se diga que é coisa de brasileiro revoltado, ele define os americanos como “arrogantes e ignorantes”.

Bem, ele conhece os americanos mais que milhões de americanos, porque é historiador e sabe do que fala. Mas não é preciso ir longe. George W. Bush se assustou ao saber que há negros no Brasil. Assim como se espantou ao saber que os muçulmanos não são como o time dos Giants, todos iguais, e que há os sunitas, os xiitas e os etc, todos sem paciência com estrangeiros arrogantes.

E como sair desta arapuca? Skidmore sugere ao Brasil e à Argentina transformarem o Mercosul em um mercado comum de verdade, não a coisa atual, mais cheia de retóricas que ações concretas de integração. Sugere políticas comuns, regras que envolvam os juros, déficits públicos, taxas de desemprego, tarifas, como ocorre na União Européia. Quanto a Alca, o negócio não é para ser bom aos brasileiros. Os EUA querem agregar o mercado brasileiro e latino-americano ao dos Estados Unidos, para produtos americanos, sem reciprocidade justa.

Enfim, Skidmore, um americano, teve a decência de dar o seu recado. O perigo, meu chapa, vem do norte. Se os argentinos tiverem juízo, e os brasileiros também, têm uma chance.

Edilson Pereira

é editor em O Estado.

Voltar ao topo