A ameaça da impunidade

A redução do preço das tarifas está longe de ser o único desafio a ser superado na polêmica do pedágio cobrado nas rodovias do Paraná. Há um outro problema, tão grave quanto este, cuja solução ainda continua distante: a punição dos responsáveis pelos abusos denunciados pelo governo estadual. Caso essas acusações realmente sejam confirmadas pela auditoria que está começando a ser feita pelo Ministério dos Transportes e pelo Ministério Público, será necessário impor uma punição rigorosa, criminal e administrativa, a todos os governantes e empresários que se beneficiaram das distorções existentes no modelo de pedágio adotado no Paraná.

Uma punição rigorosa, porém, deveria significar muito mais que apenas a redução das tarifas em 30% ou 50%. Deveria resultar, necessariamente, na devolução dos valores eventualmente cobrados a mais pelas concessionárias aos contribuintes. Do mesmo modo, o Estado deveria ser ressarcido por eventuais prejuízos que tenha tido com a concessão dos benefícios às empresas desde a privatização do sistema, em 1998, durante o governo Jaime Lerner.

Infelizmente, porém, sabemos que isso é extremamente difícil. Mesmo no caso dos escandalosos desvios de recursos públicos ocorridos no Banco Banestado e na Banestado Leasing, que devem passar de R$ 350 milhões, nenhum dos acusados sofreu qualquer tipo de punição semelhante. A CPI Mista do Congresso Nacional que investiga essas irregularidades também não possui base legal para reparar esse erro. Será apenas mais uma arena onde os atores políticos vão desempenhar papéis em um jogo de aparências de resultados previsíveis.

Tanto em um caso quanto em outro, o problema converge para o mesmo ponto: a impunidade, neste caso, dos administradores públicos e grandes empresários. Em países onde o sistema jurídico-penal segue padrões rigorosos, como a Inglaterra e os Estados Unidos, a impunidade é uma exceção à regra, uma excrescência que deve ser extirpada a qualquer custo. Apesar dos excessos cometidos pelo sistema, como a pena de morte nos EUA, a punição de delitos contra o Estado ou a ordem pública vai muito além da superexposição dos suspeitos nos tablóides sensacionalistas.

No Brasil, não. Punir a corrupção cometida por cidadãos pertencentes ao alto da pirâmide social é mera figura de retórica. Aqui, a impunidade acabou se tornando uma triste tradição histórica, iniciada com a colonização do território brasileiro por inescrupulosos exploradores, que saquearam as riquezas do País e dizimaram um contingente incontável de índios para invadir suas terras. De lá para cá, porém, pouquíssimos grandes grileiros de terras e administradores públicos desonestos foram realmente punidos por seus atos.

A impunidade é um problema de extrema gravidade porque induz, necessariamente, à vulgarização da corrupção. Por este motivo, a solução político-administrativa adotada para resolver a polêmica do pedágio no Paraná só faz sentido se, fundada em uma vasta base jurídico-legal, punir os responsáveis pelas eventuais irregularidades existentes no sistema. Não são apenas a necessidade ou a ambição que levam ao crime. A certeza da impunidade produz o mesmo efeito. O Judiciário, tanto quanto o Executivo, deve estar atento a isso.

Aurélio Munhoz

(política@parana-online.com.br) é editor-adjunto de Política de O Estado do Paraná e mestrando em Sociologia Política pela UFPR.

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