Um canal contra a baixaria

Os freqüentes “topless” das exibidas personagens de Juliana Paes e Deborah Secco podem até ajudar a levantar o Ibope de Celebridade. Assim como as “calientes” cenas de sexo protagonizadas pelos casais vividos por Cláudia Abreu e Márcio Garcia e Malu Mader e Thiago Lacerda. Mas foi só a novela entrar no ar para o telefone 0800-619619 registrar cerca de 50 denúncias de apelo sexual em apenas uma semana. O número é um dos canais de comunicação da campanha “Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania”, além do site www.eticanatv.org.br. Lançada pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, a campanha recebe e avalia as reclamações dos telespectadores sobre a qualidade da programação da tevê brasileira.

Para se ter uma idéia da “comoção” provocada por Celebridade, basta dizer que o Programa do Ratinho, número um em denúncias do último “ranking da baixaria”, recebeu 107 reclamações num período de três meses. A campanha é pouco conhecida e o próprio Gilberto Braga ainda não tomou conhecimento das denúncias. “Não recebi reclamação alguma. No ar, não tenho visto coisa alguma que possa chocar maiores de 12 anos”, minimiza o autor.

De acordo com o último ranking, que ainda não inclui Celebridade, as principais reclamações envolvendo a Globo são contra as novelas Kubanacan e Mulheres Apaixonadas. Diretor da Central Globo de Comunicação, Luís Erlanger considera que o fato de a campanha aceitar denúncias via internet abre brechas para armações. Além disso, as 2.487 reclamações registradas desde fevereiro não teriam peso diante das cerca de 40 milhões de pessoas que a emissora atinge diariamente em horário nobre. Já o deputado Orlando Fantazzini (PT/SP) garante que, na proporção, a campanha e as emissoras de tevê estão empatadas. “Se tivéssemos instrumentos de comunicação tão eficientes, as reclamações seriam mais numerosas”, aposta o criador da campanha.

Mudanças

A falta de divulgação pode até fazer dos números da campanha algo irrisório se comparado à audiência das emissoras, mas não tem atrapalhado o diálogo com os profissionais, principal objetivo de Fantazzini. Gugu Liberato, João Kléber e Evandro Guimarães, executivo da Globo, já conversaram com as comissões de acompanhamento. Gugu prometeu mudanças no Domingo Legal e chegou a ser retirado do terceiro ranking, mas voltou à vice-liderança das reclamações com o episódio da falsa entrevista com membros do PCC. Foram 40 denúncias só no dia da exibição da entrevista. E isso antes de vir à tona que se tratava de uma farsa. No último ranking, o Domingo Legal, com 75 denúncias, só perde para o Programa do Ratinho, com 107. Já o Canal Aberto e o Eu Vi na TV estão sendo reavaliados. “Vi que muitas reclamações tinham fundamento. Muitas vezes me excedi em função do Ibope”, reconhece João Kléber, que tirou de seus programas as brincadeiras com homossexuais, os testes de DNA e as crianças.

A subjetividade das reclamações, porém, pode gerar episódios como os de Mulheres Apaixonadas. As cenas em que Dóris, vivida por Regiane Alves, destratava, roubava e xingava os avós, interpretados por Carmem Silva e Oswaldo Louzada, foram classificadas como incentivo aos maus-tratos aos idosos. “Era uma campanha a favor da terceira idade, e o deputado Paulo Paim destacou isso na aprovação do Estatuto da Terceira Idade”, exalta-se Erlanger.

Na trilha das denúncias

A campanha “Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania” recebe denúncias da população através do telefone 0800-619619 e do site www.eticanatv.org.br. Sistematizadas a cada cerca de dois meses, elas originam um ranking com os 10 programas mais citados, que passam a ser acompanhados por um conselheiro. A partir daí, os responsáveis pelos programas são chamados a uma conversa com os membros da campanha, que incluem entidades da sociedade civil como universidades, associações, ONGs, sindicatos e conselhos. Além da divulgação dos rankings e da proposta do diálogo, a campanha trabalha com encaminhamento de denúncias ao Ministério Público, ao Ministério da Justiça e ao Ministério da Saúde. A divulgação do próximo ranking está prevista para dezembro. No mais recente, que abrange o período entre 18 de junho e 23 de setembro, os resultados foram os seguintes: Programa do Ratinho (SBT) – 107 denúncias; Domingo Legal (SBT) – 75 denúncias; Kubanacan (Globo) – 61 denúncias; Mulheres Apaixonadas (Globo) – 56 denúncias; #Hora da Verdade (Band) – 40 denúncias; Casseta & Planeta (Globo) – 21 denúncias; Domingão do Faustão (Globo) – 20 denúncias; Cidade Alerta (Record) – 16 denúncias; Agora é Que São Elas (Globo) – 14 denúncias; Malhação (Globo) – 13 denúncias.

Pelo menos o início da discussão

Presidente da TVE e conselheira da campanha, Beth Carmona acha que não adianta conversar apenas com as emissoras. “No Brasil, falta conscientização de quem faz e de quem vê tevê. É uma discussão que deve envolver emissoras, governo, anunciantes, produtores, autores e telespectadores”, conclui.

O apresentador João Kléber está “convocando” um encontro com Fausto Silva, Gugu Liberato, Márcia Goldschmidt, Oscar Roberto de Godoy e Ratinho, apresentadores dos programas que aparecem no último ranking. “Não quero ser mártir de nada. Estou fazendo modificações e não vou ficar sozinho nesta história”, exalta-se.

Na Globo, a Diretoria de Controle de Qualidade avalia permanentemente a programação que é colocada no ar. Por determinação dela, o personagem Pitbicha, de Tom Cavalcante, saiu do programa dominical do humorista e foi parar no noturno Zorra Total, enquanto o Casseta & Planeta parou de fazer piadas com a religião muçulmana.

Voltar ao topo