Tudo é uma questão de estilo

Não é preciso ser vidente para perceber quando uma saga rural é da lavra de Benedito Ruy Barbosa, que uma polêmica urbana é cria da engajada Glória Perez ou se uma paródia política leva a grife do “arretado” Aguinaldo Silva. Também é fácil notar que aquela conversa de comadre na porta de casa só pode ter saído da cabeça de Manoel Carlos. Ou se as cenas de ação, humor e corpos desnudos levam as digitais do paulistano Carlos Lombardi.

O limite do previsível, porém, é o respeito à memória do telespectador, que – acredita-se – não quer ver a mesma história reciclada. “A cada trabalho novo, as coisas vão se somando. Mas procuro fazer alguns desvios em minhas tramas toda vez que me sinto exageradamente rotulado”, admite Gilberto Braga. De fato, o consagrado autor de “Escrava Isaura” firmou-se mesmo como escritor de tramas urbanas, como “Vale Tudo”, “O Dono do Mundo” e “Pátria Minha” – além de minisséries como “Anos Dourados” e “Anos Rebeldes”. Em todas, porém, se repete o embate entre opressores e oprimidos.

No caso de Benedito, a inovação passa ao largo do sotaque italiano, tão recorrente em suas obras. Para o autor de “Esperança”, são os fatos históricos que ambientam a novela e se encarregam de diferenciar as tramas que escreve. “A história do país, da disputa pela terra, dos imigrantes que fizeram a vida no Brasil… A realidade é muito rica e me inspira a escrever”, valoriza o autor de “Terra Nostra”, “Renascer” e “Pantanal”, que acrescenta à pesquisa histórica suas lembranças de infância, passada no interior paulista.

Sutilezas

De fato, a vivência serve de matéria-prima para qualquer autor. A diferença está no enfoque. Para Manoel Carlos, por exemplo, não são os grandes acontecimentos, mas as sutilezas do cotidiano que rendem uma boa trama. O autor é mestre em novelas ambientadas no bairro do Leblon, na Zona Sul carioca. A protagonista – vivida por atrizes como Regina Duarte e Vera Fischer – chama-se invariavelmente Helena e tem uma filha problemática. Também não podem faltar um porteiro “bem informado” e alguns vizinhos participativos. “Minhas novelas são inspiradas no que me contam os amigos e na memória da minha infância e juventude”, resume o autor, já escalado para escrever a próxima novela das oito, com Christiane Torloni como a Helena da vez.

Glória Perez, ao contrário, busca em culturas exóticas e avanços da Ciência a inspiração para suas tramas rocambolescas. A bem-sucedida “O Clone”, por exemplo, chegou a ser adiada um ano porque a direção da Globo tinha restrições à trama sobre clonagem. Mas Glória insistiu, com a cancha de quem já havia falado de transplante de coração, em “De Corpo e Alma”, e inseminação artificial, em “Barriga de Aluguel” – quando ainda tratavam-se de assuntos restritos ao círculo científico. Por outro lado, a autora não abre mão de um núcleo suburbano e de um conflito cultural, de preferência recheado com muita dança. Foi assim com os ciganos de “Explode Coração” e, também, com os muçulmanos de “O Clone”. Para completar, emplaca, no meio da novela, uma campanha social, como o combate às drogas ou a procura de crianças desaparecidas. “Busco sempre temas originais”, ensina.

Já Euclydes Marinho e Emanuel Jacobina apostam em universos que conhecem muito bem. Em sua segunda novela – a primeira foi “Andando Nas Nuvens” -, Euclydes reedita em “Desejos de Mulher” o ambiente de redação e até personagens que conheceu quando era fotógrafo de jornal. Além disso, não abre mão de recursos clássicos, como a perda de memória dos protagonistas e a relação gato-e-rato da dupla de repórteres apaixonados. Emanuel, por sua vez, prefere voltar aos tempos de escola. O autor, que reinventou “Malhação” por anos a fio, adotou o ambiente universitário como “habitat” de “Coração de Estudante”. “A escola me agrada. É o lugar onde a gente convive e projeta sonhos. Mas acho que ainda não tenho um estilo consolidado”, pondera. Talvez por isso, Emanuel diga ter acolhido bem a supervisão “temporária” de Carlos Lombardi, convocado para levantar a audiência. De fato, o Ibope subiu, com mais cenas de humor e bonitões sem camisa. Ficou claro que havia o dedo de Lombardi.

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