Trabalhando sob pressão

Produzir novela é tarefa de fôlego. Durante cerca de oito meses, autores, diretores e atores enfrentam as pressões do tempo, da imprevisibilidade das reações do público e, conseqüentemente, dos números de audiência. Cada trama, no entanto, adquire um ritmo próprio de produção. Das novelas em exibição na Globo, por exemplo, Chocolate com Pimenta e Celebridade têm mais de 20 capítulos de antecedência entre o que é escrito e o que vai ao ar. Já em Kubanacan, os atores costumam receber de noite o texto do que vão gravar no dia seguinte e que irá ao ar 24 horas depois. Na maioria dos casos, o ritmo de liberação dos capítulos é uma decisão estratégica de autores e diretores.

Para Walcyr Carrasco, autor de Chocolate, a segurança é essencial. “Gosto de trabalhar com três semanas de folga”, revela. Já Manoel Carlos escrevia os capítulos de Mulheres Apaixonadas com, em média, de 48 horas de antecedência. “Preciso ver o resultado no ar, fazer minha novela no dia-a-dia”, justifica.

Nas tramas atuais, a tendência de escrever “em cima da hora” pode ser explicada pela necessidade do diálogo com fatos do cotidiano. “A novela não permite mais que se trabalhe com muita antecedência.

Preciso estar próximo do público. Se tiver 30 capítulos na frente, perco este contato”, corrobora Ricardo Waddington, diretor que chegou a gravar com menos de 24 horas de antecedência algumas cenas de Mulheres. Mas no caso de uma seqüência mais elaborada, como a morte por bala perdida de Fernanda, personagem de Vanessa Gerbelli, autor e diretor preparavam as cenas duas ou três semanas antes de ir ao ar.

Nem sempre, o ritmo de produção tem relação com a época em que se passa a trama. Kubanacan e Celebridade são dois bons exemplos. Enquanto Carlos Lombardi dá pouco “fôlego” à produção de sua novela, passada na década de 50, Gilberto Braga já entregou à emissora o capítulo 60 de Celebridade, que na semana passada exibia o capítulo 30. “O ritmo ideal é o que a emissora, que me paga, considera ideal. Chova ou faça sol, vamos ter de escrever mesmo seis capítulos todas as semanas”, minimiza Gilberto, que garante não sentir necessidade de incluir no texto referências a fatos do cotidiano.

A importância dada à reação da audiência é outro fator que pode determinar o ritmo no qual o autor escolhe escrever. Walcyr prefere não ter chances de se influenciar pelo que o público comenta sobre suas tramas. “Gosto de contar a história que tenho na cabeça. Não fico de olho no público o tempo todo”, comenta. Já Antônio Calmon até gosta de ouvir opiniões, mas procura ser fiel a suas intenções iniciais. “Procuro manter o leme na direção que escolhi. Todo mundo se acha crítico de novela, mas ninguém sabe o que está na minha cabeça”, sentencia.

Nem sempre, no entanto, o ritmo de produção é uma escolha do autor. É o que destaca Benedito Ruy Barbosa, que enfrentou inúmeros problemas com Esperança, até ser substituído por Walcyr Carrasco na autoria. “As pessoas não têm noção do que é escrever uma novela. Acontecem muitos imprevistos”, lamenta o autor, citando as “baixas temporárias” – por questões de saúde ou pequenos acidentes – de Ana Paula Arósio, Reynaldo Gianecchini, Raul Cortez, Otávio Augusto e Regina Dourado ao longo da combalida trama.

Lições sobre o inevitável

No SBT, o problema não é a liberação de capítulos – já que as tramas são adaptadas de originais mexicanos -, mas o esquema montado pela emissora para a produção. Todas as novelas são gravadas em cerca de quatro meses, o que torna o ritmo de gravações bastante apertado. Protagonista de “Canavial de Paixões”, Gustavo Haddad não vê problemas nem mesmo na hora de decorar o texto. “Vivo diariamente mais tempo na pele do Paulo que na minha própria pele. Já sei até quais seriam as reações dele, o que falaria em cada situação”, garante o ator.

Imprevistos e pesadelos

Quando escrevia A Última Testemunha (Record, em 1968), Benedito Ruy Barbosa adiantou vários capítulos para viajar. Na véspera, a protagonista Suzana Vieira sofreu um acidente e o autor teve de reescrever os capítulos.

Gilberto Braga escreve 36 páginas por dia de Celebridade.

Antônio Calmon faz uma curiosa comparação sobre o ato de escrever uma novela: “Faço a imagem de que estou correndo nos trilhos com uma locomotiva atrás de mim durante oito meses”.

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