Teatrão rouba a cena

Chegou a hora do filé mignon deste Festival de Teatro de Curitiba. Longa Jornada de Um Dia Noite Adentro, de Eugene O?Neill, com Cleyde Yáconis e Sérgio Britto, é a obra-prima desta edição. Com direção de Naum Alves de Souza, a montagem tem sessões hoje às 21h30 e amanhã às 20h no Guairão, dentro da programação da Mostra Contemporânea.

Quem esteve nas temporadas do Rio, Brasília e São Paulo, diz que Cleyde Yáconis, aos 79 anos, dá um banho como a matriarca morfinômana Mary: “Compre um lugar na platéia para ver a Cleyde de perto, porque é maravilhoso”, atesta o jornalista e dramaturgo paulista Mário Viana. “Todos estão ótimos, mas o desempenho dela é iluminado. É uma montagem convencional, “quadradinha?, um “teatrão? enfim, mas da mais alta qualidade”. Ele informa que em São Paulo todos os ingressos para os quase dois meses de temporada foram vendidos em dez dias.

O grupo já foi feliz na escolha do texto, obra essencial de Eugene O?Neill e um dos alicerces da dramaturgia mundial. A tradução é de Bárbara Heliodora, que dispensa apresentações. Some-se um diretor de gabarito e um elenco monstruoso (no melhor sentido da palavra), e temos uma aula de teatro, uma peça infalível.

Oriundos respectivamente do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC) e do Teatro dos Sete, Cleyde Yáconis e Sérgio Britto consumiram meses em “leituras de mesa” com o diretor Naum Alves de Souza, antes de esculpirem seus personagens. O diretor só precisou cuidar da retaguarda: “Fiz uma peça comportada, sem invencionices. Apoiei-me na tradição do texto e na excelência dos atores”, comentou Naum na época da estréia em São Paulo. “Quando a Mary fala em nevoeiro, não surge um nevoeiro. Fica a metáfora do autor, tão boa que não tenho o direito de estragar”, completa.

Essencialmente autobiográfico, Longa Jornada de Um Dia Noite Adentro conta a história de uma família decadente James (Sérgio Britto), ator crepuscular, escravo de um único papel; Mary (Cleyde) a matriarca viciada em morfina; Jamie (Genézio de Barros), o primogênito alcoólatra e Edmund, o atormentado caçula, que carrega a culpa por ter indiretamente provocado o vício da mãe. À margem desse emaranhado de culpa e amor está Cathleen, a empregada irlandesa contratada para a casa de veraneio. A temporada de verão precede a sua internação num sanatório, onde ele vai tentar curar suas feridas arriscando-se como poeta e escritor. Prepare-se para ir às lágrimas.

Parlapatões tropeçam na estréia

Luigi Poniwass

A idéia era boa: juntar numa mesma história cômica dois personagens de Aristófanes – o rico arruinado Estrepado (de As Nuvens) e o pobre sonhador Crédulo (de Um Deus Chamado Pluto). A companhia, uma das melhores do País no gênero – os Parlapatões de Hugo Possolo. Mas a montagem de As Nuvens e/ou Um Deus Chamado Dinheiro, que fez sua estréia nacional ontem no Guairinha, ficou devendo.

Em que pesem as dificuldades da estréia, o esforço dos artistas e a boa vontade da platéia curitibana (que, hipocritamente, aplaudiu de pé), o espetáculo foi morno, longo e – fatal para uma comédia – sem graça. Com exceção de alguns bons momentos – como a alusão a Bill Gates e ao Windows, a reprodução em câmara lenta do assassinato, a “nota de rodapé” e o “exorcismo” – a maioria das piadas soava velha e não despertava mais que esboços de riso. Os Parlapatões também abusaram dos clichês (como algumas gags circenses), dos palavrões e da escatologia, sem falar nas constrangedoras “interações” com o público.

Hugo Possolo ainda tentou arejar o trabalho com discursos pacifistas e críticas ao governo e ao mercado (recebidos com uma indiferença olímpica), adicionou algumas performances musicais (como a desnecessária interpretação do Blues da Piedade, de Cazuza) e até usou notas de dólar como papel higiênico. Mas nem assim conseguiu transformar sua boa idéia num bom espetáculo de teatro.

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