Revivendo Shakespeare

As obras de William Shakespeare são caracterizadas por amores impossíveis e grandes tragédias, quase sempre deslanchados por conflitos entre famílias, guerras e disputas de poder. Não por acaso, Thiago Fragoso vê profundas semelhanças entre o universo passional do famoso dramaturgo inglês e a história de Estevão, personagem que interpreta em “A Casa das Sete Mulheres”. Na minissérie de Maria Adelaide Amaral e Walter Negrão, o ator encarna um capitão “caramuru”, oficial das tropas imperiais. Como inimigo dos “farroupilhas”, vive um romance proibido com Rosário, de Mariana Ximenes, é morto numa batalha, mas, cumprindo a promessa de retornar para ela, reaparece na forma de “espectro”. “O amor deles transcende o aspecto corporal. Tem um lirismo tal que só o olhar de um alimenta a alma do outro”, define um inspirado Thiago.

O ator de 21 anos compara o romance de Estevão e Rosário ao dos jovens amantes de “Romeu & Julieta”. A alusão à peça mais famosa de Shakespeare é oportuna. Durante dois anos, ele se dedicou a estudar e atuar numa montagem do clássico, realizada pela extinta Companhia-Escola de Teatro, no Rio de Janeiro. Com aparência angelical e sonhadores olhos azuis, levou fácil o papel principal. “Conheço todas as montagens, todas as versões, em inglês e português, e todos os meandros dos personagens e da história. Agora, sinto-me interpretando um Romeu na televisão”, conta, orgulhoso.

Thiago foi um dos primeiros atores a ser convidado pelo diretor Jayme Monjardim. Os dois já haviam trabalhado juntos em “O Clone”, onde ele interpretou o inconseqüente Nando, que tornava-se viciado em drogas. Em 12 anos de carreira, foi seu primeiro papel de destaque na tevê, depois de viver personagens menores em “Perdidos de Amor”, na Band, e “Malhação” e “Estrela-Guia”, na Globo.

Ao contrário de Bento Gonçalves, General Netto, Giuseppe Garibaldi, Anita e outras figuras históricas, Estevão é um personagem de ficção. No livro “A Casa das Sete Mulheres”, de Letícia Wierzchowki, que norteia a livre adaptação da minissérie, ele já aparece para Rosário em forma etérea. Era um capitão uruguaio, morto na Guerra da Cisplatina por Bento Gonçalves, anos antes da Revolução Farroupilha retratada na minissérie. Para melhor envolver o público no romance, os autores optaram por começar a história com Estevão vivo e transformá-lo num inimigo dos “farrapos”. Além disso, o tiro fatal na cabeça, que leva em batalha na minissérie, vem de Corte Real, personagem de Murilo Rosa, também apaixonado por Rosário. “O fato de Estevão não ter existido só me deixa mais livre para criar. De certa forma, ele representa um pouco de todos aqueles homens. E, com certeza, muitos oficiais como Estevão foram mortos em guerras no Sul”, valoriza.

Para o ator, a morte previamente anunciada do personagem não tira o brilho da história. Ao contrário, consegue prender ainda mais a atenção do telespectador. A estratégia, segundo Thiago, tem mais uma vez amparo em Shakespeare. “Nas peças dele, as primeiras cenas já antecipam toda a tragédia. E ninguém deixa de assistir!”, argumenta o ator, para quem o fato de Estevão reaparecer em espírito não é, necessariamente, uma alusão ao Espiritismo ou a alguma outra religião. “A televisão não está aí para fazer julgamentos filosóficos. Esse romance é apenas uma grande metáfora do amor”, acredita.

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