Bebel Gilberto quer fazer a virada. Suspeita que os subtítulos que a acompanham, “a filha de João Gilberto”, “a amiga de Cazuza”, “a eterna adolescente”, “a louca” e “a chata” estejam maiores do que o dois em um que deveria justificar sua carreira por si: “cantora e compositora”.

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Bebel vem a São Paulo, nesta segunda-feira, 22, para se apresentar no Teatro Net para mostrar o repertório do álbum Tudo, com assinaturas suas sob ótimos resultados, como Somewhere Else, Nada Não, Novas Ideias (em que divide a criação com Seu Jorge e Gabriel Moura), Tudo (com Adriana Calcanhotto) e Areia (com Pedro Baby). Das regravações, tem Vivo Sonhando, de Jobim, e Harvest Moon, de Neil Young. Às vésperas de embarcar para o Brasil, na quinta passada, ela atendeu ao telefone enquanto caminhava no Soho, em Manhattan (EUA), para falar com o Estado.

Não é um equívoco chamar você de cantora de bossa nova?

Não sinto um peso com isso, mas acho que seja um pouco de falta de respeito com a bossa nova, com as pessoas que a criaram. Só estou bebendo da água deles. Fico preocupada quando ouço isso. Não está certo com as pessoas que me criaram e que estavam no momento da invenção da bossa, como papai (João Gilberto), Tom Jobim e Elizeth Cardoso.

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Você assina, com ou sem parceiros, sete composições em seu disco de 12. Ser reconhecida como compositora é algo que pode mudar algo em sua carreira?

A verdade é que eu nunca me considerei nem uma intérprete nem uma compositora. Acho que ainda estou procurando por uma aprovação.

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Ainda, mesmo depois de tanto tempo na estrada? Isso parece uma tortura…

Isso sempre é uma tortura. Eu não sou uma pessoa satisfeita, estou sempre querendo agradar todo mundo. Infelizmente, ou felizmente, isso é forte em mim. Quero saber se as pessoas gostaram ou não, não sou de não me importar com a opinião dos outros, fico querendo mudar a ideia de quem não gosta de mim. Eu me procuro e me torturo. Trabalho desde os 7 anos e nunca parece que é o suficiente.

E essa tortura é maior pelo fato de você ser filha de quem é?

Ah, não sei, meu pai é tão especial para mim… E, acima de tudo, é o meu pai. É confuso, ele é grandão do jeito que é… Claro que poder falar de música é sempre bom. Isso é complicado, mas eu estou acostumada.

Foi uma coincidência. Essa música estava na trilha do filme Comer, Rezar e Amar e o Samba da Bênção (na voz de Bebel) também estava. Quando fui ver o filme, curiosa para ouvir minha música, ouvi Harvest Moon e comecei a prestar mais atenção. Meses depois, fui chamada para fazer um tributo a Neil Young no Carnegie Hall e me perguntaram que música eu gostaria de cantar. “Harvest Moon”, respondi. Eu estava aprendendo a tocar violão nesta época, 2011, 2012, e acabei rearmonizando toda a canção. Se ouvir as duas, vai ver que a minha está completamente diferente da original. É o meu vocal favorito do disco.

Você aprendeu harmonia com seu pai?

Ouvindo ele. Às vezes ele me dizia alguma coisa, mas comecei a tocar violão só agora, de ouvido, há 3 anos. Foi o último suspiro (risos). Acho agora que vou virar uma compositora de verdade (risos).

O que está faltando para sua carreira?

O reconhecimento. Tudo bem, sei que falar de meu pai e de minha família é parte da minha vida, mas preciso dizer quem eu sou, o que eu fiz. Será que nunca vou ser mais do que a filha do João Gilberto? Depois de tudo o que eu já respondi? E não é só “a filha do João Gilberto”, mas também “a amiga do Cazuza”, “a eterna adolescente”, “a chata”, “a louca” e todos os subtítulos que eu tenho.

A chata? Você se acha chata?

Eu acho que não sou entendida. As pessoas não me entendem, eu sou muito espontânea, não penso muito antes de falar e colho os problemas com isso. Mas já estou acostumada, não tem jeito.

Por que não se muda para o Brasil?

Porque não chegou a hora.

Seria o mesmo que dizer ‘um dia eu vou’?

Sim, é isso mesmo.