Que bom é termos nosso Dalton Trevisan

d44_1.jpgSe um bom conto é pico certeiro na veia; estou viciada há, pelo menos, vinte anos. Vício incurável, irremediável, desde o primeiro conto que experimentei. A cada novo livro, uma nova felicidade clandestina, um novo êxtase, nova alegria. Orgulha-me ser curitibana e dizer a todos que tenho a Rua das Flores, o Teatro Guaíra e Dalton Trevisan.

Ouço dizerem que ele não é mais o mesmo, que está fora de forma, repetitivo, etc. e tal. Mas, este mês de maio com Pico na Veia no Guairinha, 33 contos selecionados e, agora, Rita Ritinha Ritona, mostram a todos o quanto vai bem, obrigado, nosso vampiro de Curitiba.

Sabemos que ele escandaliza os puritanos; que incomoda àqueles que dizem ser ele o escritor de uma história só, mas mandá-lo ?pendurar as chuteiras? como fez o senhor Wilson Bueno na entrevista de 16 de maio p.p. para o jornal Gazeta do Povo, é lamentável.

Considero infelizes e desagradáveis as declarações do escritor a respeito de Trevisan e sua obra. Dizer que apenas seus quatro primeiros livros é que valem a pena, é desprezar obras magistrais como A Polaquinha, Pão e sangue e o premiado Pico na veia, entre outros.

Mandá-lo aposentar-se em benefício de seus leitores é ainda pior. Cada texto de Trevisan é novo, único, mesmo que a história se repita. Poucos autores conseguiram a frase certa, curta, exata como ele faz, pois em literatura o difícil é ser simples, preciso. E, neste ponto, o vampiro é infalível, para felicidade de seus leitores.

Rita Ritinha Ritona é tido como uma bobagem para o Senhor Wilson Bueno, mas ele não nos disse o porquê. O que o incomoda tanto? Os estupradores, os pedófilos que aparecem nas esquinas de Curitiba, sem aviso ou hora marcada? As eternas mocinhas do Passeio Público saciando aos últimos homens da Terra? A casa de pederastia da Amintas 749? As taras e fantasias do mestre e da aluna? O que tanto se repete nestes novos textos? Frases copiadas de livros anteriores? Os eternos joões e marias ou a pobreza e crueldade da vida, a que todos estamos expostos, inclusive o próprio Trevisan e o Senhor Wilson Bueno? É uma pena que a vida não seja um mar de rosas ou ipês floridos, porém não podemos ignorar o que se mostra, todos os dias, bem embaixo de nossos narizes. E, felizmente, Dalton Trevisan não ignora! Repete, sim. Mil vezes, se for necessário, para que deixemos nosso egoísmo de lado e ousemos olhar para aquilo que não queremos enxergar. Por que não queremos enxergar? Simples, a realidade nos incomoda e ponto.

Esperamos que, em benefício de seus leitores, Dalton Trevisan não dê ouvidos aos conselhos do senhor Bueno e continue povoando nossa ?pacata? Curitiba com joões, marias, polaquinhas, mocinhos e mocinhas do Passeio por longa data. Pois, depois dele, nenhum vampiro que se preze poderá continuar o que ele começou.

Ah! Felizmente, como diz a lenda, os vampiros não morrem, para nossa alegria e desespero dos críticos de plantão!

Cláudia Gruber é professora de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira da Rede Pública Estadual. 

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