Políticas de recursos humanos nas organizações

Em seu Ensaio do Intelecto Humano, John Locke afirmou que as novas opiniões são sempre suspeitas e, geralmente, opostas, por nenhum outro motivo além do fato de ainda não serem comuns. O filósofo inglês viveu no século XVII, época em que o Estado tentava administrar o conflito de interesses dos diversos poderes e da proliferação de seitas religiosas que contrapunham as leis políticas e divinas vigentes. Em meio ao debate na luta pela soberania, não há registros sobre os dramas e dificuldades das relações corporativas, em que pese à subversão das instituições naquele instante. Mais de 300 anos depois, porém, um dos pilares da análise lockeana viaja no tempo e desembarca no terceiro milênio, para enriquecer o debate sobre a diversidade no ambiente interno empresarial. Trata-se de um divisor de água nas relações trabalhistas.

A reflexão é adequada e legítima, apesar do fosso que separa os dois períodos históricos. Os desinformados e desavisados rejeitam o novo modelo, mesmo sem conhecê-lo. Quem conhece, colhe os benefícios de um conceito que valoriza o capital humano e das competências individuais, independentemente de idade, sexo, nacionalidade, classe social, condição sócio-econômica, credo, raça, cor, pensamentos. Trata-se de um pedido de basta à exclusão, ao preconceito e discriminação. Esta união de personagens com visões diferentes e distintas, cada qual com sua história de vida, num mosaico de idéias, garantem eficiência, competitividade e lucro aos negócios. Além do mais, tornam o processo produtivo oxigenado, inovador e criativo.

Contabilizado os dividendos, a missão dos executivos responsáveis pela elaboração das políticas de recursos humanos é fomentar a diversidade dentro das organizações de maneira robusta, sem demagogia ou desfocada, embalados por discursos inócuos e vazios. Nesse processo, estimula-se a humanização em todos os níveis, num constante aperfeiçoamento da qualidade de vida. E esta discussão não está relacionada com sistema de cotas ou ações protecionistas às minorias, algo em moda hoje em dia.

As pessoas são o que há de mais precioso nas organizações. A discriminação limita o aproveitamento dos talentos e, numa ação mais predatória, prejudica a atração e retenção dos melhores profissionais. A promoção da diversidade transformou-se numa questão de sobrevivência intelectual e competitiva das empresas, diante de um mercado que se apresenta cada vez mais enxuto e exigente. Apoiar-se nela significa alavancar a performance, operar com sucesso num ambiente criativo, saudável e pluralista, regido sob os mais diversos pontos de vista. Não há nada mais democrático e confortável.

Esta interação de profissionais com pontos de vistas divergentes provoca a reconfiguração de uma organização que pretende se recriar estruturada num outro olhar. Para isso, as empresas precisam abrir espaço para a diversidade e adotá-la imediatamente como missão. Na verdade, os líderes necessitam repensar a formatação filosófica de suas corporações. É inconcebível, para dizer o mínimo, segregar o profissional negro num país em que cerca de 45% da população é formada por esse grupo. É absurdo dispensar a sabedoria, o conhecimento de vida e a experiência técnica só porque a pessoa completou 50 anos. Ainda nessa linha, é inadmissível desprezar um talento só porque é portador de uma deficiência física. A diversidade sepulta essas injustiças.

Por que não unir todas as tendências num só projeto? Esta parceria agrega valor, aumenta a efetividade e eficiência da equipe, enriquece os pareceres e torna a decisão sólida. Este cenário de gestão empresarial contribui na formação de uma mentalidade emergente, métodos e práticas gerenciais. Portanto, a diversidade catalisa a produtividade, estimulando a integração de pessoas. A empresa precisa estar sensível a todos esses aspectos com objetivo de valorizar as competências e exterminar, de uma vez por todas, o preconceito. Ou seja: são atitudes que minimizam conflitos e maximiza a união em prol do cumprimento de metas. Obviamente que o fenômeno é recente e ainda engatinha dentro dos escritórios, um território ainda dominado pelo conservadorismo. No entanto, é preciso investir e incrementar a mudança de comportamento e uma nova educação, sob o guarda-chuva da diversidade.

Incentivar a diversidade no ambiente de trabalho assegura qualidade de vida, garante sustentabilidade aos negócios e revitaliza o compromisso com a ética, cidadania e responsabilidade social. Assim, a organização promove, divulga e sedimenta os princípios de respeito, dignidade, justiça e oportunidades iguais. Essas medidas conquistam o respeito da sociedade (leia-se mercado consumidor). Pesquisas asseguram que a opinião pública tende a prestigiar as corporações socialmente responsáveis, ao comprar seus produtos. Muito do que se aplica nas organizações ganha força no ambiente externo, principalmente porque há propagação deste modelo de gestão. Falta, sim, conhecimento, assim definido pelo pensador e filósofo chinês Confúcio: consiste em ter consciência tanto de conhecer uma coisa quanto de não a conhecer. Este é o conhecimento. Chegou a hora e a vez da diversidade.

Maria Elisa Carra

é diretora de Recursos Humanos da Ernst & Young Auditoria e Consultoria.

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