Parágrafos escritos nas páginas do vento

Excesso de amor-próprio? Eis aí algo sumamente impróprio. *** Por detrás das diversas máscaras que costumeiramente o homem afivela ao rosto há sempre mais uma – a verdadeira. *** As pálpebras são diques construídos para deter a torrente do pranto. Mas não evitam que uma só lágrima transborde. *** Mais importante do que a morfologia da mão petrificada é a sintaxe do gesto volátil. *** Um só homem vale mais do que uma galáxia com bilhões de sóis. Afinal, ele pode sentir a sua beleza e conceber a sua imensidão. No sentido contrário, essa operação é uma impossibilidade metafísica. *** A obra de Dostoiévski é um alambique noturno em cujas serpentinas a alma russa, torturada, destila sangue e lágrimas de luz – tornados verbo. *** A paixão consome-se celeremente no próprio fogo; o amor eterniza-se na própria luz. *** A cultura é simultaneamente o fundamento, a viga mestra e a pedra angular do edifício do progresso. Sem ela, o edifício desmorona. *** Para o poeta, semeador do verbo, o canto é o fruto da sementeira. *** A arte é o sonho da humanidade; a guerra, a dor, a doença, a miséria, a injustiça, são os seus pesadelos. *** O homem sem objetivos, sem metas, sem ideais, é um barco sem bússola: tem uma chance de descobrir as Índias e noventa e nove de perder-se ou naufragar. *** Um livro é sempre uma janela aberta para o espírito do homem e um telescópio voltado para o mundo. *** Mais importante do que ser médico, engenheiro, advogado, artista, cientista, alfaiate ou sapateiro – é ser homem. Nenhum ofício, nenhuma profissão, nenhuma carreira supera essa, a mais difícil de todas. *** Destino, acaso, sorte, fatalidade? Talvez sejam apenas heterônimos de Deus, rubricados nas páginas dos acontecimentos existenciais. *** A maior riqueza do homem não consiste em ter, mas em ser. Enquanto o ter é sempre provisório, precário, problemático, o ser é permanente, definitivo. Quem tem, nem sempre é. Quem é, sempre tem – pelo menos aquilo que é. *** Numa discussão, um bom argumento tem às vezes o efeito de um tiro à queima-roupa. *** Qual a missão suprema do homem? Ser humano. O resto é acessório. *** O gesto de Brutus é sempre mais doloroso que a lâmina reluzente do seu punhal. *** Quem mais reivindica direitos e pleiteia favores é quem menos está disposto a cumprir deveres e a assumir responsabilidades. *** O homem é uma árvore viva. Suas mãos são ramos, suas dádivas, frutos. *** O objetivo fundamental da educação não é o de transmitir conhecimentos, mas ensinar como aprendê-los. *** Alegremo-nos: apesar de tudo, o crepúsculo e a aurora continuam sitiando a noite, sob a vigilância implacável das estrelas. *** É rico o homem que consegue enriquecer os outros com o seu exemplo, ainda que nada possua. *** Para o homem superior, vitórias e derrotas não passam de mero halterofilismo do espírito. *** Muitas vezes, ganhar é perder-se. E perder – ganhar-se. *** Aquilo que parece, no grande artista, um relâmpago de gênio, foi muitas vezes fruto de muitas noites de insônia, trabalhando à luz de velas. *** As páginas da vida nada mais são do que o prefácio para uma obra-prima: a morte. *** Antes ter inimigos por inteiro do que amigos pela metade – aqueles nunca nos enganarão. *** É sempre preferível uma insônia provisória do que o sono definitivo. *** Quem corta uma árvore está semeando punhados de areia de um deserto futuro. *** A esperança é o combustível do sonho; o sonho, a utopia do real. *** Falar muito, para não dizer nada. Falar pouco, para dizer muito. Silenciar, para dizer tudo. *** A política é por definição a arte de engolir sapos. Talvez por isso os discursos de alguns políticos têm algo de um coaxar monótono, monocórdico, no brejo das tribunas dos parlamentos. *** Muitos poetas proclamam o seu profundo amor à poesia. Infelizmente, nem sempre esse amor é correspondido.

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