Painéis ‘Guerra e Paz’, de Cândido Portinari, são reinaugurados na sede da ONU

A cerimônia de reinauguração dos painéis Guerra e Paz, de Cândido Portinari, na sede da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, teve um dos mais elaborados e emocionantes manifestos pela construção de um projeto de paz mundial já apresentados ali. Um filme feito pela atriz e diretora Bia Lessa, com textos e imagens referentes a injustiças humanas e à destruição do planeta, ressaltou dados sobre a situação de esgotamento da Terra alternados com mensagens de esperança e possibilidade de evitar-se uma catástrofe final.

O papa Francisco, que visitará os Estados Unidos no final do mês e deve comparecer à 70ª Assembleia Geral da ONU, enviou mensagem conclamando as nações a não promoverem mais guerras. Na mensagem do papa, lida por Bia, o pontífice católico citou o Salmo 4 do profeta Isaías para reafirmar a fidelidade ao compromisso da ONU. “Ansiamos pelo momento em que as nações ‘transformarão as suas espadas em relhas de arados, e as suas lanças em foices. Uma nação não levantará a espada contra outra, e não se adestrarão mais para a guerra'”, escreveu o papa.

Ao abrir a solenidade na noite de terça-feira, 8, o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, pediu um momento de silêncio em memória de Cândido Portinari (1903-1962), a quem celebrou como “um artista visionário”. Os painéis do pintor brasileiro, segundo ele, conclamam “o mundo à ação pela paz”. O embaixador Antonio Patriota, representante do Brasil na ONU, leu mensagem enviada pela presidente Dilma Roussef. Dilma comparou conflitos atuais às imagens de sofrimento retratadas por Portinari e aproveitou para insistir em mudanças nas formas de representação dos países na ONU.

Dinheiro falso

Doado em 1957 pelo Brasil à então recém-criada ONU, o par de murais é a maior obra de arte exibida na sede da organização. Os painéis foram retirados dali em 2010 e levados para o Brasil para restauração. Expostos no Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e Paris, eles foram vistos por cerca de 400 mil pessoas até retornarem a Nova York. A reinstalação deles, com cores renovadas, coincide com o 70º aniversário de fundação da entidade intragovernamental estabelecida em outubro de 1945 para prevenir outro conflito como a Segunda Guerra Mundial.

Para João Cândido, filho do pintor brasileiro e diretor do Projeto Portinari, criado em 1979, um dos momentos mais emocionantes da solenidade foi a projeção do retrato de seu pai sobre o símbolo da ONU. “Nem pude olhar para ele”, contou João Cândido. A maior (cada painel mede 140 metros quadrados) e última grande obra criada por Portinari nunca foi vista pelo pintor em seu lugar de honra no hall do anfiteatro da Assembleia Geral da ONU. Por causa do seu envolvimento com o Partido Comunista, ele não foi convidado para a inauguração em 1957.

O eixo condutor do filme exibido na ONU reforça a intenção de Portinari sobre a necessidade de paz. Entre poemas e outros textos de autores de diferentes épocas e países escolhidos por Bia para compor a narrativa do filme – T. S. Eliott, Samuel Beckett, Walt Whitman, Hanna Arendt, Eduardo Galeano, Darcy Ribeiro e Paulo Mendes da Rocha, entre outros – a apresentação teve ainda um momento performático, com cédulas de dinheiro falso atiradas do alto do imenso salão sobre a plateia.

“Neste momento do planeta, a guerra não se revela apenas como combate armado, mas na eleição do dinheiro como valor principal que rege as relações entre os homens e a natureza”, explicou Bia Lessa. O filme termina com a mensagem de que “a paz é um projeto” e “o futuro é uma página em branco”.

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