Os labirintos do prestígio

Muitas vezes você já entrou numa repartição pública e deparou com uma besta capadócia chefiando uma seção ou um departamento. Logo você, que é preparado, traquejado e experimentado, vivido e safo na vida e que anda, agora, mendigando carimbos, despachos e pareceres no serviço público. Mistério, mistério. Como pôde um energúmeno chegar a tal cargo? E numa boa, com ascensão de carreira, férias, 13.º, ajuda de custo, taxa de insalubridade, o escambau!

Foi simples. A coisa toda começou com o motorista do político, que também servia a patroa. Ele pediu a esta senhora, durante uma levada até o cabeleireiro, que solicitasse do marido influente um cargo para o cunhado, que havia chegado de um sítio no interior do Piauí, não sabia fazer lhonfas, mas estava precisando de emprego.

A patroa disse “vou falar com meu marido” e ia esquecendo o assunto quando o motorista entre cambiar de 4.ª para 3.ª perguntou-lhe se não ia descer mais naquela pracinha, onde ele viria apanhá-la 3 horas mais tarde.

O político, sem saber que a secretária era amiga do motorista, ouviu desta o pedido para conseguir um emprego público para um rapaz que havia chegado de um sítio no interior do Piauí e que era cunhado do motorista. Adiantou ao chefe que ele não sabia fazer bulhufas, mas, ela sim, conforme o político sabia de maneira prática e objetiva. Aliás, que tal esta quarta-feira? Claro, se não houver votação.

Chegando em casa, o político ouve da mulher, ela falando como a coisa mais banal do mundo, durante o jantar, o mesmo pedido.

Ligando os fatos, ele chama o chefe de gabinete e consulta sobre a possibilidade de contratação de mais um funcionário. O chefe do gabinete diz que não pode responder na hora, que tem um compromisso à tarde, numa certa pracinha, mas que iria ver logo na manhã seguinte e daria a resposta antes da sessão.

O político faz um sinal de “positivo” para a secretária e o chefe de gabinete confirma o encontro na pracinha com a mulher do político e 48 horas depois o cunhado do motorista inicia sua carreira pública, que tende sempre a evoluir na medida em que sai com a secretária e com a empregada da casa do político que curiosamente chama o patrão de você e tem um irmão praticante de tae kwon dô que trabalha de copeiro, só por desfastio, na casa do político.

Aí, o motorista, o cunhado, a empregada, o copeiro e a secretária do político, ficam de olho na filha do casal que está botando corpo e estufando os peitinhos. Mas, o próximo lance vai demorar um pouco, a menina ainda é nova, eleição só no ano que vem …

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A maioria dos governantes têm por hábito confundir fidelidade com capacidade. Vejam o Lula. Está rodeado de fiéis incompetentes. Mas, pode olhar para qualquer prefeito da praça política. Estão incorrendo na mesma cagada.

Isso não quer dizer que o capaz seja infiel, como regra matemática, mas indiscutivelmente incomoda os fiéis incapazes. É que, para estes, a fidelidade de sabujo supera qualquer capacitação.

Ocorre, ainda, que a linhagem dos fiéis incompetentes acabou por gerar um ramo paralelo facilmente localizável: o dos competentes-inúteis.

São aqueles que sabem, podem, devem, têm condições, ganharam forças nas asas e ficam parados no tempo e no espaço, diante do espelho comunitário e nada vêem. Estes competentes-inúteis oram para dentro de si, são o próprio altar e a própria imagem sacra do ego. Envelhecem como pilares da sociedade, ansiando pelo poder. É que o poder é o sexo dos velhos, chegam ao orgasmo exercitando o poder. É aí que, matreiros e tarimbados, são difíceis de enfrentar em sua altanaria e sapiência.

Maquiavel disse que a sorte está do lado dos jovens porque apenas estes têm a coragem de ousar, vale complementar, são atrevidos e audaciosos.

Mas, já é sabido que muitos jovens (memento Collor) se esparramam na titica ao enfrentar molossos espertos, cheios de malícia, que perdem os dentes mas não perderam o faro.

Pardal não voa em céu de águia. Em água que tem piranha boi bebe água de canudinho e jacaré nada de costas. Cautela, que prestígio é uma coisa misteriosa que pode sumir e reaparecer.

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