Os heróis da resistência

Em uma época em que as emissoras estréiam e retiram do ar programas sem qualquer aviso prévio, exibir a mesma produção por um longo tempo é façanha para poucos. É também o primeiro passo para conquistar o tão procurado prestígio junto ao público. No Brasil, a Globo é a emissora que mais conseguiu conservar os mesmos programas na grade. No entanto, as concorrentes SBT, Band, Record, TV Cultura e Rede Brasil também têm seus dinossauros, embora em número menor. O Jornal Nacional, por exemplo, é a única produção remanescente ainda dos anos 60 que nunca trocou de emissora e jamais saiu do ar. O telejornal da Globo é exibido desde setembro de 1969. “Somos o mais antigo, o mais visto e o mais influente telejornal. Por isso, tudo que é falado no JN ganha um peso extraordinário”, gaba-se William Bonner.

Enquanto os telejornais acabam naturalmente mudando apresentadores e mexendo no formato, há produções que conseguem se manter no ar justamente por não alterar o perfil. É o caso da mais antiga produção do país: o Programa Sílvio Santos. O dono do SBT estreou em 1966 na Globo, passou por Tupi e Record, e desde 1981 mantém a produção no SBT. Já a apresentadora Hebe Camargo, que inaugurou a tevê brasileira em 1950 e passou por várias emissoras, mantém seu programa Hebe no SBT desde 1985. Para Hebe Camargo, só existe uma maneira de um mesmo programa ficar mais de dez anos no ar sem perder o prestígio. “É preciso que o apresentador do programa tenha carisma e dedicação, naturalidade e sinceridade, para se aproximar do público”, acredita Hebe.

A fidelidade ao formato original também pode ser fundamental para um programa não sair da telinha. Para Inezita Barroso é justamente esta fidelidade que faz com que o Viola, Minha Viola seja o programa musical mais antigo da tevê brasileira. A produção estreou na TV Cultura em 1980 e jamais perdeu de mira o objetivo inicial: dar espaço à música caipira “de raiz”. Inezita lembra que, muitas vezes, o programa é pressionado a receber outros gêneros e convidados da música sertaneja comercial, mas jamais aceitou. “Só estamos ainda no ar porque o programa abre espaço para o caipira de verdade. É uma espécie de resistência do gênero”, afirma Inezita.

Mutante

Mas acompanhar as evoluções tecnológicas e de conteúdo é a saída para outro tipo de programa. O jornalístico Fantástico, por exemplo, que comemora 30 anos, mudou bastante em relação à fase inicial. No entanto, Pedro Bial, que está no programa desde 1996, garante que a idéia é continuar seguindo o lema da produção anunciada como “Show da Vida”. Para ele, o Fantástico ainda procura ter um conteúdo que surpreenda o público, como na gênese do programa. “Em termos de ritmo e visual, o Fantástico mudou completamente”, diz Bial.

Coerência

O prestígio que alguns programas conquistaram na fase inicial pode ser o principal aliado para assegurar uma vida longa. É isto o que ocorre, por exemplo, com o Jornal da Band. O telejornal estreou em 1977 com o nome e viveu nos anos 80 o período de glória. Foi a única produção no País a entrevistar Luís Carlos Prestes e Leonel Brizola na época do exílio político. Também se destacou na cobertura das Diretas Já e no processo de abertura política do País. “Ter uma trajetória coerente faz com que qualquer programa acumule credibilidade junto ao espectador”, pondera Fernando Mitre, diretor de jornalismo da Band.

Foi o que aconteceu também com o Manhattan Connection, que estreou em 1993 e é o programas mais antigo da tevê por assinatura no Brasil. Ameaçado de extinção este ano, o programa só não acabou porque houve uma mobilização dos assinantes, patrocinadores e da direção da Globo. Lucas Mendes diz que o Manhattan consegue sobreviver porque lida com a atualidade e lembra que Paulo Francis não apostou na produção. “Após a gravação do piloto, o Francis decretou: ?Ninguém vai ter coragem de botar este troço no ar?”, recorda.

Voltar ao topo