O México numa brincadeira veloz

São Paulo – Era uma Vez no México – o título, claro, é homenagem a Sergio Leone, o diretor dos Era uma Vez… mais famosos do cinema, nos quais revisita o faroeste e o filme de gângsteres, dois gêneros poderosos da indústria. Leone, impropriamente identificado com a invenção do western spaghetti, fazia uma operação estética interessante. Tanto em Era uma Vez no Oeste quanto em Era uma Vez na América, desacelerava a ação e a duração dos planos. Introduzia assim uma dimensão épica e operística a gêneros pautados pelo realismo. Tanto assim que admiradores incondicionais dos dois gêneros nunca o perdoaram por isso, porque fanáticos não toleram variações de ritual.

O curioso é que, em Era uma Vez no México, o diretor Robert Rodriguez homenageia Leone fazendo exatamente o contrário. Acelera a ação e os planos. Imprime ao filme o ritmo, a textura e talvez o ideário das histórias em quadrinhos – pelo menos de um tipo de HQ menos sofisticada. Não estamos aqui falando nem de Hugo Pratt nem de Valentina.

Rodriguez é bem conhecido, desde que lançou O Mariachi filme que, ele garantia, havia feito com meros US$ 7 mil. A história tinha toda a pinta de impostura, ainda mais quando o diretor disse que parte desse dinheiro tinha sido obtida com a venda do próprio sangue para transfusões. Um mártir do cinema. Mas, enfim, esse primeiro filme tinha um frescor meio irresponsável que ainda podia passar por divertimento. Infelizmente foi levado mais a sério do que o senso crítico permitiria supor. E Rodriguez foi fazendo carreira, no bom sentido do termo.

Aliou-se a Quentin Tarantino, na época um queridinho da crítica e isso serviu para emprestar credibilidade tanto a O Mariachi quanto à sua continuação Desperado. Era uma Vez no México é o terceiro da série e Rodriguez diz mesmo que queria fazer um tríptico, uma trilogia, ou coisa parecida. Neste terceiro filme da série, ele nem de longe trabalha com a precariedade do primeiro. Evoluiu muito, em termos de produção. A começar pelo elenco. O mariachi pistoleiro é vivido por Antonio Banderas. Ele trama uma vingança porque perdeu a mulher, Salma Hayek, e a filha, assassinadas. Há também um agente da CIA corrupto, papel de Johnny Depp.

Trata-se de um fiapo de trama, é claro, e veículo para um filme de ação: correrias, explosões, muito vidro quebrado, tiroteio e sangue à beça. Nada contra o cinema de ação, mas parece que mesmo este perdeu muito de sua qualidade. Por exemplo por que uma perseguição de carros como a de Operação França é muito mais emocionante do que a de Matrix Reloaded, embora nem dê para comparar a sofisticação tecnológica entre um filme e outro?

Uma hipótese: o cinema de entretenimento foi perdendo, ao longo dos anos, a sua dimensão humana. Não conseguimos nem de leve nos identificar com personagens que saltam com facilidade de um telhado a outro, mesmo que estejam separados por 20 metros. Caem de qualquer altura e não se machucam, batem o carro a 200 por hora e saem ilesos, sem um fio de cabelo fora do lugar. Enfim, tudo é uma brincadeira, feita com elementos muito primários, primitivos mesmo.

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