Em 1989, os brasileiros se preparavam para a primeira eleição direta para presidente da República depois da ditadura militar. Respirava-se, finalmente, ares liberais. No mesmo ano, a Globo exibiu “Que Rei Sou Eu?”, novela que marcou época por explorar com bom humor temas que marcavam a realidade daquele momento, como corrupção, planos econômicos malsucedidos, instabilidade da moeda e, principalmente, a miséria do povo. “Só faltou o mensalão para ser plenamente atual”, ironiza o ator Tato Gabus Mendes, filho do autor do folhetim, Cassiano Gabus Mendes. “Muitos de seus assuntos continuam em discussão hoje.”

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De fato, “Que Rei Sou Eu?”, que sai agora em DVD pela Globo Marcas, foi uma aposta ousada da emissora, que levou algum tempo até viabilizar a produção. “Demorou entre 4 e 5 anos até a Globo topar, pois temia que o público estranhasse e recusasse a novela”, comenta Tato. “Na verdade, era mesmo um projeto ousado pois utilizava uma história que se passava no passado para falar do presente.”

A trama se passa no século 18, em 1786, três anos antes da Revolução Francesa. Tudo começa com a morte do rei Petrus II (Gianfrancesco Guarnieri), que deixa como único herdeiro o filho bastardo Jean-Pierre (Edson Celulari). A rainha Valentine (Tereza Rachel), dominada pelos conselheiros reais, acaba entregando a coroa ao mendigo Pichot (Tato), em uma manobra arquitetada pelo bruxo Ravengar (Antonio Abujamra), para manter o domínio do reino sob seu controle. Com a liderança de Jean-Pierre, um grupo de revolucionários conspira para tomar definitivamente o poder e entregar a coroa ao seu dono legítimo.

“No começo, houve, sim, um estranhamento, pois o público tinha dificuldade em ver homens vestidos com aquele figurino antigo, mas falando gírias atuais”, lembra Tato. “Mas logo a novela embalou e foi um tremendo sucesso.”

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Um dos principais divertimentos logo descoberto pelo espectador era identificar referências a acontecimentos atuais. Como a alusão ao Plano Cruzado, pacote econômico que envolveu congelamento de preços e mudança da moeda nacional, lançado pelo governo em 1986 – na novela, Cassiano incluiu uma reforma monetária, trocando o nome da moeda do reino de caduco para duca, além de tirar três zeros do seu valor. Outro momento de enorme sucesso era acompanhar os ministros dançando samba.

Já o personagem de Antonio Abujamra, o bruxo Ravengar, um dos mais populares da trama, também contribuiu para o anedotário político da novela – depois da revolta popular, que ocorre no final da trama, ele volta a Avilan com o nome de Richelieu Rasputin Golbery e oferece seus préstimos ao novo governo.

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“Todo mundo sabia que Avilan era o Brasil, mas em nenhum momento isso foi dito, até na última cena da novela, quando o personagem do Celulari diz: ‘Ninguém vai mais explorar o trabalho do pobre, agora quero que gritem comigo: Viva o Brasil!'”, lembra Tato.

Para garantir fidelidade à época, a Globo construiu uma cidade cenográfica de 2.200m², em Jacarepaguá, no Rio, o que tornou “Que Rei Sou Eu?” a primeira novela a ser gravada no Projac. “Ficávamos entusiasmados com um trabalho que hoje é realizado com muito mais facilidade”, observa Tato, lembrando ainda da participação especial em seis capítulos de Dercy Gonçalves como a baronesa Eknésia, mãe da rainha Valentine. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

QUE REI SOU EU?

Distribuidora: Globo Marcas (caixa com 13 discos; R$ 189,90)