O tempero derivativo deu o tom do domingo no Lollapalooza. Os dois primeiros grandes atos, por assim dizer, de destaque da segunda noite do festival, no Autódromo de Interlagos, foram o Interpol e The Kooks, uma banda americana e uma britânica. Embora de Nova York, o Interpol é um dos inúmeros sucedâneos do Joy Division e do uniforme enlutado do gothic rock. The Kooks é um genérico de Libertines (se é que isso já é possível). E assim caminha a humanidade.

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A chuva fina e espaçada, com longos espaços para a secagem dos lollapalozers, foi uma espécie de refresco para a crise hídrica que fustiga São Paulo. Era como se alguém brincasse com um regador no céu, obrigando ora a uma multidão de capas de plástico transparente, ora a uma festa de estiagem na grama. Os vendedores de “mangos” (o dinheiro circulante no festival) avisavam: “Se molhar, não vale mais, ok?”.

Luke Pritchard, o vocalista de canto nasalado dos Kooks, exerce sem acanhamento sua condição de sex symbol de uma legião bem expressiva de fãs. Ele chegou ao Brasil em 2009, ainda imberbe, e fez show na época no Via Funchal. Na ocasião, tinham aberto shows dos Rolling Stones e eram chamados de “versão dos Spin Doctors com sotaque inglês”. Hoje, seu som parece mais versátil, abraçando até alguma cadência de clássicos como The Doors.

Já o Interpol é um ato interessante: em vez de fugir de sua influência inicial, eles até aprofundaram a transfusão sanguínea. Seu novo disco, El Pintor, tem baladas umbilicalmente ligadas ao Joy Division, como Everything Is Wrong. Isso é uma bênção e também uma maldição. Quando o show finalmente chega ao final, com Slow Hands (canção de seu segundo disco, Antics, de 2004).

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O show do produtor e rapper Pharrell Williams foi o fecho pop do festival. Centenas de fãs de chapéu, sua marca registrada, estavam esperando por ele, que atrasou uns 20 minutos para entrar, o que provocou piadas na frente do palco. “Hey, Tapharrell, o jogo já começou!”, diziam uns, fazendo referência ao ex-goleiro da seleção. “Pharrell, tá fazendo parceria com o Thiaguinho?”, brincavam outros. “Vira a cadeira pra gente, Pharrell!”, disse um rapaz, em referência à participação do rapper no reality show The Voice.

Pharrell entrou com seu time de dançarinas, uma banda de black music afiada e o falsete característico do R&B, mostrando que ambiciona o lugar que foi de Michael Jackson. Mas comete o mesmo erro dos antecessores: ambição desmedida, o que o faz vender (e exibir o tempo todo) o espaço de patrocínio das roupas dos bailarinos para uma marca esportiva.

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Espécie de novo Midas da música negra americana, ele está entre os 10 músicos mais ricos do show biz dos EUA, segundo a Forbes, faturando cerca de US$ 20 milhões/ano. Isso já tem uns três anos. Em 2013, ele emplacou os dois maiores hits daquele verão, Get Lucky e Blurred Lines. Não contente, compôs para o filme Meu Malvado Favorito 2 a canção Happy, que acabou perdendo o Oscar para Let It Go. Mas Pharrell continuou fazendo jorrar dinheiro. Só o chapelão que ele usou na festa dos Grammys, leiloado pela Arby’s, faturou US$ 44 mil.

O legal de Pharrel é que ele tem o respeito dos colegas de categoria. O produtor não se acanha de empunhar em seu show os hits que ajudou a propulsionar, como Lose Yourself to Dance (do Daft Punk), Hollaback Girl (de Gwen Stefani), Blurred Lines (de Robin Thicke) e Drop It Like It’sHot (de Snoop Dogg).

Já Billy Corgan, do Smashing Pumpkins, não poupou hits e peso para mostrar que ainda pode ser um grande nome da música. Ele é uma espécie de Axl Rose do rock alternativo. Ego, estupidez e talento enormes. Não tivesse tentado forçar os pedaços do que sobrou dos Pumpkins na última década, poderia reunir o grupo e ser o maior ato do mundo. Como não é possível voltar, ele tenta reconstruir a carreira aos poucos, com entrevistas polêmicas e shows competentes.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.