Ney Matogrosso é homenageado em mostra paraibana

Este é, provavelmente, o único festival do mundo que tem o nome de um filme. Mas que filme! Aruanda, o festival de cinema de João Pessoa, na Paraíba, tomou o título da obra maior de Linduarte Noronha (1930-2012), considerado um dos precursores do Cinema Novo. Em 1959, Linduarte filmou a história e o cotidiano dos moradores de um quilombo, em Serra Talhada, que viviam numa espécie de economia primitiva sobrevivendo da fabricação de potes de barro, da mesma maneira que seus ancestrais ex-escravos.

Aruanda surge a partir de reportagens feitas pelo próprio Linduarte para o jornal paraibano A União e pelo correspondente do jornal O Estado de S.Paulo, Dulcício Moreira. Ambos subiram ao Talhado em lombo de burro e, na volta, escreveram para seus jornais. Linduarte, com veleidades cinematográficas, voltou ao assunto com Aruanda, de 22 minutos, feito com uma câmera emprestada por Humberto Mauro. O filme foi considerado por Glauber Rocha um modelo do que poderia ser o cinema do Terceiro Mundo, incorporando a precariedade da produção à linguagem e retratando os contrastes econômicos da sociedade.

Inspirado pelo filme e pela vocação cinematográfica do seu estado natal, Lúcio Vilar, criou o Cine Fest Aruanda, que chega à 8.ª edição. O festival teve na abertura a apresentação do concorrente Olho Nu, de Joel Pizzini, e com a presença do personagem do filme e um dos homenageados do festival – Ney Matogrosso.

Defini-lo apenas como cantor seria empobrecer sua personalidade. Dançarino? Ator? Performer? Ney foi e é isso tudo, e essa presença multifacetada na cena cultural aparece bem expressa no ensaio poético que lhe dedica Pizzini. Ensaio porque é uma tentativa de aproximação dessa figura. Poético, porque constrói-se por arranjos e aproximações do farto material audiovisual, do passado e do presente, orquestrado pelo diretor. Há rimas e dissonâncias no arranjo, além das músicas interpretadas por Ney – de Sangue Latino a clássicos como Carinhoso.

Com Ney, a abertura do Aruanda tornou-se apoteótica. As pessoas o viram passar no shopping onde fica o cinema que sedia o festival, e criou-se o boato de que haveria um show naquela noite. Como consequência, o cinema lotou, Ney foi ovacionado, e o filme, muito aplaudido.

Pizzini explicou como sintetizou em hora e meia todo o material de que dispunha e mais o que filmou. “Fiquei impressionado com a forma física que ele ostenta aos 72 anos de idade, e perguntei como fazia para manter o visual enxuto.” O artista respondeu que sempre sai da mesa sentindo um pouco de fome. Pizzini teve um estalo: “É isso. Não posso querer esgotar o assunto. Então, sugiro coisas, mas deixo o espectador sentir um pouco de fome no final”. De fato, as lacunas deixadas pelo filme não parecem nunca uma forma de incompletude, mas um convite para que se volte à obra de Ney. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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