Municipal estreia nova montagem da ópera ‘Lohengrin’

“Isso vai soar profundamente vulgar, me desculpe, eu odeio falar desse jeito. Mas não há outra palavra: essa música é orgásmica!” Quem diz isso é a mezzo-soprano americana Marianne Cornetti, que interpreta o papel de Ortrud na nova produção de Lohengrin, de Richard Wagner, ópera que estreia nesta quinta, 8, no Teatro Municipal de São Paulo, sob regência de John Neschling e direção cênica de Henning Brockhaus. “Que sons magníficos, que drama!”

Lohengrin pertence à primeira fase da carreira de Wagner, ao lado de outras de suas mais populares óperas: O Navio Fantasma e Tannhäuser. Narra a história do cavaleiro misterioso que, no século 10, chega à Antuérpia montado em um cisne. Salva a jovem Elsa das tramas do Conde Telramund e sua mulher Ortrud. Mas é traído por ela, que, na noite de núpcias, desrespeita a condição imposta por ele de jamais perguntas sobre suas origens. Sobra ao cavaleiro, após revelar que é um membro da irmandade do Santo Graal, que precisa sempre se manter anônima, partir, mais uma vez, a bordo de seu cisne.

A história carregava um simbolismo grande para o compositor que, enfrentando as dificuldades do início da carreira, via a si próprio como um cavaleiro incompreendido, em posse de uma nova mensagem, uma nova forma de arte que pudesse dar origem a um novo mundo. Lohengrin, musicalmente, recria esses dois mundos. “Veja o segundo ato da ópera. O dueto de Ortrud com Telramund já sugere uma nova música, mas, em seguida, há a conversa lírica, repleta de belas melodias, entre ela e Elsa. John Neschling diz que enxerga uma proximidade entre esse Wagner do início e Mozart. Para mim, ele está mais próximo de Verdi”, diz Cornetti.

A cantora esteve no Brasil no início do ano passado, interpretando justamente uma personagem do compositor italiano na montagem de Il Trovatore apresentada no Municipal. Na ocasião, chamou atenção não apenas pelo tamanho da voz, mas também pelo controle dramático que tem sobre ela, resultando em uma caracterização bastante eficiente do papel da cigana Azucena em direção à loucura. O contexto é diferente, mas o clima da personagem é parecido.

“O que eu gosto nas minhas meninas de Verdi – Azucena, Amneris ou até mesmo Abigail – é que são elas que fazem o drama caminhar, levam a história adiante. E a Ortrud também é assim. Veja a Elsa. Até ela estragar tudo, essa menina parece estar sempre nas nuvens. Dá vontade de estrangular ela! Lohengrin também é um personagem certinho. E Telramund simplesmente não tem ‘cojones’. É bom ficar claro: estou falando mal das personagens e não dos meus colegas cantores. Mas, com Ortrud, é diferente. Ela quer o poder, quer o controle do seu próprio destino. E, como uma Lady Macbeth, não hesita em tramar a maquinar contra todos.”

Para Cornetti, isso dá maior complexidade ao papel. “É uma personagem de cores variadas e a música escrita para ela retrata justamente essa diversidade, as personas múltiplas que ela assume. De novo, um bom exemplo é o segundo ato. Na cena com Telramund e na cena com Elsa, são duas mulheres diferentes. É uma personagem muito exigente por conta disso, pela necessidade de desenvolver o trabalho como atriz”, explica. Ela divide o papel, nessa produção, com Johanna Rusanen-Kartano. Como Lohengrin, atuam os tenores Tomislav Muzek e Viktor Antipenko; as sopranos Marion Ammann e Nathalie Bergeron interpretam Elsa; os barítonos Tómas Tómasson e Johmi Steinberg dão vida a Telramund; e o baixo Luiz Ottavio-Faria encarna Heinrich. Completam o elenco Carlos Eduardo Marcos, Miguel Geraldi, Walter Fawcett, Sebastião Teixeira, Leonardo Pace, Elaine Cahser, Elaine Morais, Keila de Morais e Lídia Schäffer.

A montagem de Henning Brockhaus, afirma Cornetti, está baseada em simbolismos e na oposição entre o bem e o mal. “Tudo aquilo que é bom está representado em Lohengrin. Os outros personagens e o coro utilizam máscaras. Mas elas caem no momento em que ele aparece, quando se descortina um mundo de felicidade, ou seja, um mundo ao qual Telramund e Ortrud não pertencem e que neles provoca profundo incômodo”, explica.

“A direção de Brokhaus tem enorme profundidade. Não é um Lohengrin comum. Não há, por exemplo, o cisne, que é substituído por um cubo. Mas eu prefiro um diretor que vai fundo e exagera a um que não tente nada. A montagem segue num crescendo, em direção a um final… Será que eu devo contar tudo?” Uma pausa. “Melhor não. É bom deixar alguma surpresa.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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