Mostra no MON resgata a herança da escravidão e o imaginário luso-afro-brasileiro

Cerca de 600 obras, entre esculturas, pinturas, fotografias, filmes e objetos de ouro e prata, mostram a saga dos africanos e seus descendentes no Brasil, desde o início do século 16 até os dias atuais. Concebida pelo curador Emanoel Araújo, a mostra  pretende provocar a memória e resgatar a contribuição dos negros na cultura e na formação do povo e da nacionalidade brasileira. Em síntese, a exposição apresenta o imaginário luso-afro-brasileiro e a herança da escravidão.

?Esta é uma exposição de história, arte e memória. Tudo é importante, do documento à obra?, resume o curador. Um documento, uma carta de alforria, um recibo de compra de escravos, o anúncio de recompensa para o resgate de negros fugitivos, a litrografia anônima de um navio negreiro metro a metro ocupado por centenas de negros e a memória de importantes personagens que participaram do movimento em defesa da libertação dos escravos constituem um dos vários núcleos da mostra.  
 
História e memória

O segmento da história é bastante rico, diversificado, e faz algumas homenagens póstumas, como aos 100 anos de morte de José Carlos do Patrocínio (1853-1905) e a Theodoro Sampaio (1855-1937). Denominado o Gigante Negro da Abolição, Patrocínio foi jornalista, orador e fundador da Academia Brasileira de Letras, entre outras atuações, e Theodoro Sampaio foi geógrafo, arquiteto, historiador, sociólogo, tupinólogo, político e um dos organizadores da Escola Politécnica de São Paulo e membro do Instituto Histórico e Gegráfico de São Paulo, tendo seu nome dado a uma das principais ruas da capital paulista.

Eles são lembrados por meio de fotografias que se somam a tantos outros personagens históricos como Antônio Pereira Rebouças Filho (1839 ? 1974), que foi engenheiro militar e participou da construção da Estrada de Ferro Paranaguá ? Curitiba e da Estrada da Graciosa, que liga Antonina à capital paranaense.

Dona Olga do Alaketo e Mestre Didi também figuram entre os homenageados. De dona Olga estão expostas fotografias e vestidos assinados pelo costureiro Dener e Mestre Didi, com 88 anos, participa com as próprias obras. Segundo o curador, o artista apresenta uma profunda identificação com a religiosidade de raízes afro-brasileiras. Em suas obras ?é evidente o poderoso significado simbólico?, utilizando como suporte nervuras de palmeiras, búzios, contas multicoloridas e tiras de couro. Ele é um dos supremos sacerdotes do culto aos Eguns, na Bahia.

?E há tantos, tantos mais, a exigir o resgate em nossa memória! Penso no panteão dos deuses africanos, e penso naquelas extraordinárias mulheres cuja memória permitiu que eles sobrevivessem no Brasil (…) Penso em guerreiros no campo aberto da luta desportiva, no futebol de Friedenreich, Ademir da Guia, Barbosa, no gingado de Mané Garrincha, na força calma de Djalma Santos, na perícia de Didi-folha-seca, e em tantos e tantos atletas como Ademar Ferreira da Silva ou João do Pulo, Manoel Querino e João Cândido, o Almirante Negro, e no jangadeiro Dragão do Mar (…) Mas penso também nos negros que combateram nas batalhas da indepedência da Bahia, naqueles que morreram na Guerra do Paraguai, depois de tantos outros já terem morrido, consumidos na lida dos canaviais, das minas de ouro e de diamantes, do litoral brasileiro aos sertões das Gerais. (…)?
 
Cultura e arte

Esculturas produzidas em madeiras, bronzes, metal, além de outros materiais, peças de ex-votos, santos e referências a entidades ligadas aos cultos afros remetem à arte e à religiosidade africana nas Américas. Entre obras pertencentes a colecionadores particulares, de origem estrangeira, aparecem as peças e adereços utilizados em cultos afros no Brasil. Rubem Valentim, Ronaldo Rêgo, Mestre Didi e Mestre Valentim, Teófilo de Jesus, Artur Timóteo da Costa, Heitor dos Prazeres, João Alves, Agnaldo Manoel dos Santos e Mário Cravo Neto são alguns dos artistas que com suas obras, pinturas, esculturas, xilogravuras ou técnica mista, apresentam o universo da cultura negra nas artes.

A fotografia é outra importante fonte de resgate dessa memória. O francês Pierre Verger, ao se estabelecer como fotógrafo dos Diários Associados da Bahia, é um de seus grandes representantes. Com suas imagens, ele imortalizou e divulgou a riqueza das festas populares, muitas originadas na cultura negra, os ritos sagrados dos cultos afros, a população negra e seus personagens significativos.

Outros profissionais e artistas radicados no Paraná como os fotógrafos Orlando Azevedo e Fernanda Castro, a artista plástica Cristina Mendes, Washington Silveira, e os escultores Expedito e Lafayete Rocha, se juntam a Verger para enriquecer a mostra de imagens, objetos e esculturas.
 
Mostra de filmes

Emanoel Araújo, em sua característica de curador atento e organizador de grandes produções, reservou espaço especial para o cinema. Em uma sala montada dentro da própria mostra, são projetados diversos filmes relacionados à temática da exposição. Quilombos da Bahia, Carolina de Jesus, O Atlântico Negro, Vozes da Diáspora, Egum Gum, realizado pela antropóloga Joana Elbeaim Santos, e Heróis de Todo Mundo, recentemente produzido pela Fundação Roberto Marinho, são alguns dos títulos em exibição.  

Para o curador, o resultado dessa reunião e profusão de imagens e informações é a busca da própria identidade cultural brasileira. ?Precisamos ter orgulho dos feitos de nossos homens e mulheres que, a despeito do estigma herdado da escravidão, marcaram seu lugar na nossa história como cientistas, engenheiros, poetas, escritores, escultores, pintores. Queremos que os nossos sejam reconhecidos.?

As obras da exposição pertencem a colecionadores particulares e ao Museu Afro-Brasil (SP), do qual Emanuel Araújo é  diretor. A mostra já foi apresentada com sucesso na Feira Internacional do Livro de Frankfourt (Alemanha), em 1992, no Museu de História Nacional do Rio de Janeiro, em 2000, no Palácio das Artes de Belo Horizonte e na Galeria do Sesi de São Paulo, em 2003.
 
Serviço
Negras Memórias ? Memórias de Negros
De 21 de dezembro a abril de 2006
Museu Oscar Niemeyer – Rua Marechal Hermes, 999
Centro Cívico ? CEP: 80530-230
Telefone: (41) 3350-4400
Horário: de terça a domingo, das 10h às 18h
Preços: R$ 4,00 adultos e R$ 2,00 estudantes identificados
(Crianças de até 12 anos, maiores de 60 e grupos de estudantes de escolas públicas pré-agendados não pagam)
Solicitação de Agendamento entre em nosso site na pasta Ação Educativa, em Agendamento
www.museuoscarniemeyer.org.br

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