Michael Bublé, o queridinho das meninas

Ele ficou assustado. Chegou em um programa de televisão bizarro – pelo menos para os padrões contidos do Canadá, viu dezenas de mulheres berrando seu nome e cantando (em inglês) suas músicas. Era demais para Michael Bublé, que esteve no Brasil na semana passada para concorridos e caríssimos shows em São Paulo e no Rio de Janeiro. E, claro, para uma apresentação no Domingão do Faustão, da TV Globo.

Parece incrível imaginar que um sujeito que cante I’ve Got You Under My Skin, Call Me Irresponsible e Me And Mrs. Jones seja alvo de gritos e gemidos femininos – mesmo que o sujeito seja jovem e boa-pinta. Estas músicas citadas acima não estão na lista das preferidas das jovens (e dos jovens) brasileiros, e americanos, e japoneses, e franceses, e australianos e canadenses. Essa garotada escuta hip-hop, trance, techno, rock e no máximo a música pop-eletrificada de Justin Timberlake e afins. Além, é claro, da turma que curte o estilo “emo”.

Mas essa turma está ouvindo Michael Bublé. Claro que ele não é um arrasa-quarteirão, um ídolo planetário na escala de Timberlake, só para manter a comparação. Bublé, entretanto, joga no outro time da música. Seu som tem força, mas não é “pesado”. Seu cantar é marcante, mas não é “estranho”. Ele se veste diferente (ou terno e gravata hoje não é diferente?), mas não é “bizarro”.

E há dois detalhes decisivos. O primeiro faz a música de Bublé se aproximar dos jovens em todo o mundo. Desde o início da carreira, ele une em seus álbuns recriações de sucessos da antiga e “clássicos” do pop. Ele já gravou Kissing a Fool (George Michael), Wonderful Tonight (Eric Clapton), Can’t Buy Me Love (Beatles), Crazy Little Thing Called Love (Queen), You And I (Stevie Wonder) e Fever (que até Madonna gravou). Quem ouve gosta, e acaba comprando os discos, ou copiando pela internet. E quem leva as canções mais novas também leva Dream, Summerwind e Come Fly With Me. (Fazendo um parêntese, Michael Bublé é esperto.

Além da garotada, ele aposta na turma de meia-idade, pais da garotada que escuta as músicas acima. Ele gravou canções que estavam esquecidas do público e renegadas pelos artista, como a já citada Me And Mrs. Jones, e também You’ll Never Find Another Love Like Mine, How Can You Mend A Broken Heart e Sway, esta mais conhecida no Brasil por ser a trilha da “dança do siri”. Cantar estas músicas faz que Bublé entre no inconsciente do público, facilitando a assimilação de seu trabalho. Pronto, fecha parêntese.)

O outro detalhe, que influi no sucesso dele no Brasil, é a inclusão sucessiva de suas músicas em novelas da TV Globo. É o caminho para o êxito. Me And Mrs. Jones e Home (esta composição do próprio Michael) foram temas de Paraíso Tropical e América, respectivamente, e foram para as paradas das rádios. Aí ficou mais fácil.

E selou o caminho do Michael Bublé, do frio Canadá para o auditório do Faustão. Ele conheceu um Brasil que talvez não imaginasse. Até porque chegou no meio de uma polêmica – suas apresentações tiveram os ingressos mais caros em muito tempo. Os mil reais cobrados superam, e muito, os valores de outros artistas, como Madonna, que virá nos próximos dias ao País.

Ele precisou pedir desculpas, mesmo jurando que não sabia de nada. Depois, foi alvo do assédio feminino em seus shows, e levou o susto na TV Globo. Acabou se tornando um improvável “queridinho das meninas”, distante de outros ídolos jovens de hoje – convenhamos, não há nada em comum entre ele e Di Ferrero, o vocalista emo do NX Zero. Além disso, o canadense também é adorado pela turma da meia-idade e pelas mais velhas, que vêem nele um novo Dean Martin, ou um novo Paul Anka, ou mesmo um novo Frank Sinatra.

Michael Bublé, aos poucos, conseguiu, colocar um estilo musical considerado ultrapassado na cabeça da juventude. Foi surpreendente ver um público “popular” cantar Call Me Irresponsible, música de mais de sessenta anos. Se isto é bom ou ruim, talvez o cantor descubra em março, quando voltará ao Brasil.

cristiantoledo@oestadodoparana.com.br

Voltar ao topo