Médico de plantão

O médico cancerologista Dráuzio Varella já não consegue andar despercebido pelas ruas. Magro, alto, com rosto ossudo e comprido, é logo reconhecido. Não por acaso, Dráuzio já aparece no “Fantástico” há quase dois anos, quando estreou o quadro “Viagem pelo Corpo Humano”. Há um mês, ele comanda o “Fôlego”, uma espécie de “reality-show” que acompanha o cotidiano de seis voluntários que se comprometeram a parar de fumar. “Ninguém fuma porque quer. As pessoas só não tentam parar porque têm vergonha de não conseguir”, acredita ele.

Dráuzio Varella sabe do que está falando. Ele próprio fumou durante 19 anos, sete deles trabalhando no Hospital do Câncer, em São Paulo. Neste período, advertia os pacientes dos riscos da nicotina, como derrame cerebral e enfisema pulmonar, sempre com um maço de cigarros no bolso do jaleco. Um belo dia, virou para si mesmo e pensou: “Tenho de parar. Vou sair dessa”. E saiu. “Era viciadão”, confessa.

Aos 58 anos, Dráuzio é quase uma celebridade. Antes de fechar com a Globo, já gravava vinhetas sobre o vírus do HIV para a MTV. Pouco depois, lançou “Estação Carandiru”. Vencedor do Prêmio Jabuti 2000 nas categorias não-ficção e reportagem, o livro vai chegar ao cinema pelas mãos de Hector Babenco. Ainda este ano, Dráuzio estréia novo quadro no “Fantástico”, provavelmente sobre obesidade ou menopausa.

P

– Você acredita que uma campanha como “Fôlego” pode surtir efeito junto aos fumantes que assistem ao “Fantástico”?

P

– Não tenho a menor dúvida. Eu mesmo fumei por 19 anos. Ninguém deve achar que não vai largar o vício. O importante é continuar tentando. Tenho o maior respeito pelas pessoas que tentam. Muitos param e depois retornam. Outros fumam por 20, 30 anos, querem largar, mas não tentam. É preciso tentar. Nenhuma outra droga dá uma crise de abstinência tão forte com poucos minutos sem usar. Você conhece alguém que fuma dois maços num final de semana e fica sem fumar até a outra sexta? Eu não conheço…

P

– Você tem sido muito abordado nas ruas? O que as pessoas costumam perguntar?

R

– As pessoas me param nas ruas para conversar sobre os mais variados assuntos. Umas pedem para eu solucionar problemas que, infelizmente, não posso solucionar. Outros simplesmente agradecem pelas dicas que dou no “Fantástico”. “Olha, eu não sabia que podia passar água fria em queimadura. Eu passava creme dental…”. Coisas do tipo.

P

– Qual foi a mais inusitada de todas as abordagens?

R

– Ah, outro dia mesmo, fui abordado num banheiro público por um sujeito que estava fazendo xixi ao meu lado. Sem a menor cerimônia, ele virou para mim e perguntou: “Doutor, o que é isso aqui no meu pênis?”. Meio constrangido, respondi que era uma lesão de herpes e sugeri que ele procurasse um médico. Esse tipo de abordagem já virou rotina na minha vida.

P

– Livro, filme, tevê… Ainda sobra tempo para você atender aos pacientes no consultório?

R

– Dos meus amigos de infância, fui o único que pôde estudar. Os outros viraram operários. Não é todo mundo que pode cursar faculdade. Por isso, tenho de retribuir de alguma forma. Mas também não posso abandonar meus pacientes. Como cancerologista, trato de muitos em fase terminal. Dedico dois terços do meu tempo à Medicina. O restante divido entre as visitas ao Carandiru, o quadro no “Fantástico” e os artigos para jornal.

P

– Você não teme uma eventual superexposição na mídia?

R

– Gosto de restringir minhas aparições. Não dou entrevistas para falar do que eu gosto de comer. Nem aceito convites para aparecer em colunas sociais. Busco a mídia única e exclusivamente para passar informações médicas. Nada mais. Sei que minha atuação na mídia afetou bastante minha privacidade. Mas nada me recompensa tanto quanto uma pessoa simples se aproximar de mim para agradecer alguma coisa.

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