Mauro Mendonça há muito tempo se tornou um ladrão contumaz

A profissão de ator é a única em que o adjetivo “ladrão” não tem conotação ofensiva. Pelo contrário. Ser chamado de “ladrão de cenas”, por exemplo, é um elogio e tanto. Sinal de que um determinado ator não passa despercebido, mesmo quando seu personagem não é dos melhores. Mauro Mendonça é o que se pode chamar de exímio “ladrão de cenas”. Aos 74 anos, valoriza todo e qualquer trabalho. Ainda mais quando o personagem é o ardiloso Justino, de Cabocla, um dos candidatos à Prefeitura de Vila da Mata. “Um ator de verdade nunca se dá por satisfeito. Estou amadurecendo, mas, graças a Deus, continuo tendo bons papéis para fazer. Trabalhar rejuvenesce”, brinca, desfazendo o habitual ar carrancudo.

A julgar pelo atual trabalho, Mauro tem demonstrado entusiasmo quase juvenil. E não é para menos. Depois de alguns anos, ele volta a interpretar um sujeito prepotente, irascível, ambicioso… Quase um vilão, o tipo predileto de nove entre dez atores. Além disso, ele torna a fazer novela de época, quase uma exceção em mais de 40 anos de tevê. Por coincidência, as duas únicas experiências no gênero foram Sinhá Moça e Vida Nova, ambas de Benedito Ruy Barbosa. “Os personagens do Benedito são todos amplos, críveis, humanos… Além disso, têm ideologia, visão crítica. Isso é sempre característica de um bom autor”, elogia.

Atualmente em Cabocla, o personagem de Mauro Mendonça, o coronel Justino, se prepara para disputar as eleições municipais. Depois de tentar conseguir o poder à força, a velha raposa muda de tática e se finge de cordeiro para angariar a simpatia dos eleitores. “Justino já está pensando em como se virar para realizar as promessas que tem feito. Ele sabe que não dá para fazer tudo, mas tem de cumprir algumas para se reeleger”, raciocina. Em recente viagem ao interior de Minas, o ator teve a oportunidade de conferir a popularidade de seu personagem ao ser parabenizado por coronéis da região. “Duvido da sinceridade de Justino. Mas espero que os filhos consigam plantar alguma semente no coração empedernido daquele homem”, torce.

Mauro Mendonça já perdeu a conta do número de personagens que interpretou na tevê. Só em teleteatros, adaptações televisivas de espetáculos teatrais, calcula uns 400. Mas, boa parte deles, pondera, de posição social elevada, como banqueiros, senadores ou industriais. “Tem a ver com o meu biotipo”, diverte-se.

Talento iluminado

O universo rural das novelas de Benedito Ruy Barbosa não chega a ser novidade para Mauro Pereira de Mendonça. Afinal, ele nasceu em Ubá, interior de Minas, em 2 de abril de 1932. Filho do promotor Euclides e da dona-de-casa Maria dos Santos, o ator teve uma infância típica do interior, com direito a banho de rio e fruta no pé. “Levei muita coça por ser um dos mais levados”, recorda. Já adolescente, mudou-se com a família para o Rio, onde começou a trabalhar como bancário e farmacêutico para se sustentar.

A década de 50 marcou a estréia de Mauro no cinema e no teatro. Em 1954, fez uma ponta no filme Carnaval em Caxias, de Paulo Vanderley. Dois anos depois, estreava no teatro em A Casa de Chá no Luar de Agosto, já pelo Teatro Brasileiro de Comédia. Na televisão, só estrearia na década de 60: em Corações em Conflito, novela de Ivani Ribeiro na extinta Excelsior em 1963. “Meus colegas de teatro me criticaram muito. Não entendiam como eu me submetia a textos tão ruins na tevê”, lembra.

Nos anos 70, transferiu-se para a Globo, onde estreou em O Espigão, de Dias Gomes. No cinema, revelou-se bissexto. Recentemente, fez O Redentor, de Cláudio Torres, e Didi, O Cupido Trapalhão, de Paulo Aragão. O maior sucesso, porém, Dona Flor e Seus Dois Maridos, de Bruno Barreto, é o recordista absoluto do cinema nacional, com 12 milhões de pagantes.

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