La Mala Educación abre festival

Havia a expectativa de um grande filme de Pedro Almodóvar abrindo o 57.º Festival International du Film até porque a imprensa francesa colocou La Mala Educación nas nuvens. Studio, uma das revistas de cinema mais populares da França, estampou na capa de sua edição especial dedicada a Cannes a cara de Gael García Bernal com a legenda: ele está magnífico em dois filmes, como o travesti de Almodóvar e como o jovem Ernesto Guevara de Diários de Motocicleta, de Walter Salles.

Gael pode vir a ser a estrela de Cannes em 2004, até porque é preciso muita coragem para fazer o personagem que ele interpreta em La Mala Educación. O filme começa espetacular e por uma boa meia hora você se faz a pergunta que não quer calar – será Pedro Almodóvar o maior diretor do mundo, na atualidade? Pois o começo de La Mala Educación é tão bom e até melhor do que Carne Trêmula, Tudo sobre Minha Mãe e Fale com Ela. E aí o filme degringola. Desce vertiginosamente motanha abaixo e a única pergunta que você quer se fazer é – o que terá acontecido com Almodóvar?

Ele chegou discretíssimo para a entrevista coletiva, após a exibição. Almodóvar assumiu que é um grande diretor, um artista maduro e enterrou de vez a drag que interpretava em seus primeiros filmes. Você, se é almodovariano de carteirinha, se lembra dele de brincos de argola e meias-arrastão em Labirinto de Paixões? Sai a drag e entra um senhor muito responsável. Explica que amadurecer é inevitável, que às vezes tem a impressão de repetir o mesmo tema ou tratar de um só tema em seus filmes. O travesti de La Mala Educación? Você já viu esse personagem antes nos filmes de Almodóvar. Não viu filmado desta maneira. O próprio Almodóvar reconhece. Ele falou tantas vezes sobre a sua educação sexual, abusado por padres salesianos, que todo mundo queria saber até que ponto a história do garoto que vira amante do padre e, mais tarde, transforma-se em travesti tem a ver com ele? La Mala Educación é um filme autobiográfico?

Almodóvar sai pela tangente. Diz que muita coisa que ocorre com Ignacio foi-lhe relatada ou ele viu. Em compensação, diz que se projeta de corpo inteiro na maneira de filmar. La Mala Educación coloca Gael García Bernal na pele de três personagens mas ele permanece um segredo que, nem no desfecho, o diretor do filme dentro do filme, Enrique, consegue resolver. Juán assume a personalidade e os escritos de Ignacio, assume a sexualidade de Ignacio e vai para a cama com Enrique. É um filme só de homens. O sexo, que é abundante em La Mala Educación, é sempre homossexual. A primeira meia hora, digamos, a primeira hora é genial e aí o melodrama gay sobre o padre apaixonado pelo sacristão e o garoto apaixonado pelo colega vira um filme noir com assassinato. E aí, perde o rumo.

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