Jards Macalé faz campanha pelo amor

São Paulo – O irrequieto músico Jards Macalé, com 60 anos de idade e 40 de carreira, aproveita seu novo CD, Amor, Ordem & Progresso, para lançar aos quatro cantos sua indagação e indignação: por que a palavra amor não está no lema da bandeira nacional? Afinal, segundo ele, a nossa bandeira é inspirada na doutrina positivista do francês Augusto Comte, que defende “o amor por princípio, a ordem por base e o progresso por fim”. “Há anos, eu ficava intrigado por que só tem ordem e progresso, e não o amor”, observa ele.

Macalé não se considera um positivista, mas, neste caso, apóia o movimento que, no século XIX, ia na contramão do idealismo, do conformismo. “Não sou positivista nem simpatizante, mas eu quero o amor”, diz. “Na hora de se fazer o lema da bandeira, o amor foi tirado. E se o próprio positivismo apresenta o amor por princípio, quero fazer uma campanha cívica.” Essa campanha cívica, instituída na forma de shows, já passou por Curitiba e deverá percorrer São Paulo, Rio e certamente Brasília, de acordo com o próprio músico.

Seu questionamento se dá logo no título do novo trabalho, e se estende para cada uma das 12 faixas da obra. O amor e seus desdobramentos funcionam como elementos de unidade. O repertório foi idealizado por ele e o amigo Moacyr Luz, com quem já havia trabalhado em outros projetos, como no álbum Macalé Canta Moreira, de 2001, em que Jards presta homenagem a Moreira da Silva interpretando seus sambas de breque. Neste Amor, Ordem & Progresso, lançado pelo independente Lua Discos, os dois assinam ainda os arranjos, a regência e a direção de estúdio.

Macalé conta que a idéia original seria um disco com composições de Tom Jobim e Newton Mendonça. “Mas, no ano passado descobri que já haviam feito essa homenagem, não sei quem”. Do que seria um disco de tributo à dupla de compositores, sobrou Foi à Noite, uma das canções de Tom e Mendonça que Macalé sempre gostou. Entrou também Consolação, clássico de Baden Powell e Vinícius de Moraes, que abre o CD. Há outros clássicos da música brasileira, como Por Causa Dessa Caboclada, de Ary Barroso e Luiz Peixoto; Falam de Mim, de Noel Rosa, Éden Silva e Anibal Silva; Samba da Pergunta, de Pingarrilho e Vasconcellos; o partido-alto Roendo as Unhas, de Paulinho da Viola.

O compositor revisita canções suas, de antigos discos, como Meu Amor me Agarra & Geme & Treme & Chora & Mata (Macalé/Capinan), de seu primeiro LP, Jards Macalé, de 1972; Amo Tanto, de sua autoria e que foi gravada por Nara Leão em 1966; além de Canção Singela e Pano pra Manga, ambas escritas em parceria com Xico Chaves. Toda a proposta do disco é “amarrada” pela música Positivismo, de Noel Rosa e Orestes Barbosa. Diz certo trecho dela: “O amor vem por princípio, a ordem por base/ O progresso é que deve vir por fim/ Desprezaste esta lei de Augusto Comte/ E fostes ser feliz longe de mim”.

Intimista

Amor, Ordem & Progresso resulta num belo trabalho, singelo e intimista, cheio de bossa e emoção, tendo como base violão, baixo, guitarra, percussão e a inconfundível voz de Macalé. É dedicado ao poeta baiano Waly Salomão, que morreu recentemente, e de quem Jards Macalé era parceiro de música e amigo por quase 40 anos. “Planejávamos retomar nossa parceria há algum tempo”. Ele guarda algumas composições feitas com Salomão, mas ainda inéditas. “Fiquei com vontade de gravar um disco com nossas canções, mas preciso de um tempo para compilar tudo, com uma atenção especial”.

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