Nos últimos dez anos, a média de Alma Gêmea só não é maior do que a de Chocolate com Pimenta, também dirigida por Jorge Fernando. Enquanto a atual registra média de 36 pontos e ?share? de 57%, a anterior alcançou, no mesmo período, média de 37 e ?share? de 59%. Por conta disso, Jorge é o primeiro a ressaltar que o mérito não é apenas seu. É também do autor Walcyr Carrasco. Foi ele, inclusive, quem apresentou Jorge Fernando às produções de época. ?Numa trama do gênero, um tapa na cara é gancho forte o suficiente para virar final de capítulo. Já numa novela das oito, é a coisa mais corriqueira do mundo?, compara.
Para Jorge Fernando, Walcyr foi um dos responsáveis também pelo seu amadurecimento profissional. Habituado a trabalhar com Sílvio de Abreu, de quem dirigiu sete novelas, Jorge voltou a fazer as pazes com o sucesso em 2003, quando dirigiu Chocolate com Pimenta. ?O Sílvio é o meu marido e o Walcyr, meu amante. Apesar de amar os dois, tenho saído mais com o amante?, brinca. Aos 50 anos, Jorge Fernando garante que aprendeu a lidar melhor com os reveses da profissão e, principalmente, a ouvir mais e falar menos. ?Você só berra e dá ataque quando está inseguro ou quer provar alguma coisa para alguém?, reconhece ele.
P – Em menos de um mês, Alma Gêmea se tornou a segunda novela de maior audiência das seis nos últimos dez anos. O que não pode faltar numa trama para ela cair nas graças do público?
R – Antes de mais nada, uma boa história. Uma história que prenda a atenção do público por oito meses. Porque não adianta a novela fazer sucesso hoje. Ela tem de continuar fazendo sucesso daqui a seis, sete meses. Com uma boa história em mãos, temos de ter também um bom elenco. E, principalmente, um diretor que entenda essa história e não fique brigando com ela. Porque aí é que a coisa não dá certo mesmo. A gente precisa entender que, nessa brincadeira toda, o autor é a grande estrela. É ele quem comanda o espetáculo. Por fim, o sucesso de uma novela depende também da época em que ela estréia. A gente precisa juntar a fome com a vontade de comer. Acho, inclusive, que As Filhas da Mãe só se tornou o meu maior fracasso, em termos de audiência, por causa disso. Escolhemos uma péssima época para estreá-la…
P – Por quê?
R – Porque houve o 11 de Setembro. O Rio, o Brasil, o mundo, ninguém estava com disposição para aceitar nada. Pessoalmente, considero As Filhas da Mãe um dos meus melhores trabalhos. Depois de 20 anos, eu e o Sílvio propusemos coisas novas. Mas as pessoas que poderiam gostar daquilo não descobriram a novela.
P – Em março, você completou 50 anos. Profissionalmente, o que mudou na sua vida?
R – O barato de envelhecer é justamente esse: as coisas vão ficando mais claras para você. Antigamente, eu trabalhava com 40, 50, 60 pessoas e, na verdade, só conhecia umas 4, 5 ou 6 delas. Ficava muito pilhado para gravar. Quando o telefone tocava na minha mesa, já atendia aos berros: ?Merda, o que você quer?!?. Hoje em dia, não. Procuro ser mais gentil… Além disso, aprendi a não valorizar tanto os pequenos problemas da vida. Problemas, meu amigo, vamos ter sempre. Uns vão ficar doentes, outros vão perder a ponte aérea… Isso quando não chove e atrasa a gravação. Tudo isso faz parte da gincana que é a vida de um diretor de novelas.
P – Você é um dos diretores mais atípicos da Globo. Só anda de bermuda, gosta de aparecer nas novelas que dirige e vive mostrando a bunda em público. De onde vem tanta irreverência?
R – Minha infância toda foi vivida em Del Castilho, subúrbio do Rio. Mesmo quando eu era magro, lindo e gostoso, já gostava de bermuda… (risos) O meu maior mérito é não ter de fazer tipo para ser aceito em lugar nenhum. Sempre consegui ser do jeito que sou e as pessoas sempre me aceitaram assim. Felizmente, o meu trabalho sempre veio em primeiro lugar. Nunca fui questionado por quem quer que fosse por que era assim ou assado. Muito pelo contrário. O meu trabalho, sim, sempre foi muito respeitado. Graças a Deus.
P – Você lembra da primeira vez que recorreu a esse inusitado estratagema para descontrair um ambiente tenso?
R – Ah, lembro… A primeira vez a gente nunca esquece, né? (risos) O negócio de mostrar a bunda em público começou numa gravação de motocross. Como a barulheira era danada, eu não conseguia me comunicar com a arquibancada. Foi quando eu tive a feliz idéia de mostrar a bunda. Puxa, as pessoas foram ao delírio! Como eu era meio nervosinho na época, vi que, assim que eu terminava de dar um esporro em alguém, o clima ficava para lá de insuportável. Aí, passei a mostrar a bunda para descontrair o ambiente. Comecei a mostrar, fui mostrando, aí começaram a surgir muitos convites para jantar… (risos).
Talento usado em várias frentes
Nascido em Del Castilho, subúrbio do Rio, Jorge Fernando parou de estudar antes mesmo de concluir o ensino médio. Logo, decidiu que queria ser ator. Aos 18 anos, transformou a peça Zoo Story, de Edward Albee, no monólogo Zoológico, e começou a encená-lo em barcas e ônibus. No ano seguinte, já estreava no teatro, com o espetáculo Romance, montado pelo Dzi Croquetes. Depois de uma temporada de um ano em Paris, voltou disposto a fazer televisão. Como não conseguia agendar um horário com Walter Avancini, invadiu a sala do diretor. Logo que a secretária saiu para o almoço, entrou, recitando Zoológico. ?Na mesma hora, o Avancini pegou o telefone e ligou para o Daniel Filho. Por sorte, naquele dia, o Daniel estava fazendo testes para Ciranda, Cirandinha…?, relembra. Depois de Ciranda, Cirandinha, Jorge Fernando não parou mais e voltou a atuar em Pai Herói e Água Viva. Em pouco tempo, porém, pulou para trás das câmaras, como assistente de direção de Roberto Talma em novelas como Baila Comigo e Sol de Verão. Como diretor-geral, estreou em Guerra dos Sexos, que inaugurou uma bem-sucedida parceria com Sílvio de Abreu, autor de Cambalacho, Deus nos Acuda e A Próxima Vítima, entre outras. Mas trabalhou também com outros autores, como Janete Clair em Coração Alado, Manoel Carlos em Sol de Verão e Cassiano Gabus Mendes em Que Rei Sou Eu?. ?O Sílvio é o meu grande amigo. A gente nem precisa mais trabalhar junto para saber disso. Mas, com certeza, a gente vai se encontrar de novo…?, promete.
Furacão criativo
Tudo ao mesmo tempo agora. Esse parece ser o lema de Jorge Fernando de Medeiros Rebello. Atualmente, além de Alma Gêmea, ele dirige também o show do grupo A Cor do Som, excursiona com o espetáculo Boom e planeja sua volta para o cinema em 2006. Na tevê, Jorge não vive só de dirigir novelas. Em 20 e poucos anos de Globo, dirigiu de Roberto Carlos Especial a Sai de Baixo. ?Outro dia mesmo, fui conferir a audiência do Não Fuja da Raia e descobri que a gente dava 40. E o pessoal ainda dizia que era ruim…?, brinca, referindo-se ao programa estrelado por Cláudia Raia em 1995.
Fora da tevê, Jorge Fernando também não pára. Recentemente, ele foi convidado para dirigir o show de gravação do CD e DVD do grupo A Cor do Som. ?O que eu gosto mesmo é de fazer coisas novas. Mesmice? Tô fora!?, confessa ele.