Intervalo, hora de provocações

A “guerra” pela audiência na tevê brasileira “contaminou” o mercado publicitário. O tradicional humor dos comerciais televisivos anda abrindo espaço ao sarcasmo e à agressividade. O objetivo parece não ser apenas atrair o consumidor, mas também “cutucar” o concorrente. Um bom exemplo foi a recente troca de farpas entre Coca-Cola e Ambev.

Tudo começou com o tenista Gustavo Kuerten “rebatendo” uma latinha do Guaraná Antarctica no comercial do Kuat. A Ambev respondeu com um comercial ainda menos sutil: botou a marca da Coca estampada em uniformes de seleções estrangeiras e colocou em dúvida se o Kuat era mesmo um guaraná. “Como a Coca colocou o Guaraná Antarctica de uma forma pejorativa, a Ambev se sentiu no direito de responder”, defende Rodrigo Peccin, Coordenador de Mídia da conta do Guaraná Antarctica na agência Carillo Pastore.

Mas os refrigerantes não são os únicos a se atritar nesta arena publicitária que virou a tevê. As companhias de telefonia móvel e fixa vivem se provocando, dizendo que cobram mais barato nas ligações. Já as cervejas, se não estão se agredindo mutuamente agora – até porque a Ambev detém três das principais marcas do país: Skol, Brahma e Antarctica -, resolveram “atacar” bebidas concorrentes. Nos filmetes da Skol, brasileiros aparecem ridicularizando bebidas típicas de outros Países. “A Skol está lançando mão de uma brincadeira aceitável dentro da rivalidade do futebol, onde o politicamente correto tem um momento de relaxamento”, justifica Fábio Fernandes, presidente e diretor de Criação da F/Nazca, agência das cervejas Skol e Brahma

Pegando pesado

Só que a Brahma extrapolou, se aproveitando das rivalidades futebolísticas. A famosa tartaruguinha da marca aparece dando uma “banana” para uma torcida adversária no último filmete da marca. Num comercial anterior, “travou” um duelo de embaixadas com um sushiman, onde sugere que o rival acaba degolado. Quem também “pega pesado” é a campanha do Bacardi Breezer. Num restaurante, uma garota é “sabatinada” pela mãe do namorado e acaba relembrando passagens nada conservadoras de sua vida sexual – entre outras coisas, a “nora” aparece de calcinha, perseguindo rapazes seminus pelo campus. Ao final, a mãe do rapaz interrompe o devaneio com uma pergunta de involuntário duplo sentido: “comeu bem, filhinho?”, indaga, se referindo ao jantar. Em outra versão, é o garçom quem aparece, questionando dubiamente se “a galinha estava boa”. “O target é jovem e é esse tipo de ambiente e de relacionamento com o qual ele convive. É uma forma de fazer com que entendam a mensagem”, pondera Rafael Camacho, da agência McCann Ericksson, onde é diretor de Atendimento da Bacardi.

Briga telefônica

As empresas de telecomunicações também gostam de falar diretamente. Às vezes até demais. A Telemar já teve um comercial onde Dercy Gonçalves acusava a conta de celular de “indecente” e jogava um aparelho no lixo. Embratel e Intelig vivem “debochando” um do outro. E a Oi, empresa de telefonia móvel, também resolveu seguir a cartilha de não “pegar leve” com os concorrentes. Nos comerciais, pessoas aparecem brincando com seus celulares como se não servissem para mais nada. Em outro filme, um homem se esconde para falar ao celular, constrangido por ter aderido à concorrência. “A estratégia de ser agressivo partiu da observação de consumidores insatisfeitos. Mas tivemos a preocupação de dosar a agressividade com humor para não criarmos um clima de briguinha”, garante André Lima, diretor de Criação da NBS, agência da Oi.

Preocupação, aliás, que vem sendo item raro. O problema é que, na maioria dos comerciais desse tipo, os anunciantes se preocupam tanto com os concorrentes que podem esquecer o consumidor.

Acordo “amigável”

A “guerra dos guaranás” deflagrada entre Coca-Cola e Ambev não é novidade. De vez em quando, surge um comercial provocando explicitamente o concorrente. Nessas horas, porém, sempre entra em campo o Conar – Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária. No caso dos guaranás, depois de queixas de um lado e do outro, a entidade sugeriu um “acordo de cavalheiros” entre as duas empresas, o que foi prontamente atendido com, os comerciais retirados do ar. “Já esperávamos que tanto o nosso quanto o filme deles fossem retirados”, reconhece Rodrigo Peccin, da Mídia da conta do Guaraná Antarctica na agência Carillo Pastore.

O Conar solicita a retirada de comerciais do ar ou cede direito de resposta a concorrentes baseado no Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária. No que diz respeito à propaganda comparativa – Seção 7, artigo 32 -, o código deixa claro que a campanha deve “objetivar o esclarecimento e a defesa do consumidor” e não “denegrir a imagem ou produto de outra empresa”. Ou seja, ambos os comerciais extrapolaram.

Humor e cutucadas

# Nos Estados Unidos, a Pepsi lançou uma propaganda onde uma criança vai até uma máquina de refrigerantes e adquire duas latas de Coca-Cola apenas para subir nelas e alcançar a tecla da Pepsi.

# A Intelig entrou com uma ação no Conar contra um comercial da Telefonica que dizia para o consumidor utilizar o código 15 de “olhos fechados” pois sempre estaria pagando mais barato que as concorrentes.

# Já há alguns anos a Brastemp optou pelo deboche para falar da concorrência, enquadrada no slogan “não é assim uma Brastemp”.

# Em 1995, a Coca-Cola chegou a produzir, mas não colocou no ar, três comerciais em resposta a um filmete da Pepsi onde macacos que bebiam Pepsi eram mais “espertos” do que os que bebiam Coca-Cola.

# O Guaraná Antarctica já havia provocado a rival num comercial onde uma pessoa mostrava fazenda onde era cultivado a semente do guaraná e perguntava à concorrente onde ficava a fazenda para extrair matéria-prima para fazer a Coca-Cola.

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