Francisco Filipak e o Dicionário Sociolingüístico Paranaense

A sabedoria e a humildade são virtudes que poucos possuem. Essas qualidades são encontradas em Francisco Filipak, que nasceu em Araucária em 7 de agosto de 1924. Graduou-se em Letras e fez o mestrado em Teoria Literária pela PUC – Pontifícia Universidade Católica do Paraná. É membro da Academia Paranaense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná.

Qual é o motivo de apresentar Francisco Filipak como sábio e humilde? Sábio, não só por ter lido muito, por ter domínio de várias línguas, por ter publicado 11 livros, mas também por estar aberto às linguagens populares e, em conseqüência, por estar em sintonia com os saberes que fazem parte do cotidiano das pessoas. Portanto, humilde por interagir com o popular.

Sua obra Dicionário Sociolinguístico Paranaense (Coleção Brasil Diferente e Coleção Estante Paranista, n.º 44), lançado em 17 de dezembro de 2002, em Curitiba, comprova essas afirmações, uma vez que resgata os falares que constituem as raízes dos sujeitos sociais do Estado do Paraná. Chuncho, enrabar, titica, vivaldino são exemplos.

Em entrevista, Filipak relatou:

Jorge

Como surgiu a idéia do dicionário?

Filipak

– Como professor na área de Letras, lecionei preferencialmente a disciplina de Lingüística e dentro dessa disciplina havia um capítulo denominado Dialetologia (analisa as linguagens, os falares locais e regionais). O aluno, para merecer nota nessa disciplina, apresentava uma pesquisa que consistia numa garimpagem de palavras locais ou regionais, dando os significantes e os seus significados. Como minha tarefa de professor restringia-se ao sul do Paraná, isto é, à Faculdade de Letras Tuiuti, hoje Universidade Tuiuti do Paraná, à Faculdade de Letras de Irati e à Faculdade de Letras de União da Vitória, na região do Vale do Iguaçu, o meu trabalho foi percorrer as outras faculdades de Letras do Paraná. Dessa forma, com o concurso dos professores de Lingüística e com a colaboração dos alunos organizamos a pesquisa dialetológica em Paranaguá, Ponta Grossa, Jacarezinho, Cornélio Procópio, Londrina, Maringá, Paranavaí, Umuarama, Cascavel, Toledo e Palmas. Assim, ano por ano surgiram novas pesquisas de alunos que foram aproveitadas como fonte primária na organização desse primeiro dicionário paranaense.

Jorge

– E essas cidades abrangem todo o Estado e todos os falares paranaenses?

Filipak

– Sim. No prefácio do dicionário foi explicado que existem três Paranás: o Paraná 1, Paraná tradicional, do Sul (região dos pinheirais e dos ervais), o Paraná do pinhão e do chimarrão; o Paraná 2, considerado o Paraná do café, abrangendo o norte pioneiro, o norte novo e o novíssimo; o Paraná 3, que abrange o Sudoeste e o Oeste paranaenses envolvendo os eixos Palmas-Francisco Beltrão, Cascavel-Foz do Iguaçu e Cascavel-Cândido Rondon. O sudoeste e o oeste paranaenses foram povoados etnicamente pelos ítalo-teuto-gaúchos, que legaram ao Paraná falares gauchescos. Os falares do Paraná tradicional receberam acentuada influência lingüística do tropeirismo. O Norte do Paraná sofreu influência lingüística dos falares mineiros, ítalo-paulistas, nordestinos, e sul-paranaenses.

Jorge

– Existe outro dicionário em andamento?

Filipak

– Exatamente. O dicionário do Espírito Santo já está na última revisão e possivelmente no decurso deste ano será publicado pelo Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo. A sistemática da pesquisa foi a mesma, visitando as faculdades de Letras das cidades de Vitória, Alegre, Cachoeiro de Itapemirim, Colatina e Linhares. Fora das faculdades de Letras pesquisei todo o litoral capixaba. Nas praias dos maratimbas, estudei os falares dos pescadores e com eles consegui o levantamento do rico vocabulário do Espírito Santo. Outrossim, colegas trovadores capixabas me forneceram vocabulários regionais enriquecendo o dicionário capixaba que em breve será publicado.

Jorge

– Existem semelhanças entre os linguajares paranaenses e capixabas?

Filipak

– A diferença é muito grande porque as influências nossas são umas e as do Espírito Santo são outras. A linguagem capixaba tem menor influência européia do que a nossa. No Paraná, ocorre a influência interlingüística (ucraína, polonesa, italiana, alemã, holandesa, japonesa), ou seja, de várias línguas. Já os falares capixabas têm apenas a influência das etnias alemã, italiana e polonesa.

Considerações – O trabalho de Francisco Filipak identifica-se com o atual conceito de fazer história porque tem afinidade com as culturas populares. “A chamada nova história cultural não recusa de modo algum as expressões culturais das elites ou classes “letradas”, mas revela especial apreço, tal como a história das mentalidades, pelas manifestações das massas anônimas: as festas, as resistências, as crenças heterodoxas. (…) A nova história cultural revela especial afeição pelo informal e, sobretudo, pelo popular. (…) É uma história plural, apresentando caminhos alternativos para a investigação histórica”. (Lynn Hunt, A nova história cultural, 1992).

Jorge Antônio de Queiroz e Silva

é historiador, membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná. E-mail:
queirozhistoria@terra.com.br

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