Crise foi “mal-entendido”, afirma Luiz Gushiken

Brasília

  – Depois da polêmica desencadeada pela entrevista de Cacá Diegues ao jornal O Globo no último sábado, o governo voltou atrás na criação de regras para o patrocínio cultural. A assessoria de imprensa da Secretaria de Governo disse ontem que o secretário de Comunicação do Governo, Luiz Gushiken, tomou um susto com as afirmações de setores da classe artística, de que o governo poderia estar interferindo no conteúdo artístico.

O ministro considerou as afirmações como um “mal-entendido”. Segundo a assessoria, o mesmo aconteceu com as declaraçãoes de que a Secom faz política cultural e que estaria concentrando no órgão a política para o setor. A assessoria afirmou que a Secretaria de Comunicação (Secom) só tem R$ 112 milhões para publicidade institucional. O ministro Gushiken participa junto com o ministro da Cultura, Gilberto Gil, de reunião com representantes da classe artística, na sede do Ministério da Cultura , no Rio.

O ministro Gilberto Gil negou na noite de segunda-feira que haja uma crise entre ele e Gushiken, por causa das novas regras de concessão de patrocínios de empresas estatais a projetos culturais. A polêmica fez com que os dois se reunissem com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na tarde de segunda-feira em Brasília, e na tarde de ontem com os artistas descontentes.

Mais tarde, no Rio, Gil comentou a reunião enquanto um encontro paralelo acontecia na cidade com os artistas envolvidos na polêmica, entre eles o cineasta Cacá Diegues e o músico Caetano Veloso. “Trata-se de um mal-entendido a interpretação de que o governo esteja tentando interferir no setor cultural por meio dos investimentos de empresas estatais, como denuncia um grupo de artistas”, definiu.

Ele considerou natural que ocorram interpretações equivocadas no início de um governo, quando os integrantes ainda estão formulando as ações que serão adotadas. O ministro garantiu que as políticas culturais continuarão a ser geridas por sua pasta, apesar dos temores de alguns artistas de que a Secretaria de Comunicação esteja tentando assumir o controle.

“Na reunião (com Lula) ficou acertado que o Ministério da Cultura continuará a ser o formulador da política cultural do governo”, afirmou Gil. Em Brasília, a Secom informou, por meio de uma nota oficial, que estão em discussão novos critérios para a política de patrocínios do governo federal. A nota também esclarecia que em nenhum momento as estatais patrocinadoras serão orientadas a interferir no conteúdo das ações culturais ou nas modalidades esportivas que requisitarem apoio financeiro oficial.

Entenda a polêmica na Cultura

De acordo com novas regras, anunciadas recentemente em editais pela Eletrobrás e por Furnas Centrais Elétricas, é necessário que haja contrapartida social dos projetos culturais, como acesso gratuito a jovens, deficientes físicos e moradores de comunidades de baixa renda, além de geração de emprego para pessoas pobres.

Elas estabelecem ainda que os recursos de uma nova parcela só sejam liberados após uma detalhada prestação de contas sobre o uso da parcela anterior. Todos os projetos devem também apresentar relatórios sobre seus resultados finais e sobre suas contrapartidas sociais. A base de critérios vão desde temas que valorizem as tradições e a identidade nacional, até o fortalecimento da imagem do patrocinador.

Entre os artistas que se mobilizaram contra as novas diretrizes estão o cantor Caetano Veloso, os atores Fernanda Montenegro, José Wilker, Marieta Severo e Miguel Falabella, o cineasta Cacá Diegues e os escritores Alcione Araújo, Ferreira Gullar, entre outros.

O estopim do movimento foi a entrevista de Cacá Diegues, publicada sábado em O Globo. Para ele, as exigências feitas sob argumento de contrapartida social são na verdade uma “patrulha ideológica e contra a liberdade artística”. “Fico mais tranquilo agora com a declaração de Gil de que a política cultural será conduzida pelo Ministério da Cultura”, disse Cacá após a reunião entre alguns artistas.

Já Caetano Veloso informou, através de sua assessoria de imprensa, estar preocupado com as alterações das regras justamente no momento em que o cinema brasileiro está ressurgindo. “As exigências sugerem um dirigismo temático e estilístico insuportável. Um governo bom não deve sequer parecer que acena com menor liberdade para os criadores. E espero que, apesar dos tolos de sempre que querem posar de radicais, a mensagem chegue a Lula como uma séria reivindicação da classe artística”, completou.

O cineasta Luís Carlos Barreto também falou, pela assessoria, no período da tarde, que está otimista, agora que a classe está conseguindo ser ouvida. “Há três meses estamos tentando ser ouvidos pelo Gushiken. Ele montou um Ministério da Cultura paralelo que é um núcleo duro de poder impenetrável”, falou. A classe artística conseguiu ganhar um apoio de peso, o do presidente do PT, José Genoino, que intermediou o encontro com a Secretaria de Comunicação.

Artistas preocupados no PR

Enquanto Gilberto Gil e Luiz Gushiken atuavam como “bombeiros” no Rio, em Curitiba a secretária estadual da Cultura, Vera Mussi, e diversos parlamentares recebiam representantes do Fórum Permanente de Cultura na Assembléia Legislativa.

Os representantes da comunidade artística foram mostrar sua preocupação com relação aos incentivos culturais que podem ser propiciados pela Lei estadual de Incentivo à Cultura.

O vice-presidente da Assembléia Legislativa, Natálio Stica (PT), confirmou que o problema se arrasta por bastante tempo: “Há três anos a lei está para ser viabilizada. No ano passado os deputados aprovaram-na aqui na Assembléia, mas o ex-governador Jaime Lerner a vetou alegando inconstitucionalidade”.

Em seguida, o ex-governador remeteu a lei para o legislativo, que derrubou o veto, mas Lerner entrou com uma ação direta de Inconstitucionalidade (Adin), o que transferiu a responsabilidade para o governo Requião.

Na conversa com os artistas, Stica relembrou da existência, no primeiro governo de Requião, do programa Conta Cultura. Os artistas propuseram que a iniciativa fosse retomada em formato parecido, com uma alteração de nomenclatura: “O Paraná faz arte”.

A solicitação apresentada pelo fórum de Cultura de Curitiba foi encaminha pelo deputado Stica ao secretário-chefe da Casa Civil, Caíto Quintana, que por sua vez o remeterá à apreciação do governador Roberto Requião. “Uma nova reunião deverá ser marcada para a semana que vem, e os nossos encontros passarão a ser mais constantes a partir de agora. A Lei Vanhoni de Incentivo à Cultura (municipal) também será analisada”, finalizou.

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