Angelo Paes Leme satisfeito com mudança de rumo

Angelo Paes Leme entra numa espécie de transe ao falar sobre seu atual personagem. Centrado e com o olhar fixo, o ator parece hipnotizado com a densidade dramática de Nando, protagonista do seriado A lei e o crime, na Record.

Acostumado a compor papéis mais leves como o divertido soldado Peixoto de Chocolate com pimenta ou o atrapalhado Salomão de Uga Uga, o ator teve uma mudança brusca de perfil ao sair da Globo.

Seu próprio comportamento, mais fechado e com poucos sorrisos, denunciam sua concentração no clima soturno de Nando, um assassino que teve de se refugiar no morro e chefiar o tráfico para sobreviver.

Com ele, este carioca de 35 anos deixou de lado papéis de menor importância nas tramas globais para ser alçado a funções de cada vez mais destaque nos folhetins da Record.

Logo de estreia, atuou como o bandido Jéferson em Vidas opostas, passou por Caminhos do coração como o cafajeste Rodrigo, e agora decolou para o seu primeiro protagonista: o chefão do morro Nando, no seriado assinado por Marcílio Moraes. “É um papel sem sentimentalismo, um texto sóbrio, sem espetacularização da violência. Sem dúvida, é o melhor personagem da minha carreira”, anima-se.

P – Em seu primeiro protagonista na tevê, você encabeça um seriado de ação, que é um formato sem tradição no Brasil. Como tem sido?

R – Acho esse formato muito interessante e vejo como dá certo em outros países, como os Estados Unidos. Me interessa a proposta dessa linguagem veloz, que conta a história com mais rapidez. As cenas ficam mais redondas, sem detalhes supérfluos. A trama caminha de uma forma mais ágil e a carpintaria do próprio texto se propõe a fazer diálogos com mais precisão, é mais sucinto. Além disso, o tratamento que o Marcílio (Moraes) dá a esse assunto é realista, acima de tudo. Ele faz esse trabalho com muita sobriedade. Não permite nenhum tipo de sentimentalismo ou espetacularização de qualquer cena ou ação.

P – Como assim?

R – Não aumenta nada. Tudo parece realidade. A produção trata de uma forma sóbria e verdadeira os fatos. Procura fazer um retrato do mundo de hoje nas grandes cidades, principalmente no Rio, refletindo sobre o assunto principal, que é o limite tênue entre a lei e o crime. O mais bacana é que o tratamento dos personagens não é tão maniqueísta nesse formato, não existem vilões e mocinhos. Os personagens são complexos, erram, acertam, têm sonhos, frustrações e desejos. O Nando, por exemplo, mata o sogro por sempre ser humilhado por ele. Depois dessa atitude extrema, ele poderia ter se entregado, pagar pelo crime, afinal tem o Estado para defendê-lo. Mas é um cara de classe média baixa, não tem dinheiro para pagar advogado. Diante da situação de um Estado ausente, dando margem para o crescimento do poder paralelo, com tanta impunidade, ele decide fugir por medo de morrer. Está jurado de morte pelo cunhado, que é policial civil e vai atrás dele. A única alternativa do Nando é fugir, se envolver cada vez mais no crime e se fortalecer. Com isso, vira o chefe do morro. Agora, é um combate entre duas forças que têm suas armas. O Romero tem a lei, o Estado. O Nando tem os bandidos do tráfico, o exército paralelo.

P – Como você se inteirou desse universo da marginalidade nessa composição?

R – Primeiro fui entender que homem é esse, o que se passa no coração dele, o que sente, qual seu sonho. Entendi quem ele é quando li sobre tráfico no livro Abusado, do Caco Barcellos, além de outros livros sobre o assunto. Também assisti a alguns filmes e procurei rever longas nacionais, como Tropa de elite e Cidade de Deus. Depois fiz um treinamento físico para ficar esperto e com preparo. Também tive aulas de aperfeiçoamento em tiro e manuseio de armas.

P – Voc&ecir,c; fez personagens mais leves e puxados pela comédia na Globo. Como você vê a abordagem desse tema da violência tão explorado na Record?

R – A Globo não costuma retratar a violência, a realidade da vida nas comunidades, as pessoas de classe baixa, de vida complicada em lugares hostis, com outros tipos de lei e outras autoridades.

P – Como você avalia ter se destacado como ator ao mudar de emissora e em papéis com temas violentos?

R – Vim para a Record sem caso pensado. Não estava insatisfeito na Globo. Tinha acabado de fazer dois filmes, estava cansado e tinha sido convidado para fazer Sinhá moça na Globo. Mas esperei pelo cinema e recusei a novela. Seis meses depois, o (diretor Alexandre) Avancini me falou do Jéferson, em Vidas opostas. Disse que era um papel genial. Me apaixonei pelo personagem. Quando acabou a novela, não tinha contrato com a Record e o Avancini me levou para Caminhos do coração, onde fiz o Rodrigo, que era um personagem mais comum, sem cores fortes. Assinei um contrato longo e continuei a parceria com o Avancini, com quem trabalho desde História de amor. Em relação à Globo, os personagens que fiz me satisfizeram, fiquei feliz.

P – Você tem uma carreira de 16 anos na tevê, desde que estreou em Sonho meu, na Globo. Mas o primeiro longa só foi rodado em 2005. Por que demorou tanto tempo para estrear no cinema?

R – Na verdade, eu nem sabia que seria ator. Tudo na minha vida aconteceu por acaso. Um dia, estava em casa tocando violão e uma vizinha entrou me chamando para substituir um menino numa peça de fim de ano no Teatro Tablado (no Rio). Estávamos em 1988. Acabei me identificando e fazendo uns cursos por lá. Isso passou a ocupar a maior parte da minha vida, mesmo depois que acabei a faculdade de Jornalismo.

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