Alberto Sordi encarnou o italiano típico

Alberto Sordi, que em 60 anos de cinema e mais de 150 filmes retratou o italiano típico do século XX, com todas suas virtudes e defeitos, faleceu aos 82 anos deixando órfãos os romanos que, para o bem ou para o mal, se identificaram com ele e seus personagens.

Nascido em Roma em 15 de junho de 1919, teve de deixar o coro de vozes brancas do Vaticano onde cantava quando uma robusta tessitura de barítono suplantou a de soprano infantil antes do tempo, lançando-o em uma carreira precoce no teatro de revistas e no rádio.

No cinema estreou em 1937 com um papel menor em “Il feroce Saladino”, de Mario Bonnard. Deu um impulso em sua incipiente carreira com um programa de rádio intitulado “Mamma mia, che impressione!”, que depois foi levado ao cinema com o mesmo nome, dirigido por Roberto Savarese (na verdade, Vittorio De Sica).

Foi o lançamento de uma carreira fulgurante na qual Sordi, além de ator, foi também produtor, diretor e roteirista. Ele interpretou uma galeria de personagens, em sua maioria negativos, que retratam o italiano médio saído da Segunda Guerra Mundial com vontade de viver e sem complexos moralistas.

Trabalhando ao lado de Federico Fellini, deixou caricaturas que eram sua bagagem cultural. Com “Lo sceicco bianco” (1952) e “I vitelloni” (1953) caracterizou o jovem covarde, aproveitador, indolente e crápula que abandonou por um momento com “La grande guerra” (1959) de Mario Monicelli, onde personifica um soldado com essas características mas que morre como um herói.

Na década de 60, seus personagens se instalaram em filmes como “Tutti a casa”, de Luigi Comencini, e, principalmente, “Una vita difficile” (1961), de Dino Risi. Neste último, talvez tenha feito uma de suas melhores interpretações, no papel de um jornalista de esquerda que tenta manter sua integridade e coerência política enquanto o resto da Itália faz o que pode para se dar bem.

Eram os anos em que a chamada comédia à italiana se ocupava de retratar o país real enquanto Visconti, Fellini, Antonioni e Rossellini criavam seu próprio mundo, e Rosi e Petri faziam cinema de denúncia.

Em colaborações com Monicelli, Risi, Comencini, Ettore Scola, Luigi Zampa e De Sica, Sordi afinou e aperfeiçoou seu personagem, que foi condensando as distintas facetas da Itália do boom econômico em um único personagem.

Sordi foi assim o industrial que vende um olho para sanear suas finanças em “Il boom” de De Sica, o exportador ilegal de capitais de “la più bella serata della mia vita” de Scola, que encontra seu castigo nas mãos de três velhos juízes, e o médico corrupto de “Il medico della mutua”, de Zampa.

Além de ator, Sordi foi diretor, roteirista e produtor

Sordi foi um símbolo da maioria silenciosa em “Un borghese piccolo, piccolo”, de Monicelli, que se transforma em uma máquina vingadora quando matam seu filho, um filme aterrador em sua comicidade quase involuntária que só ele era capaz de interpretar.

Roteirista de seus filmes mais importantes (com exceção dos que filmou com seu roteirista de confiança, Rodolfo Sonego), Sordi começou também a dirigir a partir de 1966 com “Fumo di Londra”.

Fez 18 filmes como diretor, até “Incontri proibiti”, de 1998. Sem chegar ao nível de suas obras melhores, soube tocar em temas de grande atualidade, como “Tutti dentro”, de 1984, onde, com quase uma década de antecipação, previu o encarceramento de toda uma elite política, industrial e financeira italiana por corrupção.

Sordi foi o espelho fiel de um italiano quase folclórico, mas real. Recebeu o Leão de Ouro à carreira em 1995, ano do centenário do cinema. A atriz Claudia Cardinale lembrou, porém, que o fato de ser considerado essencialmente um ator cômico impediu que durante anos fosse levado mais em consideração.

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