A universidade precisa se expandir

Num mundo marcado pela internacionalização e pelo acesso rápido a muitas informações, a universidade passa por um processo de dinamização. Está sendo convocada a construir um saber com a participação da comunidade. “A universidade precisa se expandir, não dá mais para ficar no intramuros”, enfatiza Luciano Leite, professor universitário de radiojornalismo em duas instituições paranaenses (PUCPR (Curitiba) e Unipar (Cascavel), que diz concordar com a frase da canção Sal da terra, de Beto Guedes, “vamos precisar de todo mundo pra banir do mundo a opressão.”

Autor de projetos que buscam a prática universitária interdisciplinar, o professor enfatiza o trabalho de platéia que consiste na aproximação do público de temas como o cinema, por exemplo. É a “compreensão do que o público assiste e da sua interpretação porque o resultado não deve ser recebido como acabado, deixando o receptor sem possibilidades de comparar as cenas do filme com a realidade, sem poder remeter à lembrança pessoal de diversos fatos ocorridos que possam ter relação com o filme. O trabalho de platéia, portanto, é uma forma de equiparar o filme com o que possa ser interpretado e questionado por meio da releitura”.

Paulo Freire, um dos autores reconhecidos mundialmente, afirma em seus livros que a releitura do mundo e dos textos é uma das atitudes mais importantes do ser humano que se reconhece inacabado e quer aprender. Nessa perspectiva, o professor não deve agir como um banco que entrega tudo pronto para o aluno em troca de sua passividade. “Acho arriscado dizer: assista isso que é melhor. Há poucos dias uma aluna queria uma referência sobre um determinado assunto. O que fiz? Indiquei um filme nacional que continha uma série de itens do que ela buscava. Assim ela vai formar culturalmente suas próprias referências e fontes a partir desta indicação”, disse o professor Luciano.

O estímulo para a descoberta pode e deve ocorrer nos ambientes estudantis. O trabalho de platéia, por exemplo, pode ser realizado com toda comunidade universitária. Na ótica do professor Luciano Leite, poderia “ser aberto para os demais cursos. Vejo um erro em montar um projeto de Comunicação que fique preso ao pessoal da minha área. O Núcleo de Rádio pode ser mantido, produzido pelos acadêmicos de Jornalismo, mas estudantes de história, odonto, direito, etc. têm a liberdade de criar os seus próprios produtos, ou seja, um aluno de medicina, que gostaria de passar ao ouvinte noções e dicas para evitar determinada doença, pode até apresentar o programa e bolar o seu formato. Aos acadêmicos de Jornalismo caberia a produção do material.”

O ambiente universitário não deve deter o privilégio das iniciativas inovadoras, “poderíamos levar o que ocorre na universidade para os ensinos médio e fundamental além de toda comunidade fora do eixo estudantil”, diz Luciano.

A passagem da teoria para a prática, entendida como a concretização de todo e qualquer discurso, não é fácil, especialmente quando diz respeito a projetos que poderiam ser abertos aos alunos fora do horário de aulas. “Outra dificuldade é que a universidade ainda adota o padrão antigo de controle de notas e freqüências, o que deixa o aluno refém de números e desinteressado pelo conteúdo”, disse o professor de rádiojornalismo. Diante de projetos que se deparam com a justificativa da falta de recursos ou excesso de burocracia interna, acrescenta: “Não posso apenas culpar ou apontar como culpados os coordenadores, pois entendo que nós, professores, em conjunto, deveríamos lutar mais pelo que reivindicamos.” Ao comentar a existência de bonitos discursos sobre modalidades de colaborar com a sociedade por meio de movimentos comunitários, comenta que essas ações são de iniciativa muitas vezes de pessoas que, contraditoriamente, se recusam a passar perto de uma favela ou de pegar um ônibus de linha municipal.

Sugere que “os educadores pensem o magistério atrelado à realidade, que os professores se atualizem e percebam o que os cerca. Isso não significa dizer que temos que assistir aos programas tipo Big Brother, mas que se faz necessário acompanhá-los para depois poder criticar. A maioria vai na cola do que o colega `intelectual’ apregoa”.

Em projetos interdisciplinares como o trabalho de platéia, que possibilita a releitura de mundo, da cultura, dos textos e da própria vida, ou em outras iniciativas como a implantação de uma emissão interna de rádio, Luciano Leite propõe que “as universidades escutem o que os professores/profissionais solicitam e opinam e se desprendam de linhas preconcebidas. Por exemplo, já tive aluno(a) com receio de me apresentar trabalhos sobre jornalismo policial, pois outros professores descartavam tal proposta. Ora, disse a eles que bastaria elaborar um programa com ética, respeito aos direitos do cidadão e informativo (sem apelação), que seria perfeito pensar na idéia. A universidade está viciada de conceitos travados.”

Hoje as empresas estão investindo no endomarketing ou marketing interno por acreditar que os funcionários podem constituir o diferencial na concorrência. Se não espontaneamente, as universidades também chegarão a fazer esta opção porque terão, no potencial de seus profissionais, uma das formas mais importantes de vencer e de estabelecer seu diferencial no mercado.

Zélia Maria Bonamigo

é jornalista, especialista em Mídia e Despertar da Consciência Crítica. Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná.E-mail:
zeliabonamigo@uol.com.br 

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