Vânia quer manter a tradição da família Ishii

São Paulo – Vânia Ishii, 30 anos, 1,67 metro, da categoria meio-médio (até 63 quilos) é a única faixa-preta de 5.º dan em atividade no judô feminino do Brasil, a mulher com maior graduação no País, recebida por mérito, em 2001.

A graduação e a experiência de quem luta desde menininha – herdou do pai, Chiaki Ishii, o primeiro medalhista olímpico do judô do Brasil, o gosto pelo esporte – dão a Vânia a confiança de que poderá quebrar um tabu e ganhar nos Jogos de Atenas, em agosto, a primeira medalha olímpica do judô feminino brasileiro.

Por brincadeira, Vânia começou no judô aos 4 anos. Mas não por iniciativa do pai, Chiaki Ishii, que ganhou medalha de bronze nos Jogos de Munique, em 1972. Foi a mãe quem decidiu que as três filhas – Tânia, Luiza e Vânia, a caçula – deveriam ter contato com o esporte.

Ao acompanhar a irmã, cinco anos mais velha, nos campeonatos, começou a aprender “que o judô era bonito”. As mesadas dadas pelo pai quando ganhou os primeiros campeonatos foram um estímulo a mais. “Assim meu amor pelo esporte despertou.” Quando Tânia foi para a seleção brasileira, Vânia já freqüentava o Projeto Futuro, no Ibirapuera, e ficou ainda mais animada com o “espelho” que tinha em casa. Tânia disputou as Olimpíadas de Barcelona, em 1992.

Aos 18 anos, a carreira de Vânia tomou forma, a partir de um convite que recebeu da empresa japonesa de tratores e maquinário Komatsu. “As empresas japonesas apostam no judô como arma de marketing. É um esporte que põe atletas e patrocinadores nas primeiras páginas dos jornais.”

Disciplina pura

Foi para Tóquio, onde, por dois anos e meio, morou, aprendeu japonês e judô. O pai, que intermediara o acordo com a empresa, dissera que o contrato seria de um ano. Quando soube, ao chegar ao Japão, que o contrato seria de dois anos, Vânia levou um susto. “Meu pai achou que eu talvez não agüentasse nem seis meses. Mas foi uma experiência que não trocaria por nada. Lá aprendi judô e disciplina na forma mais plena, com treinos diários, a partir das 5 horas, de segunda a sábado. Era o dia inteiro de judô, eu, duas russas, duas chinesas e sete japonesas.”

Em 1996, não pôde ir às Olimpíadas de Atlanta machucou o joelho, perdeu a seletiva e sofreu a primeira frustração por causa de uma lesão, algo que é um verdadeiro pesadelo para qualquer atleta de elite. “Recomecei do zero. Aí, tive de aprender que tudo na vida é um recomeço. Operei o joelho, fiquei parada…”

A participação no Mundial de 1997 e, principalmente, nos Jogos Pan-Americanos de 1999, em Winnipeg, no Canadá, quando ganhou a primeira medalha de ouro em Pans do judô feminino do Brasil, “uma das vitórias mais emocionantes da minha vida”, significaram muito. Nas Olimpíadas de Sydney, em 2000, foi a sétima colocada.

Outro recomeço

Após os Jogos de Sydney, uma lombalgia deixou-a oito meses sem lutar, com a perda de patrocínios levou Vânia ao segundo recomeço. “Perdi muito com isso, mas foram meses preciosos, porque passei a dar valor à seleção. Estava na seleção há oito anos. Nesses oito meses, senti muita falta disso. Resolvi que precisava ir atrás, resgatar o que tinha perdido. Recomecei mais uma vez.”

Este ano, Vânia terá de contar “com a paciência” dos professores da Faculdade de Publicidade da Universidade Mackenzie, em São Paulo. A judoca diz que se sente uma “batalhadora” e, assim, está confiante na conquista de medalha em Atenas. Participa de Mundiais desde 1995 a melhor posição foi o quinto lugar de 2003, no Japão e acha que nos últimos quatro anos não surgiu ninguém invencível. “São várias judocas com as mesmas condições. Já enfrentei todas, ganhei e perdi.”

Sparring de luxo

Além dos treinos em seu clube, o Pinheiros, no Projeto Futuro e com o preparador físico Beto Carnevale, Vânia luta com o pai, na academia da Avenida Pompéia, em São Paulo, a Associação de Judô e Karatê Ishii. Mas Chiaki levou um coice de um cavalo e está se recuperando de uma lesão na costela. Assim, Vânia não tem tido o sensei Chiaki Ishii como sparring nas últimas semanas.

“Ele é uma pessoa que se atualiza bastante e, ao mesmo tempo, tem a formação tradicional do judô. Conhece o meu judô. Qualquer dúvida, quando meus golpes não estão certos, recorro a ele para resolver o problema.” A medalha ganha por Chiaki Ishii em Munique está em um quadro em sua sala na academia. Vânia herdou o anel que Chiaki trouxe de Munique de presente para a mulher. “Virou meu amuleto.”

A judoca não vai disputar o Pan-Americano de Isla Margarita, na Venezuela, que começa segunda-feira; torceu o tornozelo esquerdo, “sem gravidade”. “Derrubei uma adversária, que caiu no meu pé. Como já tenho a vaga olímpica, fui poupada.”

Vânia se reintegra à seleção para um treino com judocas inglesas, no Brasil, assim que a equipe nacional voltar do Pan. Mas vai ficar atenta ao torneio, torcendo para que o namorado, o ligeiro Alexandre Lee, volte da Venezuela com a única vaga para Atenas que o judô brasileiro masculino ainda não tem entre as sete categorias olímpicas.

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