Parreira não vê valor prático na Copa América

Arequipa, Peru – Carlos Alberto Parreira é uma das pessoas mais fiéis e que respeita hierarquia no futebol brasileiro. Mas até ele se cansou. De maneira sutil, porém firme, o treinador critica a inoportuna disputa da Copa América no Peru. Não por ser no Peru, mas por interromper as eliminatórias e não ter nenhum valor na prática.

A ponto de o Brasil levar o seu time B, o Chile apenas seis titulares e o Paraguai a equipe olímpica. Ele desabafou em Arequipa na noite de sexta. “A Eurocopa tem tanto glamour porque os organizadores sabem valorizá-la. É disputada de quatro em quatro anos. Acaba cercada de toda expectativa de todo o mundo. A Copa América, não. Interrompe as eliminatórias e, disputada de dois em dois anos, se torna comum, sem atrativo. E com as seleções não trazendo seus principais jogadores. Não é bom negócio para ninguém”, falou.

Apesar de ser muito controlado, o descontentamento do treinador no Peru é evidente. Sabe que, apesar de todas as circunstâncias que deveriam ser atenuantes, corre o perigo desnecessário do desgaste. O Brasil não tem como fugir da cobrança de fazer ótimo papel nas competições que disputa. Exigência de título mesmo. “Nossa responsabilidade nunca será diminuída seja em qualquer disputa. A cobrança no Brasil nesta Copa América será forte. E o grupo que montei vai ter de assumi-la. Com a tradição que possui, a seleção não pode ir mal nas competições. Aliás, não tem o direito de ir mal.”

Só que Parreira, além de controlado é racional. Muito vivido, ele faz questão de alertar torcedores e mandar um importante recado aos seus jovens jogadores. “A primeira fase da Copa América é mais difícil até do que a conquista do título. Não importa se de quatro seleções, três se classificam. O Brasil tem um grupo com ótimo potencial, mas que nunca atuou junto. Não possui conjunto. Entrosamento no futebol atual conta muito. Estamos trabalhando para tentar corrigir isso o mais rápido possível, só que não é fácil”, admite.

O Brasil tem como adversários o Chile (adversário das 21h45), a Costa Rica e o Paraguai. O treinador fica possesso quando alguém pergunta se a seleção não pode ser considerada favorita não só a se classificar em primeiro lugar como também ao título da Copa América. “Olha, muita gente está quebrando a cara com essa história batida de favoritismo. Ou as pessoas se esqueceram que a França e a Argentina eram as grandes apostas da Copa do Mundo de 2002? E onde foram parar? Ninguém, até eu com a minha vivência no futebol poderia apontar Portugal e Grécia como finalistas da Eurocopa. Portugal até merecia uma aposta por jogar em casa. Mas, a Grécia? Então, não me venham com essa história de favoritismo para o Brasil.”

Parreira está enfrentando um constante questionamento em relação aos goleiros que trouxe para o Peru. Várias perguntas têm sido feitas em relação a Júlio César e Fábio. Há a insinuação de que jogadores experientes deveriam ter sido convocados para a posição. O treinador enfrentou as questões com irritada ironia. “Ao que me consta, o Júlio César é titular do Flamengo há três anos. O Fábio é o goleiro do Vasco há dois anos. Não acredito que clubes tão importantes como esses iriam colocar goleiros que não mereçam confiança. Eu acredito nos dois e estão prontos para atuar e bem nesta Copa América.”

Outro fato que tirava Parreira do sério era a faixa de capitão da seleção na Copa América. “Só vou falar uma coisa para vocês. O Brasil vai entrar com um capitão contra o Chile. E quem irá escolhê-lo serei eu. E mais ninguém.” A polêmica começou com a dificuldade em encontrar lideranças no elenco. Alex, o mais experiente do grupo, não é um “comandante”. Kléberson, o único pentacampeão que está no Peru, também não é. Edu, o jogador de personalidade mais forte no elenco, é jovem. E jogadores “rodados” no futebol europeu, como Bordon, não têm experiência suficiente na seleção.

Júlio César não se considera titular

Arequipa, Peru

– Apesar de já ter sido escolhido como titular para a Copa América, o goleiro Júlio César desfaz qualquer sinal de que está promovendo uma competição pela vaga na seleção principal com Dida e Marcos. Ele destaca qualidades nos outros dois goleiros e não se considera candidato a ocupar a posição depois do torneio.

Para Júlio César, seus dois colegas alcançaram prestígio por terem aliado competência e paciência. “São campeões do mundo e têm muita história no futebol.” O goleiro do Flamengo tem postura elogiada na seleção, pela simplicidade com que lida com o grupo e o equilíbrio mesmo em situações adversas.

Júlio César sempre recebe elogios de três admiradores de peso: o técnico Carlos Alberto Parreira, o coordenador Zagallo e o treinador de goleiros Wendell. Embora saiba que está um degrau à frente de Fábio, do Vasco, ressalta que seu companheiro de quarto em Arequipa é outro excelente jogador e pode disputar com ele a preferência de Parreira.

“Eu não penso em tomar a vaga de Dida e Marcos. Eu penso em aprender cada vez mais com eles.” Júlio César esteve em companhia de Fábio em outras circunstâncias.

Primeiro no sul-americano sub-20 de 1999, em que levou vantagem e foi o titular. Depois, no mundial da categoria, no mesmo ano, em que o goleiro do Vasco foi quem defendeu a seleção. As competições internacionais e o bom rendimento no Flamengo deram mais experiência a Júlio. Ele esteve na Copa das Confederações de 2003 e foi convocado para várias partidas das Eliminatórias do Mundial de 2006.

Por ter à sombra Dida e Marcos, embora negue que seu objetivo seja o de deixá-los para trás na seleção, Júlio César quer mostrar na Copa América toda sua capacidade. Ele trata o torneio como um desafio e não esconde a expectativa pela estréia, hoje, contra o Chile. “É bom ser titular da seleção, difícil é administrar isso. Estou muito ansioso.”

Aos 24 anos, o goleiro do Flamengo acredita que sua ascensão veio mais rápida do que imaginava. “Há um tempo, eu só conseguia me ver disputando uma chance na seleção quando estivesse com 27 ou 28 anos”. O fracasso recente no Flamengo, com a perda do título da Copa do Brasil para o Santo André, no Maracanã, abateu Júlio César, mas não a ponto de precisar de alguma ajuda especial da comissão técnica da seleção. Tanto que Carlos Alberto Parreira não falou nada com ele. “É uma página virada. Meu atual momento é muito bom. Para mim está sendo mais gratificante estar aqui na seleção do que voltar ao clube, depois do que aconteceu no Maracanã. Dá uma renovada de ânimo.”

Empresários contidos

Aquela imagem de empresários entrando sorrateiros no hotel da seleção brasileira não existe mais. Em Arequipa o lobby do hotel Libertador nunca deixou de estar tranqüilo. Mas nunca houve tantos negócios acontecendo em uma seleção. O motivo: o balcão de negócios se tornou virtual. Os atletas estão fechando transações por telefones celular, fax ou computador com a compreensão da comissão técnica.

Carlos Alberto Parreira acredita que os atletas atingiram um grau de maturidade que podem decidir seu futuro sem tirar a concentração da Copa América. “Eles são profissionais. Atuam ou interessam aos melhores clubes do mundo. Sabem lidar com sua carreira sem prejuízo à seleção. Estou tranqüilo, confio neles”, diz o técnico.

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