Racismo

Opinião da Tribuna: o ódio tomou conta do nosso futebol

Reprodução/Facebook

O que aconteceu nos últimos dias com o zagueiro Márcio não é apenas mais um caso. É um problema sério que o futebol brasileiro tem tremenda dificuldade em enfrentar – a rigor, a sociedade brasileira tem tremenda dificuldade em enfrentar. Não sabemos como lidar com o racismo, não somos corajosos o suficiente para denunciar e confrontar quem age desta forma nojenta – e, pior, há sempre quem encontre um subterfúgio que justifique um ato como este.

Olhando para o nosso mundinho, a realidade é que o ódio tomou conta do futebol. Vivemos um momento triste, em que um deslize qualquer não é permitido. Em que uma opinião contrária não é aceita. Em que ser diferente não é permitido. Em que ofender é melhor que argumentar.

Volto ao caso de Márcio – também porque é o mais recente. Quando o Coritiba se manifestou contrário ao racismo, a reação dos torcedores foi decepcionante. Os alviverdes diziam que o problema era o time perder para o Vitória, e não um cidadão ser agredido apenas pela sua cor. Os rivais não defendiam o atleta ofendido, e sim ofendiam os torcedores. A chance de uma discussão séria sobre um assunto muito sério foi novamente perdida.

E por que é assim? Antes que se diga que o problema está nas redes sociais, digo que infelizmente nos comentários das matérias dos jornais – incluindo a Tribuna – o nível é também ruim, se não for pior em alguns momentos. Todo dia a gente recebe pedidos de maior moderação nos comentários, mas por talvez acreditarmos que ainda pode ser diferente, e por não termos a menor vontade de interferir nas opiniões de ninguém, não mudamos as regras de moderação.

O problema está no futebol. Será que um lance errado justifica toda a reação em cima de Márcio? Pergunto ao torcedor: será que um erro de um atleta de sua equipe é tão importante a ponto de suscitar uma reação de fúria? Será que o fato de uma pessoa ser atleticana é tão absurdo para alguém que é coxa-branca ou paranista? Ou vice-versa? Quem são vocês, furiosos do teclado e das pichações, que não têm cara, não têm nome e não aceitam absolutamente nada que não seja exatamente o que vocês pensam?

Argumentos não existem. Um xinga o outro, que xinga a mãe do outro, que manda para aquele lugar, e por aí vai. E aí entram nos xingamentos os outros torcedores, as famílias, os jogadores, os dirigentes, os antepassados e tudo mais.

O ódio que se transmite nestas mensagens destrói para muitos o que se chama de esporte. Deixa de ser positivo o que é a grande diversão do brasileiro. Não vale a pena conviver em um mundo em que é impossível conversar, em que discordar vira guerrear, em que a raiva supera a alegria.

E não me venham dizer que “o futebol é um mundo à parte”. Por conta dessa lorota falada sem parar somos permissivos com o racismo, com o machismo, com a homofobia, com a violência dentro e fora de campo. O “mundo à parte” também aceita a corrupção dos cartolas? A venda de jogos? Que seu time seja envolvido em mutretas? Ou isso não pode porque “meu time não tem isso, só o meu rival que é uma m…”?

Chega de “mundo à parte”. Racistas são racistas aqui, ali e em qualquer lugar. E homofóbicos, e preconceituosos, e machistas, e agressores. E ódio não cola pra quem realmente gosta de futebol.