Com tatuagem de Che Guevara, judoca refugiado no Brasil vai disputar Olimpíada

O sonho de Popole Misenga se tornou realidade nesta sexta-feira, quando o Comitê Olímpico Internacional (COI) incluiu o judoca na equipe de refugiados que disputará os Jogos do Rio-2016, em agosto. A tatuagem de Che Guevara no braço tem um forte simbolismo para o atleta da República Democrática do Congo. “Fiz uma tatuagem do Che Guevara porque sou guerreiro. Sobrevivi a muita coisa na guerra. Vi muita morte perto de mim. Consegui escapar várias vezes com as pessoas dando tiro. Estou conseguindo treinar porque sou guerreiro”, disse.

Desde que optou por não voltar ao seu país após a disputa do Mundial de Judô, em 2013, na capital fluminense, sabia que estava trilhando um novo caminho. Para trás deixou uma realidade bruta. “A gente era maltratado, não tinha apoio, então decidi ficar”. Quando perdia uma luta, por exemplo, era preso em uma jaula com apenas um pouco de água e pão velho. Tanto que quando começou a treinar no Brasil, no Instituto Reação, abusava da força nos tatames, como se aquele passado cruel pudesse se repetir. Logo aprendeu que a dinâmica era outra.

Longe das guerras de seu país, Popole encontrou no Brasil a paz necessária para se dedicar ao esporte. Seu objetivo de disputar a Olimpíada no Rio, onde mora com o apoio do COI, foi realizado. Ele também está tendo ajuda da Universidade Estácio, que oferece professores para que ele possa terminar o ensino médio e consiga fazer um curso de graduação. “Estou estudando e treinando no Instituto Reação com o sensei Geraldo Bernardes, com vários atletas de seleção brasileira”, contou.

A saudade das duas irmãs e do irmão, todos mais novos, o alimenta a cada dia para continuar treinando. “Eles ficaram no Congo e não tenho qualquer contato. Já tinha perdido minha mãe na guerra passada, agora estou tentando viver e virar uma pessoa que pode ajudar a família. Estou com muita saudade deles, todos os dias antes de dormir fico pensando neles”, revelou o atleta, que recentemente treinou em Pindamonhangaba (SP) com a seleção brasileira de judô, esporte que tenta praticar desde os 10 anos.

Popole foi criado pela mãe junto com seus irmãos. O pai abandonou a família cedo e nunca mais voltou. O atleta até tentou um contato com ele, mas acabou quebrando a cara. “Quando ela morreu, fui para a capital do país e me disseram onde meu pai morava. Era em outra cidade. Fui lá para procurar, cheguei e ele me dispensou. Não tenho nenhuma saudade dele, só dos meus irmãos”, avisou.

O judoca nasceu em Bukavu, no leste do país, uma região de disputa intensa por ouro, diamante e minérios raros. A cidade fica próxima de Uganda, Ruanda e Burundi e está em uma das regiões mais afetadas pelas guerras no Congo, que tiveram mais de 5 milhões de mortos e milhares de pessoas expulsas de suas casas. Por isso, sua percepção do Brasil é diferente. “É um país tranquilo. Até na favela é calmo. No Congo, se troca um presidente assim como ocorreu no Brasil, vai ter muita morte. Se mandar o presidente sair, é guerra. Talvez meus irmãos já estejam mortos”, concluiu, com lágrima nos olhos.

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