Bernardinho repleto de planos para ano que vem

Bernardinho foi eleito o melhor técnico do ano pelo Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e recebeu o prêmio, no Rio, dia 17, data do primeiro aniversário de sua filha com Fernanda Venturini, Júlia.

Quando não está com a seleção, Bernardinho se divide entre a família – tem um filho também com Vera Mossa, Bruno -, a coordenação do vôlei do Rexona, palestras e eventos. Prepara, ainda, um livro sobre gerenciamento de pessoas -tema de suas palestras.

Bernardinho, que assumiu a direção da equipe masculina em abril de 2001 e desde então conquistou sete de nove títulos disputados – nos outros dois o Brasil foi vice-campeão -, diz que não vai trocar a seleção masculina pela feminina. Fica tentado a voltar, principalmente porque gosta mais do estilo de jogo do feminino. Tem ótimo relacionamento com as jogadoras. E sabe que o momento é propício para grandes conquistas internacionais. Cuba não é a imbatível seleção que enfrentou quando estava à frente do feminino. Para ele, a Itália, a atual campeã mundial, não é forte como o Brasil (com a força máxima, é claro). E Rússia e China são os únicos adversários mais complicados na luta por uma medalha olímpica.

Paraná-Online

– Quando caiu a ficha da conquista inédita do vôlei masculino?

Bernardinho

– Depois que voltei. A repercussão foi grande. Gente me parando na rua, convites para matérias em revistas e jornais, pessoas me cumprimentando nas palestras e eventos… Mas, sinceramente, na minha cabeça, eu que estou trabalhando com seleções há 9 anos – e não é presunção, tá! -, é mais um título importante. Não o vejo como o título. É importante, como outros foram importantes e outros serão. A minha cabeça está voltada para frente. Tenho de estudar muito, ler muito, pensar no que tem de ser feito em 2003. Que armadilhas poderemos enfrentar pela frente? De que maneira poderemos progredir? Quando se conquista algo importante como foi o Mundial, a tendência é baixar a guarda.

Paraná-Online

– O que te preocupa?

Bernardinho

– Às vezes não estamos tão dispostos a fazer sacrifícios que já foram feitos no passado. O relacionamento começa a se desgastar quando o nível de intensidade a que nos dedicamos para chegar a um objetivo não é total. Se isso acontecer, teremos de refazer a equipe. Quando as pessoas começam a ter interesses diversos, não temos mais uma equipe e sim um grupo de pessoas. Uma equipe é um grupo de pessoas com interesse comum. Você vai tirar uma frase do meu livro: ter a consciência de que para se atingir esse objetivo comum, depende do esforço coletivo.

Paraná-Online

– Você sempre falou que o segredo do sucesso é o trabalho. Todas as seleções trabalham duro, mas só algumas vencem…

Bernardinho

– Não posso dizer que a nossa equipe foi mais equipe do que as outras no Mundial, por exemplo. O sucesso não pode ser baseado em apenas uma importante conquista. Além de vários títulos, uma das grandes virtudes daquela época da seleção feminina foi que, ao longo de sete anos, ficamos entre os três primeiros colocados em vários eventos disputados. Isso é consistência. Isso para mim é uma equipe vencedora. A virtude dessa equipe, que passou por mudanças naturais de renovação, foi não ter perdido a força da coletividade.

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– O vôlei masculino já está colhendo os frutos dessa grande conquista?

Bernardinho

– A tendência é que os jogadores tenham maiores salários, por exemplo. Há um ou dois anos, o primeiro ranqueado entre os melhores salários não era um homem e sim, uma mulher. O Maurício, o Giba, o Nalbert, sei lá quem ganhava mais, estava no quinto posto. E na minha época, as mulheres ganhavam bem menos do que os homens porque o carro-chefe era o vôlei masculino. Em um certo momento houve um interesse maior pelo vôlei feminino por parte dos patrocinadores. Os salários subiram. O título masculino vai valorizar os atletas. Desde 2001 com a conquista da Liga Mundial, o número de jogadores assediados por grandes clubes aumentou. O Anderson, por exemplo, que até então jogava em times médios, estourou na Ulbra, chegou na seleção e agora está no Japão. Talvez seja um dos maiores salários, ao lado do Nalbert, que está na Itália.

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– Você tem feito mais palestras após o título?

Bernardinho

– De dois anos para cá tenho feito algumas palestras sobre gerenciamento de pessoas. A procura, com certeza se intensificou. Ninguém me contrata porque tenho grande conhecimento acadêmico. Me contratam porque tem a figura do técnico campeão mundial. Isso é um algo a mais que no momento eu tenho. Entre novembro e fevereiro do ano passado fiz umas 15 palestras. Esse ano farei mais de 30. A palestra se propaga de boca em boca. As pessoas gostam da mensagem que passo. Sei porque alguns me ligam por causa dos comentários de pessoas que já me assistiram. Na AmBev, por exemplo, falei para o pessoal da Skol e teve gente da Antarctica e Brahma que me procuraram. Gravei uma fita e mandei para eles. Na verdade chamo de encontro e não palestras. Também é enriquecedor para mim, principalmente quando abro para perguntas e respostas. Tenho palestras marcadas até novembro de 2003.

Paraná-Online

– Que empresas você já foi?

Bernardinho

– Já fui a muitas e não lembrarei todas. ING Unibanco, Santander, Banco Real, Petrobrás, Skol, Ford, Scania, Unimed, Telemar, Telefônica, empresas de logística, de tubulações de gás, laboratórios farmacêuticos, mineradoras, shoppings, exportadoras de grãos, em fábricas (como a da Unilever), KPMG… (Fernanda Venturini, que estava na sala ao lado ajuda a lembra de algumas empresas).

Paraná-Online

– O que mais te perguntam?

Bernardinho

– Qual a diferença de trabalhar com homens e mulheres, como lidar com problemas de vaidade….

Paraná-Online

– O que é o sucesso?

Bernardinho

– É ter sempre performance de alto nível. Não é ser o primeiro ou o segundo colocado, até porque nem todos têm capacidades para isso. Empresas com capacidade de capitalização menor, redistribuição menor, menor possibilidade de contratação, não podem competir com as grandes. Mas, se desenvolve 100% da sua capacidade, está obtendo sucesso. Muitos podem falar: pôxa, a seleção feminina não ganhou o ouro olímpico ou mundial. Mas talvez nosso potencial técnico e físico naquele momento fosse menos do que o de Cuba.

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– Quem cuida da sua agenda?

Bernardinho

– A Fernanda e uma empresa ligada ao esporte. Desde que cheguei do Mundial não parei. Desde eventos beneficentes até palestras. Parte do prêmio do Mundial doei para o Criança Esperança montar uma sala de projeções no Morro do Cantagalo e para uma instituição na região do Rio Cumprido. Quando tem jogo do Rexona eu vou. Acabei de voltar do Japão, onde dei um curso para 160 treinadores. Fiquei uma semana, sete horas de aula por dia. Obviamente, não paro de pensar em seleção. Tem também os jogos do Bruno… (estava jogando o Campeonato Paulista, pelo Fonte São Paulo, de Campinas, na categoria infanto-juvenil)

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– E a Júlia?

Bernardinho

– Um dia acordei com uma dor nas costas e não sabia o que era. É de tanto abaixar e levantar. Quando posso fico com ela. Nesse ano a festa do prêmio do COB foi no dia 17, aniversário de um ano dela (chama a babá, Euvira, porque a filha está prestes a colocar um tubo de pomada na boca) e o Rexona jogou em São José dos Campos. Se eu não fosse dessa vez, o Nuzman (o presidente Carlos Arthur Nuzman) me matava.

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– Você fica mais em Curitiba e São Paulo?

Bernardinho

– Essa vinda da Fernanda para São Paulo complicou um pouco essa guerra. Fico mais em São Paulo e Curitiba. Vou de vez em quando para o Rio. Fico de um lado para o outro atrás da Júlia. Ela está terrível, mil por hora (mostra os adesivos que colocou nas gavetas da estante para evitar que ela abra tudo e jogue no chão).

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– E o livro que você está escrevendo?

Bernardinho

– (levanta e mostra alguns dos livros na estante. São todos títulos norte-americanos sobre técnicos de basquete, futebol americano, sobre o presidente do banco Central dos Estados Unidos (Fed), ex-prefeito de Nova York…). Esse aqui foi o primeiro que li e que me empolgou: Everyone?s a Coach de Don Shula, técnico do Miami Dolphins – futebol americano -durante 33 anos, e Ken Blanchard, que escreve sobre administração e gerenciameto. É interessante porque faz um paralelo entre a vida de empresas e de equipes esportivas. Outro muito bom, escrito por vários técnicos do futebol americano, Game Plans for Success. Tenho vários livros de Bobby Knight, um dos melhores técnicos de basquete americano. Livros brasileiros tenho sobre liderança, psicologia, sobre a vida, mas nenhum no estilo esportivo. Meu livro será uma coletânea do que já li e sobre minhas experiências. Não é biográfico, mas terá histórias que vivi, que soube e que vi. Tenho muito material das palestras mas não comecei a escrever.

O Estado – Quando vai publicar? Bernardinho – Os donos da Editora Record, do Rio, são amigos do meu pai e darei prioridade para eles publicarem meu livro. Outros ligaram perguntando se eu queria publicar pela editora deles. Gostaria de escrever até o início da próxima temporada internacional. Mas acho que não vou conseguir.

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– Sempre se deu bem para falar em público?

Bernardinho

– Tenho mais problemas para falar sobre coisas íntimas e pessoais. Tenho dificuldade de comunicação no dia-a-dia com os jogadores e em casa. Mas estou com medo de uma palestra que farei na Petrobrás, no Rio, em que estarão por lá o FHC e o Lula. É um evento enorme, não serei o único palestrante… não sei o que é direito.

Paraná-Online

– Sobre seleção. Você vai mudar para a feminina? Coordenar as duas seleções?

Bernardinho

– Não existe nenhum movimento para que eu coordene as duas seleções. E não posso escolher nada, se mudo ou não mudo. Quem decide é o Ary Graça (presidente da CBV). Lá atrás, houve um certo encaminhamento para que eu mudasse para o masculino, e só. A pressão foi grande. Agora, falando hipoteticamente, ok? Não poderia estar em primeira pessoa dirigindo uma seleção se eu coordenasse as duas. Teria de ter dois técnicos altamente afinados com o meu trabalho. Não é por aí. Eu jamais iria propor isso.

Paraná-Online

– A Fernanda disse que pensa em voltar, mas só o fará se você for o técnica da seleção…

Bernardinho

– Acho que ela pensa em voltar em alguns momentos e em outros não. Nesse aspecto ela é de momentos. Sabe quantas vezes a gente conversou sobre esse assunto? Nenhuma.

Paraná-Online

– Mas a chance do feminino ganhar uma medalha de ouro na Olimpíada é bem maior…

Bernardinho

– Você quer que eu me refugie em um mar mais tranqüilo, então? Não posso abandonar o barco.

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