A era dos “kamikazes da F-1”

Quando os 20 pilotos da Fórmula 1 estiverem prontos para o primeiro treino com voltas lançadas da história da categoria, na noite de hoje em Melbourne, terá início a era dos “kamikazes” na elite do automobilismo mundial. Como os pilotos da esquadra imperial japonesa na Segunda Guerra, o “vôo” será único daqui para a frente. Errou, morreu. A diferença não muito sutil é que os suicidas nipônicos morriam quando acertavam, também.

A definição do grid de largada, que decidiu tanta corrida nos últimos anos tamanhas as dificuldades de ultrapassagem na F-1, passará a ser território dos mais ousados, daqueles que não medem riscos por um resultado. O medo do erro, que pelas novas regras jogará seu autor para o fundo do pelotão, fará com que alguns coloquem a cautela à frente de tudo.

Ninguém sabe ao certo como vão se comportar os pilotos diante dessa nova situação. Até o ano passado, o treino de classificação permitia erros. O piloto tinha, em média, quatro tentativas de volta rápida, podia escolher o momento de ir para a pista e, se seu carro titular apresentasse algum problema, era só pegar o reserva.

Agora, não. Cada piloto fará sua volta única e entrará na pista na ordem determinada pelo resultado da pré-classificação, disputada nos mesmos moldes. Na Austrália, esse primeiro treino “kamikaze” foi realizado na madrugada de hoje, entre 0h e 1h. O mais rápido será o último a fazer seu vôo suicida.

Como a partir deste ano o piloto não tem mais a prerrogativa de esperar pelo melhor momento de ir para a pista, mais uma variável se impõe na loteria da classificação: o clima. A previsão do tempo para Melbourne neste fim de semana é das mais aterrorizantes. Os boletins meteorológicos foram taxativos: chove no sábado e no domingo. O que significa que o treino poderá ter níveis diferentes de água no asfalto, ou até começar molhado e terminar no seco, ou o contrário.

O resultado disso tudo será um grid, domingo, diferente do que se habituou a ver nas últimas temporadas, com Ferrari na frente, revezando-se com Williams e, de vez em quando, McLaren. É garantia de diversão para a primeira corrida do ano, com largada prevista para a meia-noite do sábado e 58 voltas.

Há muito tempo não se aguarda uma abertura de Mundial com tanta expectativa. Sim, a Ferrari continua favorita e deve ganhar o campeonato. Mas uma bela canetada de Max Mosley, presidente da FIA e principal mentor das mudanças no regulamento, tornou o caminho bem mais difícil para os vermelhos. E bem mais interessante para o público.

Grid sai a partir da meia-noite

O treino “kamikaze” que define o grid do GP da Austrália, a primeira corrida da “nova F-1”, está marcado para a meia-noite de hoje, pelo horário de Brasília. Antes, entre 19h e 21h, acontece o último treino livre, seguido pelo warm-up, treino de aquecimento, entre 23h30 e 23h45. Antes da classificação, os carros terão de ser abastecidos e calçados com os pneus que serão usados na corrida. A quantidade de gasolina depois do treino será a mesma que estará no tanque na largada.

Os 20 carros passarão a noite de sábado e a madrugada de domingo trancados no Parque Fechado. Nenhum acerto será permitido, e eventuais consertos, só com autorização da FIA. Às 8h do domingo, poderão voltar aos boxes para checagem de sistemas de segurança.

Cristiano quer fazer bonito

Chegar à Fórmula 1 é o sonho de quase todo piloto. Quase. Cristiano da Matta, 29 anos, fez toda sua carreira pensando nisso, mas num determinado momento o vento mudou de direção e ele acabou nos Estados Unidos. Lá, esqueceu a Europa. Foi campeão da Indy Light em 1998 e, no ano passado, conquistou o título da Cart.

Foi na metade de 2002 que surgiu a chance de correr na Toyota na F-1. O eldorado da pilotada, no entanto, não o encantava. “Eu não queria vir para fazer número”, disse o mineiro. Acabou vindo. “É uma realização, claro, algo que me deixa satisfeito. Só que não é um sonho. Sonho é ganhar o campeonato. Chegar aqui, um monte de gente chega. Chegar, ficar e fazer alguma coisa é que é difícil.” O ocaso da Cart ajudou na decisão de mudar o rumo de novo. A categoria americana, mal das pernas, virou depositário de pilotos desempregados, veteranos ou novatos endinheirados. A Toyota, embora ainda faça número, como temia Cristiano, dá a ele esperanças de crescimento. “Se não fosse assim, não teria vindo. É lógico que vai demorar um pouco, mas acho que num médio prazo a gente deve melhorar muito.”

Da Matta é um dos quatro estreantes da temporada, o único deles que não participará dos treinos extras de sexta-feira ? as equipes dos demais, Jordan, Jaguar e Minardi, optaram por essas sessões em troca de limitar seus testes privados durante o ano. “Vou ter pouco tempo de pista. A classificação de sexta-feira nos circuitos que não conheço vai ser particularmente difícil para mim”, prevê.

A preparação para seu primeiro Mundial foi considerada “boa” por Cristiano, “mas não excelente”. Foram 7 mil km de testes, só que ele andou pouco com o carro novo. “Eu me sinto preparado, mas te garanto que ainda não estou 100%, porque ainda tem lugares em que posso melhorar.”

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