A Tribuna sempre teve sangue quente correndo nas veias. O mesmo que fervia nas ruas, nos bairros, nas delegacias, no asfalto das madrugadas. Foi o jornal do povo e das pessoas reais, com suas dores, seus dramas e suas lutas. E quem levou essas histórias às páginas, quem mergulhou nos becos, nas cenas de crime, nas delegacias e nos corredores do IML, foram jornalistas de coragem, faro e coração: os repórteres policiais.
“Muitas vezes, a gente ajudou a identificar pessoas. E também a encontrar crianças desaparecidas. Para nós era muito significativo”, conta Mara Cornelsen, uma das mais lendárias jornalistas da editoria policial da Tribuna. Foram décadas cobrindo crimes, sequestros, acidentes, tragédias e injustiças, com a coragem de quem acreditava que a notícia podia transformar.
Uma de suas matérias ajudou a desmascarar uma quadrilha que matava taxistas. Ela conta que a Polícia Militar apresentou o suspeito, um soldado da PM. Um cabo estava junto e ficava na frente, não deixava ninguém fotografar o preso. Até bateu boca com um superior, para não expor o colega. “Nunca tínhamos visto um policial bater boca com um superior. Então pedi pro fotógrafo fazer foto desse cara e escrevi uma matéria sobre o ‘show’ dele”, diz Mara.
No dia seguinte, descobriram o motivo do show: o cabo também fazia parte da quadrilha, foi identificado através da foto no jornal e acabou preso.
Houve momentos de glória e de dor. Mara apanhou, foi ameaçada de morte, já lhe ofereceram dinheiro para uma matéria não sair, mas também viu suas matérias servirem de base para o Linha Direta, da TV Globo, além de solucionar o tráfico de uma criança pra Israel. “A Tribuna era o jornal da verdade. A gente era querido e odiado, dependendo da situação. Mas nunca deixamos de fazer nosso trabalho.”
Rapel e cabeça na bandeja
Quem também já viveu muitos perrengues atrás de notícias foi a Giselle Ulbrich. Atrás da notícia já desceu de rapel o viaduto dos padres, na BR-277, para entrevistar o delegado que estava lá embaixo investigando um acidente, já viu cadeiras e cofres da prefeitura de Itaperuçu voando sobre sua cabeça durante um protesto do povo, já viu cabeça de preso em bandeja no telhado de presídio, na rebelião mais sangrenta que Piraquara já teve.
Mas foi o relato de um colega “carrapicho” (como são chamados os repórteres policiais, sempre “grudados” na barra da calça dos policiais), anos depois de ter saído da Tribuna, que a fez entender que seu jeito de apurar as notícias era diferente. O Lúcio André, hoje apresentador de TV em Minas Gerais, disse que os repórteres policiais de outras mídias esperavam ler a Tribuna no dia seguinte, quando Gisele ia aos locais de crimes. Sem entender, Giselle perguntou por quê.
E Lúcio explicou que era o jeito de contar as histórias, em textos envolventes, destrinchando de forma simples as informações técnicas da polícia e fazendo o leitor sentir a emoção exata dos personagens da matéria.
Além do crime
Em 1995, a Ronise Vilela chegou à redação para substituir o veterano Ivo Lovato. O destino, no entanto, quis que ela começasse por outro caminho: os tribunais.
“Comecei a cobrir júris. E percebi que ali estava o outro lado da notícia, o bem depois da prisão, da manchete, do flagrante”, conta.
Ronise transformou a cobertura judicial da Tribuna, levando o jornal a acompanhar a história do crime até o julgamento. “Aprendi que cada história tem vários momentos. E que o repórter policial tem um papel social enorme: dar continuidade às vidas que passam pelas páginas do jornal.”
Geração coragem
Patrícia Cavallari foi daquelas repórteres que faziam a notícia acontecer e, às vezes, até parte dela. “Me passei por interessada pra comprar diploma falso. Combinei com a polícia. Quando fechei o negócio, o cara foi preso.”
E assim como alguns jornalistas que passaram por ali, foi na Tribuna que formaram família. “Conheci meu marido ali dentro. A Tribuna foi minha escola, onde aprendi o respeito às fontes e a profundidade do jornalismo impresso.” Ela se recorda com carinho do mentor Charles, o editor que moldou gerações de repórteres, e da colega Mara, a “professora” de tantos talentos. “A Tribuna permitia que a gente contasse as histórias com humanidade. Cada vida importava. Era um jornalismo com alma.”
E a Bia Moraes, cobriu de tudo: crimes brutais, histórias de desaparecidos, e até séries ousadas como O Sexo e a Cidade, sobre o universo feminino e a sexualidade em Curitiba. Seria uma série com quatro reportagens: as prostitutas do Passeio Público (a maioria trabalhava de diarista até umas 14h e a tarde ia ser prostituta pra complementar a renda. 18h iam embora buscar os filhos na escola.); os sex shops; as casas de swing; e a prostituição de luxo.
Faltavam apenas entrevistas para a última reportagem quando num domingo o Rafael Tavares, diretor da Tribuna, pediu se ela tinha qualquer coisa para virar capa, porque o dia estava ruim de notícias de policial e futebol. Bia escreveu sobre a casa de swing e isso foi a capa no dia seguinte. O jornal esgotou na banca no dia seguinte. “Era um jornalismo de rua, sem medo, sem filtro”, ressalta.
Sem medo de nada
Valéria Biembengut começou como estagiária, sem imaginar que se tornaria uma das mais destemidas repórteres policiais do jornal. “O fotógrafo me levou ao IML e perguntou se eu aguentava ver corpos. Achei que fossem bonecos. Passei no teste. Ele não gostava de sair com repórteres mulheres porque a anterior a mim desmaiou quando viu um cadáver em local de crime”, diverte-se Valéria.
Ela enfrentou rebeliões em presídios, foi perseguida na estrada, lidou com criminosos armados e delegados exaltados, sempre com serenidade, curiosidade e bom humor, características também que lhe ajudaram a arrancar muitas confissões de criminosos.
“Eu nunca tive medo. Entrava mesmo. Até em rebelião no Centro de Triagem, eu entrei pra conseguir boas histórias”, diz ela.
