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“Nunca deixou de ser minha”: Paulo Pimentel e sua trajetória como ex-dono da Tribuna

Paulo Pimentel. Foto: Átila Alberti / Tribuna do Paraná

“A Tribuna nunca deixou de ser minha. Se eu puder fazer alguma coisa pela sobrevivência dela, ainda vou fazer. Eu faria qualquer coisa pra que ela continuasse viva.” A voz embargada de Paulo Pimentel, aos 97 anos, carrega a força de quem não só viu a história acontecer, mas também ajudou a escrevê-la. Dono da Tribuna do Paraná por cinco décadas, o ex-governador e empresário fala com emoção sobre o fim da edição impressa do jornal que marcou a vida de gerações de curitibanos.

“Recebo a notícia com imensa tristeza. É o fim de um ciclo. Tudo que chega ao fim causa um certo pesar, uma espécie de extinção. Mas a Tribuna tem tantas glórias e histórias que merecem ser lembradas”, disse, com a serenidade de quem sabe que certos amores não se apagam.

Começo de uma paixão

A história de Pimentel com a imprensa começou quase por acaso. Advogado em São Paulo, ele chegou a Curitiba em 1958, convidado por Ney Braga para ser secretário da Agricultura. Ele nem queria se envolver com a política, pois era feliz com a esposa, tinha um bom salário como advogado, um bom patrimônio. Mas aceitou.

Tinha acabado de desembarcar em Curitiba, não conhecia a cidade, e logo sentiu falta de um jornal que falasse a língua do povo. A sugestão de criar um veículo popular veio de Rafael Iatauro, seu assessor à época.

Foi então que surgiu a oportunidade de adquirir o grupo que controlava O Estado do Paraná e a Tribuna do Paraná, criada poucos anos antes por Fernando Camargo e consolidada pelo jornalista João Féder. “O valor era de cerca de 40 milhões de cruzeiros, acho que era essa a moeda da época, já não lembro. Dei dois milhões, um carro que eu tinha, e o resto da entrada de 8 milhões veio por empréstimo no Bradesco. O resto eu fui pagando parcelado”, relembra.

A Tribuna, nas mãos de Féder, ganhou alma própria. Tornou-se o jornal “vermelho”, de manchetes fortes, de linguagem direta, de presença popular. Enquanto O Estado do Paraná era um jornal austero, de linguagem séria, falando muito de política e economia, a Tribuna era popular, com linguagem simples, direta e fluída.

“Era o jornal do povo, mas lido também pelas elites. O que saía na Tribuna virava assunto nas esquinas. Se uma matéria fosse negativa, derrubava uma pessoa; se fosse positiva, levantava reputações”, recorda.

Cidade da Comunicação

Com o tempo, a paixão de Pimentel pela comunicação virou projeto de vida. Ele ergueu, no Jardim Schaffer, a “Cidade da Comunicação”, um espaço que abrigaria jornais, rádios e televisões. “Quando comprei o terreno, a rua nem existia. Foi preciso abrir caminho, negociar, pavimentar. A gente passa a vida construindo coisas: jornais, prédios, empresas, mas o que realmente importa são as pessoas”, diz.

E de fato o pensamento de Pimentel se refletiu entre seus funcionários. A grande maioria dos funcionários que trabalharam na Tribuna, principalmente antes dela ser vendida a outro grupo de comunicação, relatam que lá foram muito felizes, que era um ambiente alegre, colaborativo. Atuaram lá por 20, 30, 40 anos. Nesse período constituíram famílias, seu patrimônio, sua vida, literalmente. Falam com saudade, com amor, com emoção.

Durante os anos dourados da Tribuna, o jornal se tornou sinônimo de popularidade e irreverência. Era vibrante, com suas manchetes vermelhas, suas histórias do cotidiano e, principalmente, sua paixão pelo esporte. O Peladão da Tribuna mobilizava toda Curitiba e fazia o jornal vender como nunca. “Era entusiasmo puro. A Tribuna era alegria, humor, vida. Era querida pelo povo”, conta o ex-proprietário.

O Cinemascope era um festival de cinema promovido pela Tribuna e que também fazia um sucesso estrondoso, lotava as alas de cinema e trazia muitos artistas famosos, incluindo internacionais, como Antony Hopkins, para a capital do Paraná.

Peso das mudanças

As transformações políticas e tecnológicas, no entanto, cobraram seu preço. Com o tempo, a relação de Pimentel com o poder e a imprensa tornou-se delicada. “Os militares minaram tudo: a Tribuna, O Estado, a TV Iguaçu. Fecharam minhas rádios, Tvs, minhas contas bancárias, tudo. Eu perdi tudo numa noite”, lembra, sem amargura.

Resistiu. Mesmo perdendo a concessão da TV Globo na época, acertou a concessão do SBT e continuou em frente. Conseguiu reabrir suas contas bancárias e retomou o caminho do sucesso. A Tribuna viveu novos tempos dourados, com recordes de venda e muita conexão com o leitor curitibano.

Já nos anos 2000, as primeiras crises motivadas pelo início da internet balançaram os negócios. Pimentel encerrou a edição impressa do jornal O Estado do Paraná.

Depois, a Tribuna balançou financeiramente e ele decidiu vender o jornal, que passou a fazer parte do Grupo Paranaense de Comunicação (GRPCOM), que detém, entre outras mídias, o jornal Gazeta do Povo e a Globo no Paraná. “Não foi fácil. Fiquei uma semana recluso, pensativo. Doeu”, lamenta Pimentel. A Tribuna permanece com o GRPCOM. E Pimentel nunca deixou de amar e prestigiar o jornal que ajudou a moldar.

“Leio a Tribuna todos os dias. Quando tem algo especial, peço dez exemplares, compro mais na banca. Se eu não fui o criador da Tribuna, fui quem fez com que ela sobrevivesse por cinquenta anos. Ela nunca deixou de ser minha.”

Adeus ao papel

Agora, diante da despedida da versão impressa – que continuará com a mesma garra e linguagem na internet – o sentimento é de gratidão e nostalgia. “Curitiba sem a Tribuna impressa vai ficar esquisita”, confessa, depois de uma pausa longa. “É triste pensar nisso. Ler o jornal em papel é um prazer que não se substitui. No fim de semana, gosto de folhear, sentir o cheiro da tinta. É outra experiência.”

Com o olhar voltado para o passado, Pimentel enxerga, na trajetória da Tribuna do Paraná, o reflexo de sua própria vida: intensa, popular, humana. “Se fosse possível, eu pediria a perpetuação da Tribuna impressa. Ela é parte da cidade, parte de mim.”

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