Sítio Cercado

Sem médico e sem remédio

Escrito por Giselle Ulbrich

As duas unidades de saúde do Sítio Cercado não dão conta de atender toda a demanda do bairro. Tanto na unidade Bairro Novo quanto na Salvador Allende, dezenas de pessoas ficam sem consultas e sem medicamentos todos os dias. Essa foi a denúncia do vereador Marcos Vieira (PDT), na tribuna da Câmara dos Vereadores de Curitiba, semana passada, mostrando que as consultas em cada uma das duas unidades caíram de 60 para 25 por dia. Antes do segundo turno da eleição, Grega então candidato prometeu melhorias para a saúde. Relembre!

Mirian reclama da falta de medicamentos e consultas
Mirian reclama da falta de medicamentos e consultas

O atendimento, por parte dos funcionários, é ótimo. A reclamação da dona de casa Mirian Reis, 51 anos, é a falta de medicamentos e de consultas. Ela usa AAS e metformina e nem sempre estão disponíveis no posto. A dona de casa também já amargou várias manhãs na fila, esperando uma consulta. Algumas vezes, voltou para casa sem atendimento. “O posto abre às 7h. Mas tem que chegar aqui às 5h pra conseguir pegar senha. A fila fica enorme. Às vezes tem só um ou dois médicos atendendo”, relata.

Analice precisa comprar medicamentos para fazer o curativo na perna
Analice precisa comprar medicamentos para fazer o curativo na perna

A aposentada Analice Ribeiro, 72, tem anemia profunda e uma ferida na perna que precisa de cuidado diário. Mas ela não está conseguindo o sulfato ferroso (medicamento para anemia) nem os materiais para fazer os curativos. Todos estão em falta. “Antes, me davam 90 ataduras por mês. Agora, estou tendo que comprar soro e gaze para manter a higiene da ferida”, lamenta a mulher, que antes tinha consultas de acompanhamento marcadas para cada 15 dias e agora mal consegue um agendamento. A aposentada diz que as enfermeiras tentam acolher todo mundo, tentam colocar senhas extras, falam com os médicos de casos mais graves na fila. Mas não podem fazer nada se não tem mais médicos.

Vai e volta

Benedito: antes tinha quatro médicos, agora só tem dois.
Benedito: antes tinha quatro médicos. Agora só tem dois.

O pedreiro Benedito Cardoso, 52, já desistiu de conseguir consultas algumas vezes. “Ficam umas 50 pessoas na fila, mas só atendem 20, 30. Antes tinha quatro médicos. Agora só tem dois. Tem um médico residente que saiu. Outro está de férias. Cansei de vir na fila. Aí dava o horário de trabalhar e eu tinha que ir embora sem atendimento”, diz ele, reclamando que também não consegue todos os remédios que precisa para pressão alta e esclerose. “Peguei só alguns agora. Pediram pra eu voltar dia 20 ver se consigo o resto”, reclama.

Não é diferente na Salvador Allende

Lurdes reclama do horário para agendar uma consulta
Lurdes reclama do horário para agendar uma consulta

Na outra unidade de saúde do Sítio Cercado, a Salvador Allende, que fica na Vila Rio Negro, a situação é igual. A cuidadora de idosos Lourdes dos Santos, 73, diz que de janeiro para cá, a falta de remédios ficou pior. Ela também já foi embora de lá sem conseguir consulta. “Agora eu estou trabalhando de madrugada e saio às 8h. Não tenho como chegar aqui às 6h. E eles também não agendam a consulta não. Só consegue quem chega às 6h e pega fila”, relata.

Lourdes diz que, antigamente, três ou quatro médicos atendiam no local. Mas do início do ano para cá só tinha um. Mês passado, chegou outro. Agora, são dois. E os funcionários dizem que não há médicos extras para repor os faltantes. “A fila de pacientes dobra a esquina do posto. Mas atendem umas 18 a 20 consultas por dia, no máximo”, constata.

Wagner conta que precisa chegar às 5 da manhã para agendar uma consulta.
Wagner conta que precisa chegar às 5 da manhã para agendar uma consulta.

O técnico de manutenção Wagner Pereira da Silva, 42, também já saiu da unidade sem consulta. Agora aprendeu. Tem que chegar às 5h para conseguir. E quanto não consegue e o caso é grave, tem que ir para as unidades 24 horas, do Sítio Cercado ou Pinheirinho. “Mas aí complica. A espera é enorme, junto com um monte de gente doente, com virose. E quando consegue atendimento não tem remédio para iniciar o tratamento. Se não tem no 24 horas, imagina nas unidades”, diz.

Perigoso pros pacientes e funcionários

Foto: Felipe Rosa
Foto: Felipe Rosa

A falta de medicamentos, insumos e de médicos para atender o público já está se tornando um caso de segurança pública. A dona de casa Mirian Reis conta que já teve caso de assaltos contra as pessoas que ficam na fila a partir das 5h. Já levaram celulares, carteiras e outros objetos de valor dos pacientes da unidade Bairro Novo. “A dentista que trabalha aqui já foi assaltada. Meteram uma arma na cara dela e levaram o carro quando ia embora”, conta.

Também pela ausência de funcionários e insumos, a unidade Bairro Novo está fechando as portas mais cedo. “Até mês passado o posto fechava às 22h. Mas agora está encerrando às 19h, porque depois desse horário não tem médico, não tem materiais para os funcionários trabalharem. As enfermeiras vão ficar fazendo o que aí, correndo risco de serem assaltadas? Então começaram a fechar mais cedo”, revela a aposentada Analice Ribeiro.

180 dias pra resolver

Foto: Felipe Rosa
Foto: Felipe Rosa

Na campanha, o prefeito Rafael Greca prometeu colocar a saúde “em dia” em seis meses. O secretário municipal de Saúde, João Carlos Baracho, explica que quando a nova gestão assumiu, em janeiro, a pasta tinha uma dívida de R$ 233 milhões com fornecedores.

“Quando assumimos, havia a falta de 39 medicamentos básicos nas unidades de saúde. Fizemos algumas compras emergenciais e já diminuímos para uma média de 20 medicamentos em falta”, diz o secretário, que pretende normalizar todo o fornecimento em breve, já que várias licitações estão em fase final.

A má gestão, diz Baracho, muito focada no atendimento das UPAs e menos voltada para as unidades básicas, gerou o descrédito das pessoas nestas unidades. “70% das pessoas que procuram as UPAs não precisariam estar ali. Poderiam receber atendimento nas unidades básicas. O que nós queremos fazer é dar mais atenção ao autocuidados e a preservação do estado de saúde das pessoas, nas unidades básicas, para que não precisem procurar as UPAs”, fala.

O secretário ressalta que, se continuar no mesmo ritmo da gestão passada, 2017 vai terminar com R$ 275 milhões de déficit na saúde. Por isso, a pasta trabalha para racionalizar os gastos. Não deverão ser contratados novos médicos, nem construídas novas unidades. “Menos construção e mais gestão. Queremos potencializar os serviços já instalados. Não podemos correr o risco de ampliar a rede e não poder sustenta-lá depois”, analisa. Vários mutirões de saúde estão sendo feitos, para diminuir a espera dos pacientes por consultas, exames e cirurgias.

A secretaria está testando na regional Portão um aplicativo de celular para marcação de consultas. Assim, não precisarão mais enfrentar filas de madrugada.

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Giselle Ulbrich

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